Independente do termo usado, Legaltechs e Lawtechs estão abrindo caminho para uma revolução no mercado legal. Mas, por trás de todas as ferramentas, robôs e automações, um elemento está verdadeiramente mudando o jogo no jurídico; os dados.

Até há pouco tempo extremamente dispersos e inacessíveis, a organização e criação de bancos de dados legais está, agora, a todo vapor. As opções mais completas e de melhor qualidade estão se tornando cada vez mais viáveis, mas o aumento da concorrência está fazendo esses custos caírem e a qualidade aumentar. É questão de tempo até serem totalmente acessíveis para todos. E é exatamente neste “tempo” para a acessibilidade que repousa a maior “ameaça” ao mercado legal e, ao mesmo tempo, a maior oportunidade.

Em São Paulo, foi criado o Future Law Innovation Center – Flic, parceria da Thomson Reuters com a Future Law, escola pioneira de Tecnologia para o Direito que criou um dos primeiros cursos de Ciência de Dados para o Direito do mundo, com todas as turmas lotadas. O prof Alexandre Zavaglia, um dos principais nomes do país a abordar dados e direito e um dos fundadores da Future Law, comenta que “com a gigantesca quantidade de dados gerados diariamente, há uma demanda crescente para a utilização e análise de big data aliada ao uso de inteligência artificial, de estatísticas, predição, automação de procedimentos, entre diversas outras possibilidades na área do direito”. Afinal, além de ter os dados, é preciso saber o que fazer com eles. Advogados não tem uma formação para o cruzamento de dados, para noções de matemática e estatística, mas esse cenário vai ter de mudar.

O acesso aos dados permite medir e entender aquilo que não era possível antes, mudando completamente o panorama de como serão prestados os serviços legais em pouco tempo e, principalmente, tornando, cada vez mais, a área legal estratégica. É isso que alguns escritórios pioneiros, como o Peixoto & Cury, já perceberam e começaram a adaptar seus modelos de negócio para além da tecnologia. José Ricardo Martins, um dos sócios mais ativistas nesta transformação do uso dos dados legais como uma ferramenta estratégica, “esse ambiente digitalizado pelo processo eletrônico, de forma integrada com ciência de dados, criou a oportunidade de reinventarmos a forma pela qual nos relacionamos com nossos clientes e, obviamente, com o mercado de forma geral. ”

A grande questão é que este cenário muda tudo; afinal, onde há dados, é possível mensurar, entender, testar. A quebra de paradigma no mercado legal é tão profunda que pode afetar todo tipo de decisão, desde uma simples escolha de peça jurídica para usar, qual advogado contratar para aquela causa ou até mesmo decisões estratégicas dentro de um negócio. E é aí que a coisa pode mudar muito de cenário.

O departamento legal sempre foi visto como um ambiente burocrático e de custos dentro das empresas. Mas os dados agregam um elemento que passa a tornar as atividades mais assertivas e com um “ROI” mensurável, assim como aconteceu no mercado publicitário. Ou seja, os eventos passam a ter probabilidades de verdade, e os “achismos” são deixados de lado, gerando uma série de oportunidades e posicionando o jurídico realmente como estratégico.

O outro lado da moeda é que as inovações são para todos, inclusive para os reguladores. Afinal, o acesso a dados e capacidade de modelar não estão sendo apenas mudanças de jogo no lado privado. Reguladores e governo já estão de olho em como essas ferramentas, por exemplo, afetam o cálculo de provisões e as estimativas de perda em processos judiciais. Ou seja, quem não estiver pronto, não apenas vai perder capacidade competitiva, como pode se deparar com um governo e instituições mais aparelhados, que em pouco tempo estarão aplicando essa tecnologia nas áreas de fiscalização e enforcement. Afinal, a atividade jurídica sempre foi baseada em pesquisa de jurisprudência de provas, e agora com essa digitalização é possível transformar realmente o jurídico em um ambiente Data Driven.