Startup valuation e cuidado com ativos intelectuais

O que torna uma marca e uma patente fortes não é a sua concessão pelo INPI, mas a qualidade que possuem enquanto ativos intangíveis e direitos de propriedade intelectual.

Na última década, os investimentos nas startups brasileiras vêm acumulando cifras bilionárias. O efeito das diversas mudanças causadas pela pandemia refletiu no ano de 2021, injetando quase 2,6 vezes mais no mercado do que no ano anterior. Estilos de vida e formas de consumir mudaram, abrindo possibilidades e evidenciando as oportunidades de inovação.

Pesquisa da Distrito, plataforma de inovação que monitora o setor, mostra o movimento de investidores americanos e chineses – os primeiros saindo do mercado já saturado, enquanto os outros buscavam alternativas às restrições – procurando países do sul global, como o Brasil, com grandes oportunidades e dólar barato.

O que torna uma marca e uma patente fortes não é a sua concessão pelo INPI, mas a qualidade que possuem

Os resultados para tais investimentos já começaram a surgir. Em 2022, o Brasil subiu três posições no ranking da Global Innovation Index (GII), elaborado pela Organização Mundial da Propriedade Intelectual. Ocupando a 54ª posição, atrás apenas do Chile (50ª) na América Latina, o país está, de fato, melhorando o ambiente de inovação, mas ainda há muito para ser feito sob a ótica de ganho de produtividade da economia e melhoria do bem-estar da população.

Entretanto, o Relatório de Indicadores Nacionais de Ciência, Tecnologia e Inovação revelou que o país investe cerca de 1% do PIB em ciência e tecnologia, abaixo do seu potencial quando comparado a outros países e ao potencial próprio. Na contramão da crescente dos investimentos no setor, as solicitações para registro de patente estão em queda há três anos. Para fins de comparação, enquanto no Brasil foram depositados 27 mil pedidos de patentes em 2018, China e Estados Unidos registraram 1,2 milhão e 600 mil respectivamente.

A morosidade no processo de patentes compõe a lista de principais motivos que dificultam o aumento exponencial no número de registros no Brasil. Segundo dados do Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI) e do Ministério da Economia, o prazo médio é de 4 anos para decisão técnica final de pedidos de patentes (contados a partir do pedido de exame pela empresa) e de 13 meses para registro de marca nos casos de pedidos sem oposição por outros detentores de marcas potencialmente similares. Se existir oposição, o prazo médio sobe para 15 meses. Esses números são absolutamente desestimulantes para as empresas e repelem investimentos na área de pesquisa e desenvolvimento.

Mas esse cenário deve mudar para melhor. Pelo menos essa é a expectativa criada pelo mercado, após o novo vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, sinalizar em conversa com empresários que o governo federal trabalhará para reduzir esse prazo pela metade, visando, justamente, atrair investidores. Vale lembrar que a pasta foi recriada após decreto do novo governo e passou a abrigar o INPI em sua estrutura. Ainda não foram indicados os novos dirigentes da instituição.

Para além dos fatores externos e burocráticos, é inegável e necessário pontuar que também existem fatores culturais que precisam de atenção. Dados de uma pesquisa da consultoria PwC Brasil e da Liga Ventures apontam que 25% das startups em estágio de escala não adotam nenhuma das práticas de governança corporativa associadas à tecnologia e propriedade intelectual. Esse indicador evidencia a urgência de mudança de mindset dos atores envolvidos acerca do valor, importância e da relevância dos ativos intelectuais.

As marcas e patentes são importantes mecanismos de proteção indispensáveis do titular, assegurando que terceiros não autorizados irão se abster de explorar o produto patenteado ou violar os sinais distintivos que estejam devidamente protegidos pelo direito marcário.

O fato de a startup ser titular de uma patente pode ser um diferencial explorado na construção e implementação do branding, o conjunto de estratégias de gestão alinhadas ao posicionamento, propósito e valores da marca. Há, portanto, uma sinergia potencial entre ser titular de uma marca e de uma patente.

O poder de impedir a exploração de terceiros pode gerar duas externalidades positivas, como a manutenção do seu market share e a garantia de estabilidade dos ganhos arrecadados com a oferta dos produtos e dos serviços, ao impedir que concorrentes oportunistas – os famosos free riders – diluam tais receitas oferecendo produtos que infrinjam a marca ou a patente.

Vale ressaltar que o que torna uma marca e uma patente fortes não é a sua concessão pelo INPI, mas a qualidade que possuem enquanto ativos intangíveis e direitos de propriedade intelectual. Isso porque a titularidade de uma marca com elemento visual ofensivo ou com nome inadequado dificilmente municiará uma boa estratégia de branding, da mesma forma que a patente de um método que não resolva um problema relevante para o mercado raramente contribui para a geração de vendas ainda que se esteja diante de algo inovador, quiçá de receitas de licenciamento.

O aprimoramento da legislação brasileira sobre patentes e a necessidade de investimentos pela esfera pública e privada em pesquisa e inovação tem sido pauta recorrente em discussões, mas já é possível ver movimentações e possibilidade de mudança nesse início de ano. Ao mesmo tempo, fica evidente o reforço do entendimento entorno da propriedade intelectual e os mecanismos que as empresas podem e devem usar a seu favor.

FONTE;

https://valor.globo.com/legislacao/noticia/2023/01/24/startup-valuation-e-cuidado-com-ativos-intelectuais.ghtml