A VEZ DO BIODESIGN

PESQUISA | No projeto Lab, Sebastian Cox e Ninela Ivanova estudam materiais diversos, replicando alguns processos orgânicos da natureza (Foto Petr Krejci Photography / Divulgação)

A pesquisa de matéria-prima sustentável e a biofabricação de objetos são a próxima fronteira do design para solucionar dilemas atuais

PRODUTO | A série chamada Mycelium + Timber traz luminárias feitas de cogumelos e resíduos de madeira que ganham uma textura semelhante à da camurça (Foto Petr Krejci Photography / Divulgação)

PROCESSO | Nesta coleção, a dupla explorou a rica gama de brancos, castanhos e dourados dos materiais (Foto Petr Krejci Photography / Divulgação)

Quando o assunto é inovar as formas de fabricar desde peças de mobiliário até pequenos itens de decoração, um grande motivador para a pesquisa no design contemporâneo é o desejo por sustentabilidade que marca os nossos tempos. Mas se os recursos escassos do planeta e mesmo a demanda pela redução da pegada de carbono tornaram populares conceitos como o upcycling, na prática esse entendimento ainda não foi um gatilho forte o suficiente para transformar de maneira maciça não apenas a mentalidade de quem fabrica as peças, mas também o trabalho in loco, que começa na hora de pensar a constituição do objeto em si.

Pode ser que o pontapé para o design do futuro seja dado, inevitavelmente, de dentro de um laboratório, através de um conceito amplo que passou a ser conhecido como biodesign. “Já em 2009 cientistas, arquitetos, engenheiros e designers passaram a pesquisar novas maneiras de criar tendo a natureza como inspiração”, lembra Cecile Poignant, pesquisadora de tendências e editora do Trend Tablet. A partir daí, entramos em uma nova era de simbiose com a natureza, explica: “Enquanto no biomimetismo você olha a natureza e tenta replicar o que vê, hoje percebemos que produtos e estruturas podem ser projetados por, para e com a natureza. Não é tirar algo dela, mas fazer ‘com a natureza’, em parceria”.

De plantas a bactérias, quase tudo pode ser usado como elemento construtivo. Partindo da vocação do design para solucionar problemas, alguns criativos já se lançaram no desafio de trazer a natureza para o centro da discussão.

Novo paradigma
Para Jonas Edvard, que cresceu perto do verde em uma área de natureza selvagem na Dinamarca, o interesse por pesquisar novos meios de criar foi obviamente influenciado pelo contexto. Ele formou-se em design industrial, mas saiu da faculdade com a sensação de que alguns dos cursos não ofereciam novos olhares sobre por que continuamos cortando árvores ou extraindo petróleo para a produção de plástico. “Parecia haver uma compreensão conservadora do material, da forma e do valor que se caracterizou por cadeiras de madeira — mesmo que tenhamos pouco desse material e a produção seja feita principalmente na Polônia”, diz. Hoje, no inverno, Edvard caminha pela praia pegando os restos de algas que surgem na areia depois das tempestades. O material é seco, triturado e cozido, para se transformar em uma espécie de cola, e depois misturado com papel reciclado para dar origem a cadeiras e luminárias da série Terroir.

Outra dupla que certamente entrou de cabeça nas possibilidades do biodesign foi Sebastian Cox e Ninela Ivanova. Em seu estúdio em Londres, eles misturam fungos e madeira para desenvolver as peças da série associado aos meios de produção via impressoras 3D. “As algas podem rapidamente filtrar o CO2 do mar ou da atmosfera. Crescem absorvendo o carbono, e o produto residual é O2: ar limpo”, disse Erik em entrevista ao Museu Boijmans van Beuningen, em Roterdã.

 

Processo. As algas são secas, trituradas, cozidas e misturadas a papel reciclado para criar objetos diversos (Foto: Nikolaj Steenfatt / Divulgação)
Resultado. No material prevalece o tom de marrom esverdeado (Foto: Emil Thomsen-Schmidt / Divulgação)

Desafio da beleza
Transcender as próprias barreiras do design não é tarefa simples. O vidro, o concreto, o plástico e até a madeira são elementos amplamente usados ao longo da história, e não por acaso. Eles atendem às demandas diversas do mercado por ergonomia, preço e, sobretudo, aos rigores da busca por beleza estética. Existe um desafio que envolve a contínua valorização do biodesign, que passa pela capacidade de apreciação. “Parece que a aparência ecofriendly gera muitos produtos coloridos em tons pastel”, brinca Jonas Edvard.

Os métodos de pigmentação natural ainda têm restrições, mas podem reservar boas surpresas. Além das diversas nuances de verde, Klarenbeek e Dros se apropriaram de um surpreendente tom de laranja vindo do betacaroteno que algumas espécies de algas produzem naturalmente. Ninela Ivanova lembra que, embora haja certa restrição em relação à cor (que pode ser temporária), o biodesign confere aos produtos qualidade sensorial: “Com fungos, o micélio que usamos tem uma textura aveludada e um agradável aroma de terra”, conta. Otimista, Cecile Poignant acrescenta que a tendência pode impulsionar uma evolução desse olhar. “O que é beleza hoje é muito diferente do que era há 20, 30 ou 40 anos. Isso está em constante evolução.”

Uma coisa é certa: mais do que conceitos como a reciclagem, o design do futuro precisa ter impacto restaurador no planeta, desde projetos até modelos de fabricação que impulsionem economias locais. “A resposta a essa necessidade deve vir não apenas do design, mas também das soluções de varejo e modelos de negócio”, finaliza Cecile.

Laboratório. Designers holandeses convertem algas em bioplástico para impressão 3D (Foto: Antoine Raab / Divulgação)
Renovação. As algas são uma solução para o vasto consumo de combustíveis fósseis que emitem CO2 (Foto: Antoine Raab / Divulgação)
Nuances. Peças da linha Algae exploram tonalidades suaves a partir de pigmentação natural, como o betacaroteno (Foto: Antoine Raab / Divulgação)
FONTE:  CASA E JARDIM