Startups de alimentos investem em carne de caju e leite vegetal

As foodtechs, denominação das inovadoras na produção de alimentos, representam 37% do total das startups do agro que atuam em atividades fora das fazendas.

A busca crescente por alimentos mais saudáveis e produzidos a partir de processos certificados e rastreados está estimulando a inovação no setor agropecuário.

Para atender a essa demanda, pequenas, médias e grandes empresas investem cada vez mais em pesquisas sobre o uso de matérias-primas diferenciadas, como carnes vegetais e leites de castanhas ou cereais, e em procedimentos sustentáveis.

“Quando consideramos as startups agro, as chamadas agtechs, é notório o crescimento das iniciativas que se enquadram na categoria alimentos inovadores. As foodtechs, dedicadas a traduzir as novas tendências alimentares em produtos, representam 37% do total de agtechs do país voltadas para atividades fora da fazenda”, relata André Dutra, chefe adjunto de transferência de tecnologia da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa).

“Há demanda e agora trabalhamos para oferecer produtos de qualidade, ao mesmo tempo em que olhamos com atenção para a cadeia que alimentará esse processo produtivo”, afirma Dutra, ao explicar que entre os objetivos da Embrapa está agregar valor à matéria-prima brasileira e, ao mesmo tempo, preservar os biomas nacionais.

“Nesse cenário, já nasceram parcerias que renderam, literalmente, bons frutos, entre os quais um corante produzido a partir de juçaí (o “açaí” da palmeira juçara), corante natural de uvas, jaca em conserva, polpa de coco verde e carne de caju”, diz.

Inspiração

A carne de caju, por exemplo, nasceu de uma parceria entre a Embrapa e a Amazonika Mundi, foodtech voltada para a criação de produtos naturais, à base de matéria-prima nacional.

Bruno Rosolem, sócio-proprietário da empresa, conta que tirou a ideia da música de Alceu Valença (Morena Tropicana) e foi atrás de ver as possibilidades.

Encontrou um projeto já em andamento na Embrapa, sobre resíduos do caju, e, juntos, definiram processos que viabilizariam a utilização na produção de alimentos. Nasciam os hambúrgueres e almôndegas de carne de caju.

“Acreditamos que essa demanda não é uma moda passageira. Os brasileiros estão mais preocupados com a saúde e buscando alternativas. Nosso desafio, como empresas, é pesquisar alternativas capazes de caber no orçamento da população, com processo produtivo responsável”, avalia Rosolem.

A Amazonika Mundi vem realizando pesquisas desde 2016 e têm obtido bons resultados. A marca já está presente em nove estados brasileiros, em três mil pontos de venda, e planeja ingressar na região Sul e em Minas Gerais ainda este ano.

Ainda em 2023 devem ficar prontas a expansão da matriz da fábrica, localizada em Niterói (RJ), e uma nova unidade no Ceará, que será inaugurada para processar os resíduos de caju antes de enviá-los ao Rio de Janeiro.

“No futuro, pretendemos ampliar o portfólio. Já temos pesquisas em andamento, junto à Universidade Federal do Rio de Janeiro, sobre a utilização da proteína de ervilha”.

A Bioporã, micro foodtech localizada em Alto Paraíso de Goiás, na região da Chapada dos Veadeiros, tem como fio condutor do trabalho a criação de produtos naturais com base em matérias-primas nacionais ainda subaproveitadas (e até pouco conhecidas), porém bastante nutritivas.

A empresa familiar começou as atividades em 2013 e, de lá pra cá, criou diversos produtos cuja utilização nas receitas se assemelha a itens tradicionais, como leite condensado e creme de leite, por exemplo, mas com pegada sustentável e sem adição de açúcares.

“Acreditamos na valorização da economia circular. Nosso objetivo é promover o desenvolvimento econômico com o melhor uso dos recursos naturais, seja por novos modelos de negócios ou meios de produção e suporte aos produtores e coletores. Nosso trabalho visa esse modelo produtivo”, afirma Thiago Césare, sócio-proprietário da Bioporã.

O “leite condensado vegano”, como define Thiago, é feito a partir de creme de castanha de caju e macadâmia, e produzido lentamente em moinhos de pedra. Para substituição do creme de leite, o produtor sugere o creme de caju natural, apenas temperado com ervas aromáticas.

Há ainda sobremesas feitas com castanha de baru e amendoim ou outra dupla inusitada, como creme de caju e pedaços de castanha de licuri. Por enquanto, as vendas físicas da Bioporã concentram-se regionalmente, mas o site entrega para todo o Brasil.

Atenta aos desejos dos consumidores, gigantes do setor também se reinventam. É o caso da Natural One, foodtech com índices que atingem a segunda posição na venda de sucos naturais no país. Em entrevista à Globo Rural, o CEO da companhia, Rafael Ivanisk informou que a empresa já trabalha em uma transição de posicionamento no mercado.

“Após seis anos de atuação, estamos consolidados no mercado de sucos naturais. Agora visamos conquistar espaço como produtora de bebidas naturais, um setor em ascensão e com diversos desafios”, afirma.

O primeiro passo foi o desenvolvimento de quatro tipos de leites vegetais, à base de aveia. Os produtos chegaram em maio às prateleiras do mercado paulista e, ao longo do segundo semestre, devem estar em 10 mil pontos de venda de todo o Brasil. A expectativa da empresa é vender 1 milhão de litros de leite vegetal em 12 meses.

“Foram dois anos de pesquisas para desenvolvimento de um produto que traduzisse a busca dos consumidores por opções saudáveis e palatáveis, para que o leite vegetal comece a fazer parte da rotina do brasileiro, e não seja apenas algo pontual no cardápio”, diz o executivo.

De acordo com Ivanisk, a escolha da aveia aconteceu em grande oferta do cereal no país. “Precisamos pensar no preço para o consumidor final, e a disponibilidade da matéria-prima é fator chave nesse cenário. Como segundo fator, avaliamos a questão nutricional. Consumidores de leite buscam uma fonte de cálcio e a aveia é rica nesse nutriente”.

O executivo acredita que o Brasil tem potencial para desenvolvimento do setor a curto prazo. “Em cinco anos devemos ter um cenário já bastante diferente. Temos tecnologia para isso e um público aberta à inovação”, finaliza.

Expansão

Estudo realizado pela Future Market Insights projeta crescimento global de 9,9% CAGR (retorno de investimento composto) entre 2023 e 2033 para o mercado de leites vegetais. O relatório da consultoria registra mercado global atual em US$ 19,8 bilhões e projeta para 2033, US$ 47,2 bilhões.

“Os principais fabricantes que operam no mercado global estão prontos para reajustar suas estratégias à medida que os consumidores mudam para um estilo de vida saudável”, aponta a empresa.

FONTE: https://globorural.globo.com/agtech/noticia/2023/06/startups-de-alimentos-investem-em-carne-de-caju-e-leite-vegetal.ghtml