Criando hoje soluções para os desafios climáticos do futuro

Aeroporto de Hong Kong: nova pista terá paredão e sistema de drenagem contra inundação (Foto: Thinkstock)

Conheça um parque projetado para controle de enchentes, uma turbina eólica resistente a tufões e um aeroporto que já se prepara para lidar com a elevação do nível do mar

Resiliência: capacidade de rápida adaptação ou recuperação; habilidade para reagir a situações adversas; propriedade de retornar à forma original. Essas são algumas definições possíveis para o termo, que ganha cada vez mais espaço quando o tema é urbanismo. As mudanças climáticas em curso devem aumentar a intensidade e a frequência de eventos climáticos extremos, como tempestades, inundações, ondas de calor e frio e furacões. Diante disso, precisamos de uma infraestrutura que torne as cidades realmente resilientes.

Nos últimos anos, a área devastada por incêndios na Europa, no oeste dos Estados Unidos e no sudeste da Austrália já aumentou dramaticamente, segundo a UNISDR (Estratégia Internacional das Nações Unidas para a Redução de Desastres). Ainda segundo dados ONU, a elevação do nível do oceano, acompanhada de alagamentos e processos de erosão, já afetou vários vilarejos na África Ocidental, levando ao deslocamento de milhares de pessoas – um terço da população vive em regiões costeiras, e cerca de 10 metros do litoral são perdidos a cada ano. Em 2017 – o terceiro ano mais quente, desde que há registros –, o prejuízo com desastres relacionados ao clima chegou a US$ 320 bilhões, um valor recorde.

A busca por comunidades mais resilientes envolve várias frentes de ação – passa, por exemplo, pela criação e fortalecimento de sistemas de alarme, pela divulgação de informações para que a população saiba como reduzir a exposição a riscos, assim como a expansão dos serviços de proteção aos moradores. E inclui, claro, o desenvolvimento de soluções que facilitem nossa adaptação às novas condições climáticas. Reunimos, a seguir, três iniciativas nesse sentido, pensadas para mitigar os danos causados por alagamentos, tufões e pela elevação do nível do mar.

PAREDÃO AO LADO DO AEROPORTO

A Organização Internacional de Aviação Civil (agência das Nações Unidas) alertou, em 2016, que o aumento da temperatura no planeta poderia trazer severas consequências para o desempenho das aeronaves na hora da decolagem, interferindo também na quantidade de passageiros que cada avião teria condições de carregar. Os voos podem ser afetados devido a mudanças no padrão dos ventos e na frequência com que ocorrem tempestades. Até mudanças no padrão migratório das aves precisam ser levadas em conta, para assegurar que tudo transcorra com segurança.

Ao mesmo tempo, os aeroportos teriam que se adaptar às novas condições climáticas, melhorando, por exemplo, o sistema de drenagem das pistas. Para aqueles próximos à costa, outro desafio é a elevação do nível do mar – na Noruega, quase metade dos aeroportos estão expostos a esse risco. Aeroportos localizados no Ártico (região que depende da aviação para o abastecimento de itens básicos) já estão se deparando com problemas decorrentes da mudança nos padrões climáticos – uma das consequências é a maior probabilidade de acúmulo de gelo na pista. Enquanto isso, aqueles localizados em regiões mais quentes podem ter de lidar com deformações nas pistas (como ondulações) geradas pelo calor.

Alguns aeroportos já estão se preparando para os novos desafios. E exemplo disso é o Aeroporto Internacional de Hong Kong, que levou todos esses fatores e projeções em conta na criação de sua terceira pista, que deve ser concluída em 2023.

A nova pista vai contar com um sistema de drenagem capaz de lidar com tipos raros de inundação, além de ser acompanhada por um paredão de 13,4 km que ficará a, pelo menos, seis metros acima do nível do mar. A expectativa é que a estrutura consiga proteger a pista mesmo diante de ondas extremas – do tipo que ocorre uma vez a cada cem anos.

Classe especial de turbinas eólicas da GE é capaz de resistir a tufões violentos (Foto: Divulgação/GE)

Classe especial de turbinas eólicas da GE é capaz de resistir a tufões violentos (Foto: Divulgação/GE)

TURBINA EÓLICA ANTITUFÃO

A GE também está em busca de soluções para minimizar os dados causados por eventos climáticos extremos. Exemplo disso é a criação de uma classe especial de turbinas eólicas, a 4.2-117, capaz de resistir a tufões violentos, com rajadas de até 57 metros por segundo (ou 200 km/h). Para efeito de comparação: uma turbina comum consegue enfrentar ventos com velocidade de até 42,5 metros por segundo (cerca de 151 km/h), o que equivale à força de um furacão como Nate, que atingiu a América Central no ano passado.

