Startups apostam em ‘crediário digital’

Modalidade brasileira, conhecida como ‘buy now, pay later’, desperta interesse mundo afora
Por Danylo Martins — Para o Valor Economico

Andrea Burattini, da Dinie: potencial para pequenas empresas oferecerem serviços financeiros de valor alto agregado — Foto: Divulgação

O crédito direto ao consumidor (CDC) – popularmente conhecido como crediário – está ganhando adeptos no mundo. O parcelamento no varejo é antigo no Brasil, e agora vem se tornando uma tendência mundo afora, principalmente em mercados desenvolvidos, como Estados Unidos, Europa e Ásia, que não estavam acostumados com compras parceladas. Lá fora, o “novo crediário” assumiu contornos digitais para melhorar a experiência do usuário e tem sido chamado de “buy now, pay later” (BNPL, na sigla em inglês). Conforme dados da consultoria CB Insights, a indústria global de BNPL tende a crescer de 10 a 15 vezes, atingindo US$ 1 trilhão em volume de mercadorias ao ano até 2025. A expansão da modalidade é liderada por startups e fintechs, como a sueca Klarna (que já vale mais de US$ 45 bilhões), a americana Affirm e a australiana AfterPay. Mas o potencial desse ‘novo’ mercado vem despertando interesse também de grandes empresas, como o PayPal – que lançou o parcelamento no ano passado – e a Apple, que vai desenvolver uma solução de BNPL em conjunto com o banco americano Goldman Sachs, segundo noticiado este mês.

A ‘volta’ do crediário é um reflexo do crescimento do e-commerce no mundo, expansão que foi acelerada durante a pandemia, com as restrições ao varejo físico. “Ao começar a ser oferecido de forma digital, inclusive no e-commerce, e com um UX [sigla para experiência do usuário] bem mais simples e agradável do que pagar o carnê, a percepção dos benefícios do crediário para o consumidor e para o lojista voltará a crescer”, avalia Ricardo Kalichsztein, fundador e CEO da Bom Pra Crédito. A fintech, que tem um marketplace de crédito on-line desde 2013, acaba de lançar o que está chamando de ‘CDC digital’, com parcelamento em até 24 meses. Ao contrário do crediário comum, em que normalmente o produto é feito por uma só instituição financeira, na solução desenvolvida pela Bom Pra Crédito, o perfil do cliente é analisado por mais de um credor – hoje, a plataforma soma mais de 30 parceiros, entre bancos, financeiras e fintechs. A colombiana ADDI desembarcou este ano no Brasil. A aposta da fintech é numa solução de pagamento habilitada no check-out, que permite o parcelamento em até três vezes sem juros, sem necessidade de cartão de crédito. O pagamento pode ser feito por Pix ou boleto. Já os varejistas e e-commerces se plugam à plataforma via APIs (sigla para interface de programação de aplicações) ou por meio de integração com plataformas de e-commerce, como VTEX, Nuvemshop e WooCommerce. “A solução funciona também para televendas, ou pelo ‘social selling’, via link de pagamento pelo WhatsApp. E também para lojas físicas, podendo gerar link de pagamento”, explica Caio Ribeiro, diretor-geral da ADDI no Brasil. Fundada em Bogotá em 2018 por Santiago Suarez, Daniel Vallejo e Elmer Ortega, a ADDI já originou mais de US$ 60 milhões em empréstimos na Colômbia, onde tem mais de 400 varejistas como clientes. No Brasil, a fintech está se aproximando de cem varejistas, entre operações on-line e físicas. “Estamos em conversas com grandes varejistas”, diz Ribeiro. A Dinie, fundada em Berlim pelas brasileiras Suzy Ferreira e Andrea Burattini, desenvolveu produtos, como o limite rotativo em conta e o pagamento parcelado entre empresas, que podem ser oferecidos por plataformas digitais a seus clientes. “Nossa grande visão é permitir que ecossistemas que não são do mundo financeiro possam se tornar ‘one-stop-shop’ das pequenas empresas, podendo oferecer serviços financeiros customizados de valor alto agregado. A ideia é que esses ecossistemas virem os bancos do futuro”, explica Andrea Burattini, cofundadora da Dinie. Em menos de 18 meses de operação, a empresa já concedeu mais de 1.500 empréstimos, a base de clientes cresceu 20 vezes e cinco plataformas digitais já estão integradas, entre elas, o aplicativo de delivery iFood, o marketplace de produtos artesanais Elo7 e a plataforma uruguaia de pagamentos dLocal. Juntas, essas plataformas somam em suas bases mais de 1 milhão de pequenas empresas. Com a dLocal, a Dinie fechou uma parceria para a oferta da sua solução de ‘buy now, pay later’, o DiniePay, que permite parcelamento de um a nove meses. Nos próximos meses, a fintech deve divulgar novas parcerias. Segundo Bruno Diniz, sócio da consultoria Spiralem, o Pix deve pavimentar o caminho para novos entrantes que queiram explorar soluções nesse mercado. Na agenda evolutiva do sistema, inclusive, o BC prevê para o primeiro trimestre de 2022 o Pix Garantido, que permitirá o parcelamento de compras. Na prática, consumidores terão mais uma alternativa de pagamento. “Acaba tirando a dominância de alguns grupos, principalmente em cartão de crédito. Com essa pluralidade, aumenta a competição e, com isso, produtos vão sendo melhorados.”

FONTE: https://valor.globo.com/publicacoes/suplementos/noticia/2021/07/30/startups-apostam-em-crediario-digital.ghtml