Você odeia os processos seletivos comuns? Estas startups também

Equipe de ciência de dados no escritório da VAGAS.com (VAGAS.com/Divulgação)

O cenário de RH

São Paulo – Os processos seletivos são fundamentais para a sobrevivência de qualquer empresa. Por meio deles, um empreendimento pode garantir os melhores talentos – e, com isso, ter capacidade para enfrentar a concorrência e obter sucesso com suas novas estratégias.

Mesmo assim, provavelmente você já se deparou em sua carreira com seleções e contratações sem sentido. Desde a análise de currículo até a dinâmica e a entrevista pessoal, não é sempre que as empresas acertam no modelo de avaliação e conseguem a melhor pessoa para a vaga.

Os candidatos sentem a ineficiência na pele. Profissionais concorrendo a programas de estágio e traineequalificam as etapas de recrutamento e seleção como “cansativas” e “longas”, segundo um estudo da consultoria E-Guru & Clave.

Algumas das principais críticas são a duração excessiva das fases e a falta de aprendizado ao longo do processo. Depoimentos incluem o fato de que muitas empresas não possuem uma comunicação ativa sobre a seleção e dão respostas vagas, como “seu currículo seguirá na nossa base de dados.”

Processos seletivos (e contratações) ruins não prejudicam apenas para quem não foi selecionado – para grandes corporações, é uma imensa dor. Não só o novo contratado não irá desempenhar à altura, mas também sua falta de aderência à cultura da empresa pode provocar uma saída abrupta e novos gastos com processos de seleção e treinamento.

Porém, a tecnologia chegou – e um setor conectado às necessidades de tantas pessoas não poderia passar ileso. As startups que perceberam tal oportunidade de negócio trouxeram mudanças como adoção de aparelhos móveis, análise de dados, computação em nuvem e inteligência artificial mudaram a forma como serviços de recursos humanos operam nos últimos anos, afirma um estudo da consultoria Deloitte sobre as perspectivas de 2017. Tanto alteraram o cenário que até criaram um nome próprio para seu grupo de startups: as HR Techs.

“Os tipos de tecnologia usados, as experiências que eles entregam e o design incorporado são novos. Mais importante ainda, a forma com que gerenciamos pessoas nas companhias mudou, fazendo com que sistemas tradicionais de RH comprados há apenas uma década já pareçam obsoletos.”

Tornar o recrutamento e a seleção mais eficientes é um mercado fértil nas terras brasileiras não só pela quantidade de falhas a serem consertadas, mas pelo tamanho potencial do mercado. Segundo a mais recente Pnad Contínua, pesquisa sobre a sociedade feita trimestralmente pelo IBGE, o país possui 91,2 milhões de pessoas com alguma ocupação – e 12 milhões desocupadas, talvez à procura de melhores soluções para conquistarem uma oportunidade de trabalho.

Nos Estados Unidos, o mercado de recrutamento e seleção já é multibilionário. O setor possui uma receita de 240 bilhões de dólares, segundo o mesmo estudo da Deloitte. Em 2016, empresas que traziam tecnologia à área atraíram 2,2 bilhões de dólares em investimento, afirma a empresa de pesquisa CB Insights.

“Eu vejo que há um espaço para evolução muito grande no Brasil. Ainda não somos o país com maior produtividade quando se fala em recursos humanos e em recrutamento e seleção, especialmente quanto comparamos aos Estados Unidos e a alguns países da Europa. Mas, pouco a pouco, estamos amadurecendo a eficiência dos nossos processos”, afirma Sergio Margosian, da consultoria de recursos humanos Michael Page.

Para Margosian, um dos principais benefícios da onda das HR Techs é trazer produtividade na base da pirâmide de recrutamento e seleção, substituindo processos tão mecânicos quanto a triagem de currículos. “A tecnologia já está ajudando a reduzir o tempo até chegar ao candidato mais compatível com o perfil procurado pela empresa.”

Isso é bom não apenas para quem está procurando um emprego, mas para a situação financeira das empresas selecionadoras, segundo a Deloitte.

“Administrar pessoas de forma mais eficiente requer muitos processos gerenciais. Contratação, folha de pagamentos, treinamento, gestão de benefícios, aposentadoria, acompanhamento de horários, realocação de funcionários e gerenciamento de despesas são atividades muito importantes – e burocráticas. Ferramentas que realizam tais processos com sucesso podem se pagar diversas vezes ao longo do tempo.”

Enquanto em países como Estados Unidos as HR Techs já focam em temas como empoderamento e trabalho em equipe, as startups brasileiras cuidam da primeira etapa de desburocratização dos recursos humanos: o recrutamento e seleção dos candidatos mais adequados.

Nem todas elas, porém, começaram há pouco tempo. As HR Techs brasileiras vão desde negócios tradicionais de recursos humanos, que tiveram de se reinventar com o avanço tecnológico do mercado, até empreendimentos disruptivos criados no meio da transformação digital.

Todos esses negócios possuem em comum o uso de tecnologias como big data para análise preditiva, inteligência artificial e machine learning – além de atraírem o interesse de gigantes dos mais diversos setores.

