Espaços de coworking expandem alcance e oferecem eventos e serviços à comunidade

Mão dupla. Sala de estar do Templo funciona como estação de trabalho e área de exposições – Pedro Teixeira / Agência O Globo

Pense em um espaço de coworking e tente saber como ele funciona. Alguns poderão imaginar lugares reservados e discretos, com pessoas das mais diferentes idades e profissões concentradas em seus projetos. Outros poderão visualizar cômodos amplos e descolados, com uma aparência mais despojada, mas ainda assim com gente fazendo coisa séria. Mas, certamente, espaços que recebem eventos cheios e com muita movimentação ou verdadeiras salas de aula, onde visitantes mais aprendem do que trabalham, são cenários mais difíceis de vislumbrar. É que, além de se preocuparem com a fluência de atividades e ideias diversas, como é da natureza do coworking, tais estabelecimentos estenderam seu alcance, passando a promover encontros e serviços à comunidade. Muitos são gratuitos.

A popularização do coworking e a ampliação de estabelecimentos do tipo colaboraram para que serviços e eventos fossem pensados com foco na comunidade. Os encontros acabam atingindo pessoas que moram perto das instalações e, principalmente, gente que ouviu falar de alguma atividade através de um conhecido ou usuário do espaço. Os locais oferecem ao público programações que vão das mais formais, como cursos, palestras e bate-papos, às mais descompromissadas, como clube de cinema, almoço ou happy hour.

É o caso do Templo, coworking com filiais na Gávea e em Botafogo, que disponibiliza mesas para quem vai apenas trabalhar, além de cafés da manhã, feiras de troca de produtos e biblioteca colaborativa para os que desejam espairecer ou não tenham vínculos com a casa.

— Como o Templo surgiu em 2012, numa época em que o coworking ainda era pouco difundido, a casa ficou em evidência, o que ajudou a trazer visibilidade para aquilo que é oferecido atualmente. Com o tempo, a coisa foi naturalmente se segmentando, e hoje o público tem muito mais a ver com a nossa proposta, o que se reflete na elaboração de ideias e serviços com mais adesão — diz Herman Bessler, sócio-fundador do espaço.

Para Bessler, o local tem o comportamento de um clube, só que num espaço de 1.200 metros quadrados: na sala principal, logo na entrada da casa, ficam um espaço para exposições e o cineclube; nas estações de trabalho formais as mesas são rearrumadas para receberem palestras e workshops, que podem ser gratuitos ou pagos; e no jardim é onde se desenrolam as happy hours, com banquinha de tapioca e cerveja artesanal, e onde são oferecidas aulas de meditação e ioga, além de massagem. Como Bessler faz questão de frisar, o espaço convive bem com trabalho, estudo e diversão.

Na Fazedoria, localizada no Jardim Botânico, esse protocolo se repete. Quando a casa está em modo “normal” de operação, o que se vê é um monte de mesas e gente ocupada. Mas quando recebe uma feira de moda, sua atividade mais comum, o espaço dedicado aos profissionais some e se transforma.

O espaço de coworking Doca, em Ipanema: trabalho e exibição de filmes – Pedro Teixeira / Agência O Globo

Isso ocorre porque a área que deveria comportar a garagem da residência virou uma grande sala de afazeres, que manteve o portão por onde o carro passaria. Assim, durante um evento, o acesso é aberto, permitindo que o público dê uma volta em torno do imóvel. Fora da rotina mais descontraída, a passagem fica fechada e a sala recebe cursos para turmas pequenas. Aulas de francês, cosmética natural e iluminação serão ministradas este mês; as matrículas serão abertas em breve. A ideia é ministrar conteúdos mais voltados para o dia a dia, que sejam postos em prática assim que forem ensinados.

— A curadoria dos cursos também é feita com base no que diz o slogan daqui, do fazer acontecer, e por isso eles têm um caráter mais prático. A coisa de querer fazer e de movimentar a economia criativa faz parte do nosso DNA — comenta Marcos de Oliveira, gerente do coworking. — Hoje em dia, há espaço para tudo. Um dos palpites que nos deram foi o de oferecer um curso de fotos para aplicativos de relacionamento, o que acabou não sendo feito. Também costumamos receber muitas sugestões de cursos e propostas de evento, de maneira que tivemos de frear um pouco o movimento para a lista de espera não ficar grande.

