Startup cria farmácia de cannabis. Modelo é visto com ressalva

Com potencial estimado em R$ 26 bilhões e um número crescente de novas aprovações da Anvisa, o mercado de canabidiol atrai novos projetos como o da startup Cannect. A healthtech anunciou a criação de uma farmácia de cannabis e aposta em parcerias com o varejo farmacêutico e distribuidoras para ampliar o alcance desses produtos no mercado brasileiro.

Com atuação em programas de inovação para a área hospitalar, os empreendedores Allan Paiotti e Fernando Domingues estruturaram a startup em agosto de 2021. A proposta inicial era ser um ecossistema digital para conectar pacientes, médicos e instituições de saúde.

“Mas com o baixo número de médicos que prescrevem cannabis no país – cerca de 2 mil – e o processo ainda custoso para uma rede do varejo físico viabilizar a oferta desses produtos, identificamos a oportunidade de agregar a farmácia ao nosso negócio”, comenta Paiotti.

Para colocar o projeto em prática, a empresa obteve R$ 10 milhões em uma rodada de negócios no fim do ano passado, atraindo investidores-anjo como o médico Abdalla Skaff, coordenador do Departamento de Diagnóstico por Imagem do HCor.

A operação da farmácia de cannabis

O B2C é uma das frentes do modelo de negócio da startup, pelo qual os pacientes podem agendar consultas e obter a prescrição, o que viabiliza iniciar o tratamento. Mas é necessário não apenas o envio da prescrição digital, como também da receita em papel – azul do tipo B ou amarela do tipo A, caso a substância contenha mais de 0,2% de THC. A Cannect, então, se propõe a dar andamento aos trâmites de dispensação a distância e de coleta da receita médica via transportadora.

healthtech mantém uma central de armazenagem em Maringá (PR), mas com estoque atual limitado a 500 SKUs. A busca por redes de farmácias e distribuidoras visa justamente a aumentar a escalabilidade do negócio. Para isso, a startup firmou parcerias com as fabricantes Belcher, Nunature e Zion, que receberam aval da Anvisa para comercializar quatro produtos à base de CBD. Hoje, 19 produtos foram aprovados pela agência.

Esses acordos permitiram que o custo médio do frete caísse de R$ 400 para R$ 110. “A tendência é que essa despesa se torne ainda menor à medida que houver novas aprovações e a nacionalização da produção, conforme já anunciado pela Nunature”, afirma Paiotti. “Tomando como exemplo a dor crônica. É um problema enfrentado por cerca de 77 milhões de brasileiros, para os quais a prescrição da cannabis poderia ser uma alternativa terapêutica. Há um vasto terreno para crescer”, acredita.

Modelo é sustentável?

A RDC 660, implementada em março deste ano e que consolidou as resoluções 335 e 570, trouxe mais segurança regulatória para a importação de derivados de canabidiol. No entanto, a sustentabilidade de iniciativas como a farmácia de cannabis é vista com ressalvas por especialistas.

A startup tem como trunfo o cadastro de médicos prescritores na plataforma, na visão de Fábio Costa, coordenador do grupo de trabalho farmacêutico da Associação Brasileira das Indústrias de Cannabis (ABICANN). No entanto, ele pondera que desde 2018 o varejo farmacêutico já pode comercializar produtos de cannabis. “E estamos falando de mais de 81 mil PDVs, número que ultrapassa 93 mil se somarmos as farmácias de manipulação”, enfatiza.

“A Cannect é uma plataforma que facilita a comercialização. Mas com estrutura de estoque robusta, tecnologias para mapear o comportamento do paciente e capilaridade, é natural que grandes redes de farmácia incorporem essa operação assim que o mercado de CBD estiver amadurecido, com braços de tecnologia e telessaúde em seu próprio ecossistema”, destaca. “Já qualquer healthtech dispenderá um esforço maior para garantir o retorno sobre o investimento”, complementa.

Farmácia tradicional pode preencher atual lacuna

Para Costa, a legislação sobre importações não veio acompanhada de orientações sobre o uso, o que compromete a jornada do paciente. Porém, o que representa um gap atual surge como oportunidade para farmácias. “Em torno de 30 mil pacientes já tiveram acesso a produtos à base de cannabis no Brasil por meio de importação. Mas eles esbarraram na dificuldade para continuar o tratamento e na ausência de respostas terapêuticas, por absoluta falta de assistência farmacêutica. Estamos falando de tratamentos individualizados que exigem o acompanhamento de uma farmácia clínica estruturada”, acredita.

FONTE: https://panoramafarmaceutico.com.br/startup-cria-farmacia-de-cannabis/