Três mulheres em defesa de uma economia de US$ 2,7 trilhões

As fundadoras da startup Rrreefs usam argila e impressora 3D para criar recifes artificiais e recuperar a biodiversidade marinha, que impacta tanto na pesca como no turismo.

Projeto da Rrrees na Ilha de San Andrés, na Colômbia, com organismos marinhos se escondendo nos blocos

Um novo (e inquietante) recorde foi batido. Em abril, as temperaturas médias dos oceanos atingiram níveis jamais vistos. Pela primeira vez, desde 1981, ultrapassaram os 21ºC. Consequência direta da crise climática, o aquecimento está associado a desastres de toda sorte. Entre os quais, a morte dos recifes de coral.

Formados ao longo de milhares de anos, pelo acúmulo dos esqueletos de pequenos animais e organismos marinhos, os recifes são um dos mais complexos e valiosos ecossistemas do mundo. E um dos mais vulneráveis também. O ritmo de destruição imposto a essas estruturas rochosas é duas vezes maior do que o do desmatamento das florestas tropicais.

Entre 2009 e 2018, o mundo perdeu 14% de seus recifes. Um desfalque equivalente a 11,7 mil quilômetros quadrados; ou 1,4 milhão de campos de futebol. Se nada for feito, até 2070, esse ecossistema, típico dos mares tropicais, de águas quentes e claras, corre o risco de desaparecer.

Hanna Kuhfuss, Marie Griesmar e Ulrike Pfreundt estão decididas a não deixar isso acontecer. Nascidas em Zurique, na Suíça, a cientista marinha, a artista plástica e a bióloga com PhD em genética molecular e oceanografia microbiana, respectivamente, pretendem restaurar 1% dos recifes de corais costeiros, até 2033.

A meta das três pode soar ambiciosa demais, mas tem fundamento. Desde 2019, Hanna, Marie e Ulrike vêm trabalhando em uma tecnologia que, nos últimos dois anos, tem se revelado eficaz em fazer a vida brotar em locais onde a extinção era dada como certa.

Apaixonadas pelo fundo do mar, as também mergulhadoras, em 2020, fundaram a Rrreefs – o nome da empresa é uma brincadeira com os “erres” de “repensar”, “reconstruir” e “regenerar” e a palavra “reefs”, “recifes”, em inglês.

Rrreefs sócias maria, ulrike e hannaAs fundadoras da Rrreefs: Maria, Ulrike e Hanna (da esq. para a dir.)

Nascida no Instituto Federal de tecnologia de Zurique, a startup projeta e ergue estruturas semelhantes às dos recifes, de modo a atrair animais e plantas para o local. Os “tijolos” da Rrreefs são feitos à base de argila (ecológica, claro) e impressos em 3D.

De tamanhos, formatos, cores e texturas diferentes, as peças visam promover a biodiversidade nos locais onde são instaladas. Depois de montado, o cenário é como se alguém tivesse brincado com blocos de montar e construído uma cidade no fundo do mar.

A impressão 3D permite que o “recife de argila” seja adaptado às características e necessidades das regiões onde são erguidos. A Rrreefs desenvolveu dois projetos de sucesso. O mais recente foi instalado em setembro de 2021, na costa da Ilha de San Andrés, na Colômbia.

Em apenas três meses, 100 espécies de peixes e outros organismos marinhos estavam se alimentando e se escondendo nos blocos da Rrreefs. A riqueza no local, se aproximava à de um recife natural.

Blocos 3D para corais

A primeira instalação de Hanna, Marie e Ulrike data de 2019, na costa da Ilha Magoodhoo, no Atol de Fafoo, nas Maldivas. Foram instalados 81 “ladrilhos”, em cinco pontos diferentes. Veio a pandemia do novo coronavírus e as três só voltaram ao local em março de 2021. Qual não foi a surpresa delas ao encontrar 30 corais por metro quadrado, uma taxa de ocupação superior à média maldívia.

“Nosso objetivo é que nossas estruturas se transformem em recifes autossustentáveis ao longo dos anos, trazendo de volta uma vida marinha abundante, protegendo as costas da erosão e inundações e aumentando a resiliência das comunidades locais”, lê-se em comunicado assinado pelas três.

A preocupação delas com as costas se justifica. Em todo os mundo, cerca de meio bilhão de pessoas vive direta ou indiretamente dos recifes de coral.

Da pesca e do turismo, sobretudo, em uma economia que movimenta anualmente US$ 2,7 trilhões, segundo o relatório Status of Coral Reefs of the World, elaborado pela Rede Global de Monitoramento de Recifes de Coral (GCRMN, na sigla em inglês).

tijolo 3D nas maldivas já com coralTijolo 3D nas Maldivas já com coral

Toda essa abundância se deve à riqueza de biodiversidade encontrada nessas formações. Presentes em uma centena de países, embora cubram apenas 0,2% do fundo do mar, os recifes abrigam 25% das espécies marinhas.

Peixes e crustáceos, entre outros organismos, usam essas estruturas para a procriação, fonte de alimentos e abrigo contra predadores. Cerca de 10% de toda a proteína animal consumida pelos seres humanos vem dos recifes de coral.

Com aparência e rigidez de rocha, os recifes funcionam também quebra-mar, absorvendo 97% do impacto das ondas. Em tempos de aquecimento global, frente a eventos climáticos cada vez mais extremos e ao aumento do nível do mar por causa do aquecimento global, a proteção dos recifes de coral se faz urgente. Mas, para que funcionem em sua plenitude, precisam ser preservados.

FONTE: https://neofeed.com.br/inovacao/tres-mulheres-em-defesa-de-uma-economia-de-us-27-trilhoes/