O projeto busca facilitar a produção de energia eólica principalmente na região conhecida como Círculo de Fogo, no Oceano Pacífico. É uma área que compreende Japão, Filipinas e parte da China, entre outras nações. Ali, os tufões são uma ameaça constante – só no ano passado, foram 11 ciclones tropicais.

À frente do projeto está uma equipe da GE Renewable Energy em Barcelona, na Espanha. Um protótipo da nova turbina começou a ser desenvolvido em junho, na Holanda. Uma vez pronto, o equipamento passará por seis meses de testes rigorosos, nos quais ele será submetido a simulações de eventos climáticos extremos.

Para aumentar a resistência da turbina, uma das estratégias adotadas foi reduzir o comprimento das pás – o diâmetro total do rotor é de 117 metros. A questão é que o diâmetro do rotor está relacionado à capacidade de geração de uma turbina eólica – quanto maior ele for, maior a potência do equipamento. Uma turbina da GE com rotor de 100 metros consegue gerar 1,7 MW, enquanto uma com 158 metros é capaz de gerar 4,8 MW, por exemplo. E aí está um dos diferenciais da nova turbina: mesmo com um rotor de diâmetro modesto (de apenas 117m), ela é muito potente, gerando 4,2 MW. Além disso, a torre leva um aço mais grosso que o normal, sendo bem mais pesada que turbinas convencionais.

O Chulalongkorn Park, na Tailândia, é capaz de armazenar água da chuva  (Foto: Divulgação/Land Process Design)

O Chulalongkorn Park, na Tailândia, é capaz de armazenar água da chuva (Foto: Divulgação/Land Process Design)

UM PARQUE CAPAZ DE ABSORVER ENCHENTES

Inundações fazem parte do histórico de Bangkok, capital da Tailândia. No século 19, boa parte da população vivia em casas flutuantes, e o transporte se dava por meio de uma série de canais (os khlongs), como os de Veneza. Na época, a área “seca” era aproveitada especialmente para a agricultura. O processo de urbanização transformou essa paisagem, levando à pavimentação de muitas áreas, o que acabou afetando o fluxo da água. Tudo isso, somado à elevação do nível do mar e à maior frequência de tempestades, torna urgente a
busca por novas formas de lidar com alagamentos na cidade.

Uma resposta a esse cenário veio na forma de um parque, projetado especialmente para facilitar a drenagem em casos de inundação. Localizado no centro da cidade, com 4 hectares de extensão, ele consegue conter cerca de um milhão de galões de água de chuva. O projeto, concluído no ano passado, foi desenvolvido pelo escritório de design Landprocess, a pedido da Chulalongkorn University, e ocupa uma área pertencente à universidade.

O Chulalongkorn Centennial Park conta, em sua parte mais alta, com um museu sob o qual há tanques para armazenar água de chuva, que, na época de seca, é usada na irrigação das plantas. Na área mais baixa, há um lago, que conta não só com plantas aquáticas (para filtragem da água) como com uma série bicicletas instaladas na margem – quando os visitantes se exercitam (como numa bicicleta ergométrica), o movimento das rodas ajuda a oxigenar a água, evitando a proliferação excessiva de algas. Se a quantidade de chuva superar a capacidade de armazenamento da lagoa, a água pode se estender para outras partes do parque, de forma controlada, sem que isso seja um problema – a meta, segundo a paisagista responsável pelo projeto, Kotchakorn Voraakhom, não é impedir o alagamento, mas sim desenvolver uma infraestrutura que permita conviver com ele.

Ela também fundou a Porous City Network, uma empresa que ajuda a formar arquitetos paisagistas para os desafios climáticos do futuro. Segundo ela, cada região vai ter padrões próprios de chuva e seca, o que demandará soluções específicas. Ou seja, não é possível pensar numa tecnologia que possa ser simplesmente adquirida e transposta de um lugar para outro. Os profissionais terão de pensar em soluções locais.

FONTE: ÉPOCA