Em Ipanema, onde funciona o coworking Doca, o esquema é o mesmo, com desdobramentos similares. De acordo com Haroldo Portella e Julia Gostkorzewicz, sócios do espaço, os eventos foram se moldando ao público frequentador, formado por pessoas direta ou indiretamente ligadas a coworkers. Para elas, há bazares, cursos, rodas de bate-papo e feiras gastronômicas temáticas à disposição, realizados de tempos em tempos, assim como um cineclube. No corre-corre diário, ainda há almoço feito por residentes, em uma cozinha destinada a ocupantes, sem ligação operacional com a administração. Embora a refeição seja paga, a maioria das atrações é de graça.

— Esses eventos complementam a formação de quem ocupa o espaço como ambiente de trabalho. Para além da interação profissional, as atividades extras promovem um tipo de relacionamento que se dá em outra conjuntura. As pessoas vão quebrando barreiras e começam a aprofundar os vínculos. Quem era companheiro de trabalho virou amigo. Por aqui nos sentimos como uma grande família — comenta Julia.

Visibilidade, promoção e retorno

Todo estabelecimento de coworking preza a colaboração, e tal característica se evidencia no momento de planejar as atividades. Muitas delas são propostas pelos próprios clientes, que às vezes tomam a frente da ideia e organizam os encontros. No Templo, as aulas de ioga e meditação foram sugeridas a Herman Bessler, enquanto a exposição em cartaz na casa foi uma iniciativa dele. A mostra saiu do papel justamente por haver artistas residentes que frequentam o local. Na Doca, a comunicação em torno dos eventos pode ser feita durante o processo de montagem, quando os sócios pedem a opinião dos ocupantes — para o cineclube, por exemplo, eles podem dar palpites de filmes.

As trocas estabelecidas com residentes e demais parceiros também têm efeito no pós-evento devido à diversidade do público que participa das atividades. Se o retorno do visitante for positivo, os gestores podem conquistar a confiança e a fidelidade dessas pessoas, construindo um relacionamento que pode se reverter em adesão em eventos futuros ou até em acordos para novos serviços.

— A receptividade costuma ser muito boa, principalmente por conta desse contato interpessoal. Há pouco tempo, a casa fez um evento com muitos participantes, e um deles gostou tanto da experiência que na mesma ocasião fechou mais dois — lembra Marcos de Oliveira, da Fazedoria.

De acordo com o gerente, o coworking do Jardim Botânico anuncia sua programação pelas mídias sociais, investindo muito nesse recurso. Apesar disso, ele e os demais representantes da área insistem no argumento de que o boca a boca ainda é a melhor forma de vender o peixe do trabalho coletivo. Da mesma forma que os eventos e serviços podem movimentar novas edições e chamar novos parceiros, também servem de vitrine para a atividade principal desses espaços, como um mostruário das melhores qualidades de cada estabelecimento. Portanto, as atividades educativas e de lazer podem fazer a diferença na escolha do ambiente profissional, na tomada de decisão de um potencial usuário.

— Já cedemos nosso espaço para apresentações de empresas famosas, que pelo nome chamam a atenção das pessoas de fora. Mesmo que os eventos não sejam nossos, eles acabam atraindo gente que nunca contratou os serviços, fazendo o estabelecimento ganhar em visibilidade. Ocasionalmente, os visitantes perguntam sobre o espaço, o que pode render novas idas à casa em outros momentos, para frequentar atrações gratuitas ou pagas — argumenta Bessler, do Templo.

A visibilidade também pode ser útil aos negócios não necessariamente ligados à área do coworking — na verdade, todos tendem a ganhar com o movimento de público gerado por um evento grande. A chef Priscila Motta, atual ocupante da cozinha da Doca, paralelamente comanda um food truck chamado Pub Truck, em parceria com um sócio. Como seu carrinho também fica em Ipanema, as trocas que estabelece com visitantes e residentes durante os eventos do coworking ajudam na divulgação de seu outro ganha-pão.

— Quando estou na cozinha da Doca, falo do food truck para as pessoas. Quando estou no food truck, promovo a cozinha da Doca. Ou seja, tenho duas frentes de divulgação mútua ao mesmo tempo — comenta ela.

Para Marcos de Oliveira, quem participa do evento como expositor ou palestrante cresce profissionalmente e conquista a alegria de ter colocado um projeto em prática.

— Quem organiza as atividades vai ganhando know-how de organização e aos poucos cria vínculos com a região, seja pelo contato com moradores ou pela aproximação de outros empreendedores. E quem visita aproveita os dois lados. No fim, todos saem ganhando — explica Oliveira.

Interação é palavra de ordem

Se alguns espaços de coworking a diversidade de serviços é grande, em outros o forte é a segmentação. Inaugurado há menos de duas semanas em Copacabana, o Lala’s Coworking oferece estrutura completa para profissionais de beleza, como cabeleireiros, esteticistas e depiladores autônomos, que podem alugar cadeiras e salas por dia ou por mês.

