STARTUP USA NANOTECNOLOGIA PARA A PRODUÇÃO DE TECIDOS INTELIGENTES

Sensível ao toque, o Dye-IO possibilitará a interatividade da roupa com dispositivos móveis, como computadores, Smart TVs e celulares

Dye-IO: vantagem do processo é a obtenção de produtos mais flexíveis e mais confortáveis para o uso em vestimentas (Foto: Reprodução)

Há cerca de quatro anos, a Têxtil Águida, empresa familiar fundada em 1983 no município paulista de Santa Bárbara do Oeste, resolveu investir em um campo novo e promissor: a produção de tecidos inteligentes, que agregam recursos da eletrônica e da computação. E para viabilizar essa nova frente de atuação, buscou ganhar mais agilidade e autonomia por meio da criação de uma spin-off, a AG Texteis, constituída em 2018.

No final daquele ano, a spin-off corporativa já tinha um tecido eletricamente condutor – criado com recursos da nanotecnologia com o apoio do programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE) da FAPESP. “Desenvolvemos um processo de nanotingimento que converte fios e fibras sintéticas e naturais em versões eletricamente condutoras, a partir de formulações especiais de nanotubos de carbono e nanofios de prata”, informa a química Renata Cristiano Nome, pesquisadora responsável pelo projeto batizado de Dye-IO.

Durante o processo de tingimento, explica a pesquisadora, esses nanomateriais com propriedades condutoras se fixam no tecido. “Testes de condutividade indicam que essa aderência se mantém mesmo após lavagens, o que é essencial para aplicações práticas.”

Para Renata Nome, a grande vantagem desse processo em relação às atuais tecnologias de produção de tecidos eletrocondutores é a obtenção de produtos mais flexíveis e mais confortáveis para o uso em vestimentas. “Nossos competidores diretos – na Europa e Estados Unidos, pois não há atividade industrial em eletrônica têxtil atualmente em desenvolvimento no Brasil – baseiam seus produtos na tradicional deposição metálica por banhos químicos. O resultado é um tecido mais rígido, menos flexível.” Além disso, diz a pesquisadora, esses processos geram grandes quantidades de resíduos potencialmente tóxicos ao meio ambiente e podem consumir grandes quantidades de energia elétrica.

O protótipo desenvolvido ao longo da Fase 1 do programa PIPE, encerrada em março de 2019, recebeu o nome de Tex-Tok. “É um tecido sensível ao toque, que possibilitará a interatividade da roupa com dispositivos móveis, como computadores, Smart TVs e celulares”, explica Renata.

O Tex-Tok é constituído por vários componentes eletrônicos, que incluem um microcontrolador, sensor, módulo bluetooth e bateria. Para demonstrar aplicações práticas desse tecido, a empresa o utilizou em dois brinquedos interativos, um ursinho de pelúcia e um gamepad (comando de videogame). No ursinho, toques na superfície das patas permitem dar comandos para que o brinquedo fale ou grave o som da voz do usuário. O gamepad, em forma de almofada, interage via bluetooth com um celular android.

Mercado em ascensão
A AG Texteis quer ingressar em um mercado bilionário. De acordo com um relatório da IDTechEx, empresa britânica especializada na pesquisa de marketing e negócios em tecnologias emergentes “E-Textiles 2017-2027: Technologies, Markets, Players Report, o mercado de tecidos inteligentes deve atingir a casa dos US$ 5 bilhões em 2027.

Esse mercado engloba tecidos que possuem alguma funcionalidade adicional, como controle térmico, ação bactericida, antichama, condutividade etc. O número de aplicações é praticamente inesgotável. “A possibilidade de agregar ao tecido sensores com conexão de internet pode ser usada para geolocalização, bem como para medir parâmetros fisiológicos [como, por exemplo, batimento cardíaco, pH, nível de glicose etc ] que são importantes nas áreas da saúde e esportes de alto desempenho. Inúmeras áreas podem se beneficiar do desenvolvimento da eletrônica têxtil, mas os setores militar e de segurança têm as maiores fatias de mercado dos tecidos inteligentes, correspondendo hoje a aproximadamente 27% do total do mercado”, relata a pesquisadora. “Estamos à beira de uma nova revolução em que sensores e aplicativos vão migrar dos nossos celulares para as nossas roupas.”

No entanto, a entrada desses produtos no mercado brasileiro ainda pode levar algum tempo, ressalva Nome. “Analistas de mercado têm indicado que o crescimento será gradual e deverá se consolidar em cinco anos. Isso permite que empresas nascentes, como a AG, se posicionem no mercado de forma competitiva.”

A entrada da empresa nesse novo mercado foi uma das questões mais discutidas quando os pesquisadores participaram da 9ª edição da capacitação PIPE Empreendedor, entre outubro e dezembro de 2018. Após muitos estudos e entrevistas com clientes em potencial, a empresa resolveu desenvolver inicialmente produtos para os mercados de moda e decoração.

A AG Texteis tem planos de desenvolver outros produtos, como uma capa para o braço de sofá que se conectará à TV, dispensando o uso do controle remoto.

Mas o apoio do programa PIPE da FAPESP não foi o único fator determinante para viabilizar o ingresso de uma tradicional indústria têxtil em um mercado tão inovador. Também foi fundamental a parceria com o Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer (CTI), uma unidade de pesquisa do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações situada em Campinas.

O primeiro contato ocorreu em 2015, quando o gerente da Têxtil Águida, André Correa Marcilio, e o designer Renan Serrano, da Trendt, resolveram buscar o apoio do CTI. Lá eles conheceram os químicos Fernando Ely, que coordena projetos de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PD&I) no laboratório de eletrônica orgânica, e Renata Nome, que fazia então seu pós-doutorado na instituição.

“Eles nos procuraram com o intuito de desenvolver projetos que integrassem eletrônicos [painéis solares, sensores, displays etc.] a produtos têxteis. O objetivo era utilizar o maquinário existente da Têxtil Águida para fabricar produtos de maior valor agregado e conquistar novos mercados”, conta Fernando.

“Como é missão do CTI apoiar essas iniciativas, estabeleceu-se aí uma colaboração informal que resultou na submissão da proposta ao programa PIPE da FAPESP.” O químico Fernando Ely atua como pesquisador associado – e a equipe também conta com consultores independentes das áreas de design, engenharia elétrica, química e tecnologia têxtil.

“Esperamos agora que o projeto avance e seja incubado [e posteriormente acelerado] dentro do CTI-Tec [parque tecnológico do CTI], que está em fase final de implantação”, planeja a pesquisadora Renata Nome, que coordena o projeto.

FONTE: PEGN