“Ser inovador não é comprar uma startup ou ir conhecer o Vale do Silício”

PEDRO WAENGERTNER, CO-FUNDADOR E CEO DA ACE (FOTO: REPRODUÇÃO/FACEBOOK)

Que imagem aparece à sua mente quando pensa em inovação? Ambiente colorido, pessoas criativas, post-its pelas paredes? Ideias inovadoras podem até nascer assim, mas para Pedro Waengertner, CEO e fundador da aceleradora ACE, inovação de verdade se mostra no Excel. “Ser inovador não é comprar uma startup ou ir conhecer o Vale do Silício”, diz ele – justamente em meio a um ambiente colorido, descolado e cheio de post-its. “Inovação não é a percepção de alguém, é quantos negócios você criou, quanta receita gerou. Se você não consegue comprovar o impacto do seu trabalho no excel, não está fazendo um bom trabalho na área de inovação”.

A Ace trabalha em duas frentes. A primeira, como aceleradora, ajudando empreendedores a fazerem seus negócios crescerem. Depois, atua ajudando grandes empresas que querem se aproximar das startups – e tentando impedir que a grande corporação não engula e sufoque a startup no processo. Desde 2012, quando foi fundada, 130 startups já passaram pela Ace. O trabalho rendeu prêmios de melhor aceleradora no Brasil e na América Latina. Em entrevista à Época NEGÓCIOS, Pedro faz um balanço sobre o ano de 2017 e conta quais são suas expectativas para 2018.

Como foi o ano de 2017 para o empreendedorismo brasileiro?
Foi muito positivo. A crise impactou muito pouco, e muitas vezes até ajudou as startups. Quando as empresas precisam apertar o cinto, tendem a procurar opções e alternativas, e as startups acabam crescendo. A gente teve um crescimento muito grande de algumas startups, as startups se consolidando, recebendo investimentos grandes, já tendo bastante gente na sua equipe. E vimos muita gente vindo de setores tradicionais, como de bancos, indo trabalhar em startups. Inclusive sendo bem remunerados e recebendo uma participação na empresa – algo que a gente não via antes com frequência. Acho que houve uma profissionalização no mercado como um todo, maior qualidade de empreendedores, investidores e de aceleradoras.

Recomendado para você

  • Bordados indiano, mexi… Comece gratis já!

    CLIQUE AQUI

  • Páscoa colorida em fel… Comece gratis já!

    CLIQUE AQUI

  • Colares de Cordas com Nós Comece gratis já!

    CLIQUE AQUI

  • Brigadeiro: receitas g… Comece gratis já!

    CLIQUE AQUI

E quais são suas expectativas para 2018?
Acho que vai ser ainda melhor. Os juros estão caindo, e por isso acho que vai vir muito dinheiro que antes estava em renda fixa. Agora, as empresas começam a usar esse dinheiro para investir em startups, em criptomoedas ou para pensar em coisas diferentes. Acho que teremos ICOs (oferta inicial de moeda digital), uma coisa que ainda não temos bons exemplos aqui no Brasil. Acredito que veremos surgir alguns unicórnios e eu acho que, no geral, vamos ver o nível das nossas startups crescer ainda mais. A competição global estimula isso. Mesmo se as startups brasileiras não vão para fora do país, os caras vem operar aqui. Quando um Uber vem operar aqui, uma 99 tem que subir o nível e se tornar uma startup de nível global.

Qual foi a importância da venda da 99 para a Didi por mais de US$ 1 bilhão, nosso primeiro unicórnio?
Isso nos coloca no mapa global do empreendedorismo. Essa foi a única aquisição desse porte da Didi Chuxing. Comprova uma tese de que no Brasil a gente faz startups boas que têm atratividade, apelo e que conseguem crescer. E isso estimula outros empreendedores, mostra que é um negócio sério, não é brincadeira de moleque. E é legal ter como exemplo o Paulo Veras, que é um cara mais velho, o que é mais o perfil do Vale do Silício, onde não são só jovens recém-formados que fazem startups.