Os tradicionais se adaptam…

 A empresa VAGAS.com já possui 19 anos de vida e é conhecida principalmente por suas listas de vagas de emprego e organização de avaliações profissionais. O negócio anuncia mais de 30 mil oportunidades de emprego por mês, em nome de mais de 2 mil clientes recorrentes, como GOL, Itaú e TIM. No modelo de assinatura, o ticket médio mensal é de 1,5 mil reais.

Mesmo com tanto tempo de mercado, a VAGAS.com achou por bem embarcar na onda da tecnologia e garantir sua posição no mercado de recrutamento e seleção.

Para o empreendimento, ser uma empresa mais antiga não é defeito diante da onda de inovação. O negócio diz ter acumulado um grande banco de currículos, com 15 milhões de documentos, e pode conseguir lançar produtos mais refinados a partir de tantos dados.

O primeiro projeto com aplicação de novas tecnologias foi o Mapa de Carreiras, lançado em 2015. Nele, é possível pesquisar diversos cargos e conferir informações como presença de cada gênero, graduações, salários e próximas promoções.

Para desenvolver a ferramenta, a equipe de dados da VAGAS.com usou seu banco de currículos para mapear as trajetórias de carreira mais comuns no mercado brasileiro. O site já possui mais de 300 mil acessos.

Agora, o negócio está com um projeto piloto para a análise preditiva de currículos. Com a ciência de dados, seria possível construir modelos estatísticos que permitem uma tomada de decisão mais efetiva sobre quem contratar.

“Estamos criando do zero uma área de ciência de dados aplicada à estratégia de negócio. Hoje somos seis cientistas ou engenheiros de dados integrados com o time de produtos, atendendo empresas e vendo como podemos melhorar”, afirma Bruno Abdelnur, cientista de dados da VAGAS.com.

A principal linha de estudo da VAGAS.com é o matching: prever quais candidatos são mais aderentes a cada vaga, gerando melhores resultados para o futuro empregado e para a empresa.

O foco do piloto está nos processos de trainee, por serem mais custosos e delicados ao empregador – afinal, deles saem os futuros talentos de uma organização.

“Uma empresa que faz tais programas recebe em média 5 mil candidaturas. Antigamente, o pessoal de RH teria de selecionar os melhores candidatos para a fase seguinte. O algoritmo fará tal escolha e entregará um ranking com os candidatos mais aderentes à vaga, considerando o perfil da empresa e o histórico de quem já foi contratado”, completa Abdelnur.

Empresas como o Grupo Votorantim participam do protótipo da VAGAS.com, que começou nos primeiros meses de 2017. A gigante não quis se pronunciar ainda sobre sua avaliação do piloto.

A expectativa é que a solução da VAGAS.com esteja empacotada até abril deste ano, com o primeiro cliente já operando a solução no dia a dia da empresa. Além do Votorantim, outros quatro grandes negócios mostraram interesse.

“Primeiro fomos para o candidato e geramos proximidade, com o Mapa de Carreiras. Agora, indo para o lado da empresa, conseguimos enxergar muita oportunidade. Muitos desses negócios ainda não estão familiarizados com o processo de tecnologia na área de recursos humanos.”

Para 2018, a VAGAS.com espera evoluir sua solução de inteligência artificial e reestruturar outras soluções empresariais. Em 2016, o negócio faturou 37 milhões de reais – o acumulado de 2017 ainda não foi fechado.

“A ideia com o piloto é realmente agregar valor aos nossos clientes. Ainda estamos pensando se o algoritmo entrará como novo produto ou se integrará nosso pacote recorrente”, completa Leonardo Vicente, especialista em marketing da VAGAS.com. “Estamos vendo as HR Techs cada vez mais fortes no Brasil e com toda nossa história e conhecimento, agregando tecnologia no core business da marca, temos tudo para fazer parte do movimento.”

Outro negócio com experiência que se reinventou foi o portal Seja Trainee. Criado em 2011, o empreendimento focado em seleção de talentos percebeu que teria de mudar seu posicionamento se quisesse continuar no mercado.

Após uma consultoria de branding, a Seja Trainee se dividiu e abriu uma spin-off, chamada MatchBox. O negócio adquiriu uma empresa de gamificação chamada Repense Game e, desde junho de 2017, a nova divisão está focada em trazer tecnologia para facilitar a vida do candidato e melhorar a aquisição de talentos.

A MatchBox recebe 100 mil candidatos por ano e, em 2017, anunciou mil vagas. O foco está nos processos de começo de carreira, como estágio e trainee. “É um mercado com número de candidatos maior e que precisa de mais tecnologia, porque o volume de currículos é muito grande. O RH acaba tendo muitos processos operacionais, e nossa ideia é otimizar tais etapas”, afirma Kleber Piedade, CEO da MatchBox.

Para isso, o primeiro passo foi lançar a Vicky: um chatbot com inteligência artificial que faz a inscrição no processo seletivo em quatro minutos. Antes, tal processo pedia grande quantidade de informações e cada candidato levava de 30 a 40 minutos para preencher os formulários.

FONTE: EXAME