Demissões em startups: o que de fato está acontecendo, ou sobre unicórnios e camelos

Em artigo, sócio do Templo Ventures analisa o cenário adverso e o que deve vir pela frente.

Há pouco tempo, o mercado das startups estava aquecido. Além do entusiasmo pela novidade, as captações das rodadas de investimento bateram recorde, houve aumento no volume aportado e as próprias condições macroeconômicas eram favoráveis. Apenas no início de 2021, as startups brasileiras receberam US$ 3,2 bilhões em investimentos, volume que representa 90% do total investido em todo o ano de 2020, segundo o relatório Inside Venture Capital.

Entretanto, quem acompanha as notícias sabe que o cenário mudou. Fomos surpreendidos por demissões em massa, queda do valor do bitcoin e escalada de juros. QuintoAndar, Loft, Facily e Ebanx foram algumas empresas que vimos tomar as primeiras medidas frente à situação macroeconômica. E o que elas têm em comum? São “unicórnios” (startups avaliadas em mais de US$ 1 bilhão) que almejam crescimento rápido e agressivo. Nesse sentido, nas mínimas instabilidades, estão suscetíveis a realizar ações drásticas, como o corte de 20% do quadro de funcionários que houve no Ebanx, por exemplo.

Não podemos generalizar e afirmar que somente os unicórnios enfrentaram a crise, uma vez que outros modelos também passaram pela mesma situação. Porém, startups bem planejadas conseguiram minimizar prejuízos. Afinal, não é só o dinheiro que faz a diferença, mas também a experiência do fundo. É nessa lógica que muitos investidores em startups estão trocando os “unicórnios” pelos “camelos” — startups que priorizam crescimento de forma estratégica, em equilíbrio com o fluxo de caixa e, normalmente, são mais resistentes às adversidades.

Neste ano, os investimentos em startups brasileiras registraram queda de 45%. Entre janeiro e agosto de 2022, foram captados apenas US$ 3,6 bilhões. No mesmo período do ano passado, haviam sido US$ 6,6 bilhões, ou quase o dobro.

O problema não é localizado no Brasil. Até mesmo as chamadas Big Techs americanas estão passando por um período turbulento. A onda de demissões em Twitter e Meta, por exemplo, tomou conta dos noticiários. Para esclarecer o desligamento de 11 mil funcionários, Mark Zuckerberg citou a desaceleração macroeconômica e o enfraquecimento do mercado publicitário. A posição do CEO da Meta mostra que as condições externas são cruciais para a tomada de decisões na empresa — e essa mesma lógica funciona para as startups.

Economia verde e web 3.0

Quem está no mercado sabe que a economia é cíclica. O cenário para 2023 ainda é uma incógnita, mas podemos fazer alguns apontamentos. O financiamento do pré-seed (investimento em startups de estágio embrionário) vai continuar, assim como ocorreu esse ano. Afinal, se há uma boa proposta e um MVP (sigla em inglês para produto mínimo viável) eficiente, há potencial inovador que pode gerar um bom retorno. A diferença, a partir de agora, é que os investidores estarão voltados para negócios mais seguros e vão privilegiar empreendedores que estão em sua segunda ou terceira startup.

Setores ligados à economia verde e web 3.0, por exemplo, têm se destacado no mercado. Por serem negócios visados, startups que seguem por esse caminho podem ir contra a maré baixa.

A realização do Web Summit 2023 no Rio é outro fator que destaca a tendência naquelas áreas. E, de maneira geral, a conferência internacional atrai investidores de diversos países para conhecer as empresas brasileiras e captar recursos — o que pode ser um fator determinante para as startups a partir do próximo ano.

O ano de 2022 mostrou que as oscilações macroeconômicas têm grande efeito no capital das startups que não estão preparadas — e mesmo nas que considerávamos bem estabelecidas, como as Big Techs. Se, antes, eram prioridades a corrida para o crescimento, a visão a curto e médio prazos e a busca por retorno rápido, agora a cautela e a busca por estabilidade são características em maior evidência.

As expectativas para o próximo ano são altas, não somente por causa dos grandes eventos e promessas setoriais, como também por causa das mudanças políticas brasileiras que podem impactar no interesse dos investidores nacionais e internacionais.

FONTE: https://oglobo.globo.com/blogs/capital/post/2022/12/demissoes-em-startups-o-que-de-fato-esta-acontecendo-ou-sobre-unicornios-e-camelos.ghtml