O que a Ace busca ao avaliar uma startup?
A gente tem alguns verticais e modelos de negócios de que gostamos. Os verticais são saúde, fintech – e suas derivações, como insuretech [seguros] – e agritech. São as três que estamos enfatizando esse ano. Também nos atrai alguns modelos de negócios, como o B2B e o de assinatura. A gente sabe como ajudar esses negócios muito bem, a gente tem muito método para ajudá-los a crescer. Mas de maneira geral, a gente quer um time muito bom. Que seja completo, que tenha conhecimento do mercado, do produto e do cliente, que tenha uma atitude empreendedora, que pense grande. Esse é o maior desafio. Eu diria que conta 80% da avaliação.

E os outros 20%?
O resto é o tamanho da oportunidade. Qual é o tamanho desse mercado? É um mercado onde eu vou conseguir ter uma empresa bilionária? Se o mercado tiver uma restrição de tamanho, não tem o que eu possa fazer. A gente tenta combinar, tamanho da oportunidade com um time muito bom.

Vocês têm unidades de coworking em São Paulo, em Goiânia, no Rio de Janeiro e em Curitiba. Qual é a importância desse espaço de trabalho para vocês?
A gente acha que é bom que as empresas convivam umas com as outras. A maioria das empresas vêm trabalhar nos coworkings, mas tem algumas que já tem 15, 20 funcionários, já têm seu escritório, e aí a gente monta algo que faça sentido. Muitos, mesmo com escritório, preferem vir para cá alguns dias da semana. O espaço é grande, é importante para o desenvolvimento do negócio. Sempre estão acontecendo coisas, tem investidores passando e potenciais clientes.

Vocês têm o programa Ace Start e o Ace Growth. Quais são as maiores dificuldades de cada uma delas?
No Ace Start, as empresas não têm uma clareza sobre o problema real que o produto delas resolve. Por que o seu produto existe? E para quem? O que a gente tenta fazer é melhorar o entendimento do problema que seu produto resolve e quem é o seu cliente. São empresas que entram com um faturamento de mais ou menos R$ 25 mil por mês. E aí existe muita mudança de modelo de negócio (se eu fosse arriscar, falaria que 80% delas mudam). E quando ela muda, a gente vê que ela realmente começa a crescer.

E no Growth?
São empresas com faturamento que vão de R$ 35 mil a R$ 40 mil por mês. O que eu quero trabalhar nesse programa é: o que fazer para a empresa crescer? Isso perpassa trabalhar produto, mas também passa por canais. A gente ajuda as startups, de forma disciplinada, a testar os canais e descobrir quais o fazem crescer. Tem muito mentor de marketing, de vendas, de conversão. A gente tenta encontrar o melhor modelo comercial, de retenção. E, às vezes, o cara está preocupado com vendas, mas o problema é o produto. Então, a gente vai focar mais no produto.

As startups são o melhor caminho para buscar inovação no Brasil?
Eu acho que são um dos caminhos. Mas se a gente pegar quantidade de dinheiro, de pessoas e o potencial impacto, eu acho que as grandes empresas também devem ser uma fonte de inovação. É uma das nossas teses: as empresas não exploram seus intra-empreendedores. Eles estão lá, você não precisa contratar um cara de fora. Eles estão na contabilidade, na área jurídica, no marketing… só que eles estão apagados. A gente acha que uma das medidas de inovação é ter uma boa parte da sua receita vindo de negócios que você criou no curto prazo. As empresas têm que se perguntar o quanto da receita de hoje vêm de produtos ou serviços criados nos últimos três anos? Se a resposta é muito pouco, ela precisa se tornar uma organização mais inovadora. É preciso criar um ambiente e proteger esse empreendedor que está dentro da empresa, de forma que uma canetada de um diretor não mate uma ideia que poderia ser maravilhosa, mas que hoje o faturamento que traria seria irrelevante. O empreendedor dentro de uma grande empresa deveria ser tão importante quanto o empreendedor dentro de uma startup. A gente acha que o empreendedor é o motor básico da inovação.

FONTE: ÉPOCA NEGÓCIOS