— A ideia surgiu do muito que pesquisei em São Paulo, onde os coworkings de beleza são uma realidade. Lá, este modelo de negócio possibilitou um circuito mais autoral entre os profissionais da área, que puderam imprimir seu estilo nos cortes e tratamentos por não estarem atrelados ao padrão dos salões. Dessa forma, ganha o profissional e também o público, que pode experimentar novos estilos — explica a publicitária Mariana Cardinali, que fundou o Lala’s com o marido André Martinho.

Maíra Martins. A estilista está criando o cowedding, que vai reunir profissionais ligados à área de casamento – Brenno Carvalho / Agência O Globo

O estabelecimento também tem parceria com alguns cabeleireiros e manicures, que atendem sem hora marcada. Além do espaço de beleza, o Lala’s é composto por uma pequena cafeteria, que oferece grãos especiais, bolos, lanches e almoço.

Segundo Mariana, além de ser um espaço para os profissionais receberem os clientes, o coworking oferece aos que pensam em abrir um estabelecimento no futuro a possibilidade de terem a vivência dentro de um salão. O objetivo é que possam conhecer um pouco mais a dinâmica do negócio.

— Por outro lado, temos dois profissionais que chegaram agora e que acabaram de fechar seus salões. Eles vão trabalhar de forma autônoma. O coworking também é uma oportunidade bacana para quem está fazendo cursos e deseja fazer sua clientela — ressalta Mariana.

O Lala’s tem cadeiras para corte de cabelo, lavatório e um mezanino reservado, que pode ser usado para tratamentos específicos, como escovas progressivas. O aluguel é feito por cadeira. Elas podem ser reservadas por meia diária (R$ 70), diária (R$ 120) ou negociadas mensalmente.

Mariana diz que, em tão pouco tempo de funcionamento, a interação entre os profissionais foi surpreendente. Mas não só entre eles.

— É uma troca maravilhosa, que acontece também entre os clientes. O Lala’s reúne desde os jovens mais modernos às senhoras mais tradicionais de Copacabana. E é bonito de ver a interação entre eles. Dia desses tinha uma jovem ensinando uma senhora a usar as redes sociais, por exemplo — lembra.

Outro coworking que vai concentrar profissionais de um segmento num só local é o que funcionará no Marry Spot, que será inaugurado, quinta-feira, às 17h, em Botafogo. Capitaneado pela estilista Maíra Martins, o espaço reunirá fornecedores exclusivos num só local. No terceiro andar funcionará o cowedding, onde as noivas poderão marcar hora com profissionais responsáveis por serviços indispensáveis ao casamento dos sonhos. Fotógrafos, maquiadores, DJ e decoradores são alguns dos serviços selecionados pela curadora que estarão à disposição dos clientes. Haverá também uma estação fixa de cabelo e maquiagem que funcionará com hora marcada. Outra novidade é que as noivas poderão agendar horário para atendimento exclusivo com estilistas do Rio e de outros estados.

— Muitas vezes, a noiva só consegue se ver completa no dia do casamento. Na Marry Spot, ela terá a oportunidade de testar maquiagem, cabelo, acessórios e vestido simultaneamente, facilitando as escolhas e fazendo ajustes em conjunto — explica Maíra, destacando essa nova modalidade de coworking, agora exclusivamente voltado para o mercado de noivas.

Segundo ela, a partir de agora, profissionais que ainda não têm seu próprio ateliê e também estilistas de outros estados do país que antes não tinham local para trabalhar no Rio poderão agendar um horário e ter um espaço específico para receber seus clientes, que receberão até champanhe. O aluguel, mensal, custa R$ 700.

A estilista conta que a ideia de abrir o Marry Spot surgiu a partir de seu próprio casamento. Na época, ela lembra a dificuldade que teve ao visitar os fornecedores, pois cada um ficava num local diferente.

— Chega um ponto em que você não curte mais aquele momento. O que era para ser uma experiência bacana estava virando um grande estresse. Sem falar que eu precisava conciliar todo esse processo com o meu trabalho. Aí pensei que seria perfeito ter todos os fornecedores num único lugar — conta Maíra.

Na época, ela percebeu que o mercado estava mudando e que a parceria já se fazia presente, com muitos profissionais fechando seus escritórios para dividir o espaço com outros fornecedores.

— Eu, que sempre tive vontade de expandir meu ateliê, achei que era o momento ideal — comenta a estilista.

FONTE: O GLOBO