Escaneamento de atores somado à Inteligência Artificial cria o dublê digital, uma tecnologia que promete revolucionar.
Uma máscara de látex vai ser o suficiente”. Isso foi o que pensou inicialmente a equipe de criação do filme Vingadores: Guerra Infinita, quando enfrentou o desafio de criar a aparência de Thanos, personagem de Josh Brolin. Aliás, a equipe era da Digital Domain, subcontratada pelos Estúdios Marvel. Mas a solução encontrada foi bem diferente: um dublê digital.
Certamente, máscaras não seriam suficientes para caracterizar Thanos, com dois metros de altura e pele em tons de púrpura. Além disso, possui queixo semelhante à mandíbula de uma baleia e mãos do tamanho de perus de Natal. Entretanto, o mesmo dublê digital de Brolin vai participar da sequência do filme, que se chama Vingadores: Fim do Jogo. O ator vai ganhar um novo cachê e participação nos lucros pelo filme que estreia agora em 2019.
Já seu dublê digital não ganhou um centavo pelo Guerra Infinita e também não vai receber nada pelo próximo filme. Portanto, ele é muito mais econômico para a produção. Seria essa a tecnologia cinematográfica do futuro?
Escaneamento com inúmeras câmeras
A construção do supervilão Thanos, sempre dedicado à destruição do Universo, foi feita com um exaustivo escaneamento de Brolin. Para isso, foram usadas centenas de câmeras de alta resolução.
Dessa maneira, as mais variadas nuances de expressão do ator foram capturadas. Brolin fez caras e bocas de todos os tipos e também falou bastante. Afinal, isso era necessário para que as câmeras captassem tudo e fosse criado um modelo de treinamento para computador. Então, a Inteligência Artificial com machine learning transformou tudo em imagens com o movimento necessário para cada cena.
Tecnologia para filmes: parecido, mas diferente
Um imenso banco de imagens foi construído com o ator – o jeito que sua pele se move, as expressões de seus olhos, etc. Portanto, o dublê digital surge realista, parecido com o ator, mesmo que seja muito diferente.
Thanos é apenas um exemplo do uso praticamente perfeito que os estúdios fazem do dublê digital. E isso levanta uma questão: afinal, com todos os dados coletados sobre Brolin, não seria possível produzir filmes com ele, mesmo depois de sua morte?
A Digital Domains deixa a questão em aberto: “Quando escaneamos um ator, não sabemos se as imagens serão usadas como dublês em cenas perigosas, ou apenas para recriar cenas que não puderam ser filmadas por qualquer motivo”, explica Darren Hendler, diretor da empresa.
Os Estúdios Disney, proprietários da Marvel, já decidiram que vão usar imagens escaneadas da atriz Carrie Fischer, de Star Wars, já falecida, no próximo filme da série. Em síntese, pelo menos no cinema, a Princesa Leia vai alcançar a imortalidade por meio de um dublê digital.
Dublê digital vai ter mais usos no cinema
O dublê digital veio para ficar, pois é cada vez maior o número de filmes em que os atores são escaneados, como Josh Brolin. A tecnologia é relativamente recente e assim seu uso tende a se ampliar. Ela nasceu para substituir o ator em caso de cenas perigosas, desempregando o stuntman – o dublê de carne e osso.
Com isso, o custo da tecnologia tende a cair, tornando sua utilização mais fácil, devido ao aumento do uso. O dublê digital agora entra também no processo de edição. Ele serve para, por exemplo, fundir em um só os rostos de dois atores.
Aliás, este é o caso do corpo de Guy Henry reunido a uma computação gráfica do rosto de Peter Cushing em Rogue One: Uma História Star Wars. Os dois rostos criam, dessa maneira, um novo personagem: Grand Moff Tarkin.
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Com o dublê digital e muito escaneamento, nada mais é impossível na indústria do cinema. Em princípio, nem a morte de atores ou atrizes impedirá que as filmagens de qualquer obra sejam concluídas. Também pode ser usado para diminuir cinturas de atrizes famosas, aumentar a musculatura de um ator meio fora de forma, remover rugas ou embelezar.
Mas, além disso, é uma grande apólice de seguro das produtoras contra contratempos com atores. Em um filme com orçamento de US$ 200 milhões (R$ 760 milhões), nada parece mais natural para as produtoras do que garantir a participação completa dos atores com escaneamento e dublês digitais.
Seguro de produção com custo baixo
O escaneamento de um ator ou atriz dura até dois dias e pode custar cerca de US$ 1 milhão (R$ 3,6 milhões). O valor de prêmio de seguro é barato, especialmente se o salário do ator for muito superior.
Apesar disso, o desemprego sobe entre os dublês profissionais. Além disso, alguns atores também estão insatisfeitos. Jessica Chastain diz que foi escaneada durante uma produção há alguns anos e nunca soube o uso que foi dado às imagens. Tom Cruise, famoso pelos filmes de ação, como a franquia Missão Impossível, é outro que tem manifestado sua contrariedade.
Igualmente, o ator Donald Glover se revoltou com seu escaneamento para o personagem Lando Carlissian em Han Sollo: Uma História Star Wars. De acordo com ele, a produtora pode resolver fazer um filme com ele 15 anos após sua morte. E simplesmente dizer: “Glover está morto mesmo, podemos fazer o que quisermos”.
Um grande banco de dados de atores
Ben Morris, supervisor de efeitos especiais dos filmes da série Star Wars, confirma que certamente já existe um vasto banco de dados de imagens de atores. Acrescenta ainda que o processo é feito com todos – sejam homens ou mulheres, jovens ou idosos. E também que não há um projeto de uso futuro do material, é apenas para referência. E mais: até os personagens aliens são escaneados e viram dublês digitais.
Como será o futuro? É garantido, afinal, que o dublê digital será cada vez mais usado. Se poderão substituir atores já falecidos ou envelhecidos em filmes completos, ainda é cedo para dizer. Muitas questões éticas surgirão e terão que ser avaliadas antes disso. Mas as produtoras não parecem abrir mão disso. Hoje, um ator que se negar a ser escaneado para ter um dublê digital pode ter seu contrato rompido e perder o emprego.
Quem é o astro: o ator ou o dublê digital?
E as produtoras puxam mais para o seu lado. Darren Hendler, da Digital Domains, garante que os atores sempre vão prevalecer. Diz ele, “afinal, todo mundo vai ao cinema para ver a excelente atuação do Josh Brolin, não ver o Thanos”. Mas será mesmo?
Já Beau Janzen, um especialista em efeitos visuais, vai adiante: “não vejo muita diferença entre usar imagens de um ator morto e todas as manipulações de imagens que já são feitas hoje e as plateias desconhecem. Contudo, há uma questão ética: se usarmos imagens de um falecido, quem escolheríamos? Se optarmos por John Wayne em um filme atual, como O Segredo de Brokeback Mountain, fazendo o papel de um cowboy gay, o público aceitaria?” Enfim, perguntas não faltam. Vamos acompanhar!
FONTE: VIVO TECH