Ele vendeu uma startup aos 64 anos e agora investe em novas empresas

Depois de atuar por anos no mercado financeiro, Wlado Teixeira empreendeu, obteve êxito e passou para o outro lado da mesa, mentorando startups e investindo com o GVAngels.

Wlado Teixeira, diretor executivo do GVAngels e investidor de startups — Foto: Divulgação

Há 10 anos, Wlado Teixeira deu o passo que o transformou oficialmente em investidor: aos 64 anos, ele vendeu a startup Vivere para a Accenture, apenas cinco anos depois de fundá-la. Disposto a seguir trabalhando, ele sabia que não queria fundar outra empresa. Por sugestão de um amigo, tornou-se mentor de startups, trazendo toda a sua experiência profissional para direcionar novos empreendedores. Não tardou a começar a fazer os seus investimentos.

“No começo eu errei muito, aceitava investir em PowerPoint, quando não tinham MVP. Bastava contar uma história e eu investia. Não ficou nenhuma viva”, relembrou durante entrevista a PEGN. Ao longo dos anos, Teixeira investiu em mais de 50 startups.

Com trajetória extensa em bancos de investimento e especializado em M&As, ele se juntou ao GVAngels, grupo de investidores-anjo formado por ex-alunos da Fundação Getulio Vargas (FGV) em 2017, na fundação da rede. Com 350 membros, o grupo já investiu mais de R$ 45 milhões em cerca de 50 startups. Em 2022, foi eleita uma das melhores redes de anjos do mundo pelo CBInsights.

Teixeira conta que o processo de seleção é rígido: por mês, entre 40 e 50 startups se inscrevem para serem avaliadas pelo comitê do GVAngels, e apenas três são escolhidas para uma apresentação mais aprofundada. Em 2023, o grupo investiu em três startups, com cheque médio de R$ 1,38 milhão.

Em entrevista a PEGN, o diretor-executivo do GVAngels falou sobre o seu início como investidor de venture capital, o que procura em uma startup e sua visão sobre o ecossistema. Confira os principais trechos da conversa:

Há quanto tempo você investe em startups?

Vendi a startup para a Accenture em 2013. Aos 64 anos, não queria abrir outra empresa, quis trabalhar para o ecossistema, ser mentor. Naquela época, só tinha a 21212, aceleradora do Marcelo Sales. Comecei a olhar as startups, mas acho que eu estava com um ego muito grande, achava que sabia mais do que todos eles. Olhei cinco empresas, gostei de duas, mas com a cabeça de empreendedor, em vez de investir metade em cada, coloquei um monte em uma só. Ela deu write-off (o investimento não foi pra frente), e a outra era a Memed. Comecei a investir em 2013, meio sozinho, meio com grupos que apareciam.

Quando passou a integrar o GVAngels?

Em 2017, Rafael Belmonte, fundador de uma empresa investida (Netshow.me), criou o GVAngels. Dei condições para participar porque não queria montar uma rede de anjos para que a gente decida e eles invistam, eu não queria que tivesse cara de fundo. Queria que tivesse uma função pedagógica forte, porque acho que isso muda o Brasil e o ecossistema de empreendedorismo. Queria uma rede de anjos que a gente treinasse nos dois primeiros anos para aprender a investir. Na época eram 30 pessoas e 70% dos membros eram C-level de empresas, um grande capital humano. Fizemos o Angel Academy e quem entrasse no grupo como membro precisaria assinar um termo se comprometendo a dedicar tempo para isso. Até hoje, já investimos em 56 startups.

Quais características o empreendedor deve ter para você acreditar no negócio e seguir em frente com o investimento?

A tese de investimento não pode ser escrita na pedra, tem de ser adaptável. Mas, de modo geral, a gente olha algumas coisas: time, mercado, produto, valuation, captable e o que aconteceu antes. O time tem de ser completo, com CEO, CTO e CMO. O CFO é commodity, não tem tanta importância no começo. Precisamos saber se tiveram passados bons ou ruins, se já quebraram. Tem de ter dedicação integral ao negócio. Avaliamos se os empreendedores aceitam mentoria, se ficam ofendidos com perguntas, se não olham nos olhos. Eu gosto de empreendedores apaixonados pela empresa, mas não muito, porque se a paixão for enorme, dificulta. O mercado é importante, tem de ser grande o suficiente, ter espaço. Se tiver outros players fortes, pode ser bom ou ruim, porque pode ser um comprador no futuro. Se existe algum benchmarking no exterior, é bom saber quais rodadas já fizeram, quem investiu, porque esse pode ser o amanhã da startup. No começo eu errei muito, aceitava investir em PowerPoint, quando não tinham MVP. Bastava contar uma história e eu investia. Não ficou nenhuma viva. No GVAngels, no mínimo tem de ter MVP validado e ter tido receita mínima de R$ 300 mil nos últimos 12 meses.

Como deve estar o captable no início da jornada?

Às vezes a startup chega e já cedeu 30% da empresa. Na fase de pré-seed, após o nosso investimento, o empreendedor deve ter cedido no máximo 18% da empresa. Na etapa de investimento de friends & family, aceleradora, eles não podem ceder mais de 10%. Não é todo mundo que tem essa consciência.

Você já passou por outros ciclos no ecossistema brasileiro. Como avalia o cenário atual?

Em 2013, quando eu comecei a investir, uma startup que hoje chega no GVAngels pedindo valuation de R$ 15 milhões, seria avaliada em R$ 2,5 milhões. Foi aumentando aos pouquinhos porque começou a ter mais demanda, entrar mais gente e não tinha tanta startup assim. Em 2021 foi o ápice, o ano do oba-oba, startups com valuations muito altos, muitos fundos sendo montados, micro venture capital, demanda muito grande. Em 2022 tomou um tombo e agora voltou a ter valuation não tão absurdo. Não está ruim, o ecossistema tem boas startups, bastante gente entrando. Acho que o baque maior foi para empresas que não tinham histórico. Não acho que foi um inverno, acho que houve uma jornada de bom senso para todo mundo, investidores e empreendedores. Houve amadurecimento, seja por idade ou por sofrimento. De alguma maneira, os empreendedores chegando agora são mais maduros profissional e pessoalmente do que quando chegavam em 2014. Houve um trabalho pedagógico, muita gente querendo ensinar. De modo geral, foi o amadurecimento do adolescente.

No início do ano, o grupo previu um investimento de R$ 13 milhões em 2023. Em julho, vocês divulgaram que captaram 20% a mais do que o esperado no primeiro semestre. Como observa esse movimento?

Aconteceu com o GVAngels o que nunca havia acontecido antes. Temos recebido VCs com rodada fechada querendo um espaço para que as investidas usem a nossa mentoria. Não dá para tomar como algo que acontece no mercado, houve a repercussão da lista do CBInsights, mas sinto que está acontecendo uma procura maior do que era antes. O número de investidores tem crescido muito nos últimos meses.

FONTE:

https://revistapegn.globo.com/startups/noticia/2023/12/ele-vendeu-uma-startup-aos-64-anos-e-agora-investe-em-novas-empresas.ghtml