Por que indústria planeja 6G para 2030 se não tem 5G em todo o Brasil?

A implantação do 5G puro no Brasil ficará completa em 2029 pelo cronograma da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações). A expectativa até lá, contudo, é que uma tecnologia de internet ainda mais rápida também vire realidade: o 6G.

O plano é torná-la viável comercialmente em 2030, iniciando a promessa de futuro digno de ficção científica: com direito a hologramas, metaversos mais imersivos e cirurgias remotas com ainda mais segurança do que o 5G promete.

O futuro é promissor e incerto, já que alguns desafios marcam território: será necessário desenvolver e implantar antenas de transmissão compatíveis e eficientes, além de fazer as etapas dentro de regras de sustentabilidade, explicam especialistas ouvidos por Tilt.

É cedo para pensar no 6G?

Não, para pesquisadores e indústria. Eles se debruçam sobre o tema desde 2020. É natural que as discussões sobre uma tecnologia nova ganhem foco mesmo que a geração anterior ainda não tenha sido difundida.

“É de praxe entre a comunidade mundial se reunir ante órgãos de padronização e pensar o que será da próxima geração [de rede]. É o que está ocorrendo com o 6G”, explica o engenheiro Paulo Sérgio Rufino Henrique, pesquisador brasileiro na Universidade de Aarhus, Dinamarca.

Para ele, a sexta geração do padrão de conexões de internet deve acelerar a quarta revolução industrial e colocar a humanidade no centro desse futuro.

Enquanto isso, para o consumidor final, nada deve mudar a curto prazo em relação ao 6G.

6G em 2030

Como é uma ideia de tecnologia nova, ainda não há nada de concreto por trás do 6G.

O que se sabe até o momento é nos próximos anos o papel do setor será definir as regras para a futura rede, como limite de velocidade, faixas de frequência e o quão mais rápida ela será que o 5G — que é 20 vezes mais rápido que o 4G.

Porém, isso, segundo os especialistas, só poderá ser determinado depois do fim das discussões sobre a visão geral do 6G. Ou seja, responder: “o que deve mudar no mundo a partir desse padrão”.

E quem deve bater o martelo nisso? Depende:

  • A UIT (União Internacional de Telecomunicações), liderada pela ONU (Organização das Nações Unidas), quer definir a visão do 6G até 2025;
  • O 3GPP (Projeto de Parceria de 3ª Geração, em tradução livre), um consórcio internacional de empresas do setor de telecomunicações, deve definir as métricas para seu funcionamento até 2027.

Até lá, sugestões de empresas, grupos de estudo e acadêmicos serão bem-vindas para as duas instituições.

“Se você começa a desenvolver diversas tecnologias candidatas ao padrão, e uma delas for escolhida, você já tem o conhecimento no país para desenvolver aquela tecnologia”, diz José Marcos Câmara Brito, secretário-geral do projeto 6G Brasil, parceria público-privada criada com objetivo de definir os passos para o novo padrão de conectividade funcionar no país.

“Nosso objetivo é tentar influenciar o padrão mundial de tal maneira que nossas necessidades sejam contempladas”, acrescenta Brito. O projeto tem como membro o Inatel (Instituto Nacional de Telecomunicações), de Minas Gerais.

A Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) está encarregada do Grupo de Trabalho 5D (WP 5D) — responsável pelos aspectos gerais dos sistemas de comunicações móveis internacionais.

O grupo faz parte da Comissão de Estudos 5 (SG 5), da União Internacional de Telecomunicações (UIT-R), que determinará as mudanças no 6G para redes de internet fixas, móveis, por rádio e satélite. Em nota, a agência informou a Tilt que está participando das revisões do documento preliminar de visão do 6G elaborado pelo setor.

Se tudo ocorrer como o previsto:

  • as primeiras antenas devem ficar prontas até 2028.
  • o 6G comercial começará a chegar em 2030 no mundo, se o plano da União Internacional de Telecomunicações sair do papel.

O que esperar do 6G?

No campo das possibilidades, especialistas do setor enxerguem as tendências:

Internet ainda mais rápida: 1 Tbp/s

Acredita-se que o 6G conseguirá suportar velocidades de até 1 Tbp/s — um terabit por segundo, equivalente a mil gigabits.

“No 5G, o pico de transmissão é um giga. Ou seja, o 6G vai começar de um 1 Gb e ir até 1 Tb: um para aplicativos menores e outro para aplicações industrializadas mais específicas”, afirma Rufino.

Isso significa que, na menor velocidade possível, o 6G permitiria, por exemplo, baixar um filme de 15 GB, em qualidade Blu-Ray, em aproximadamente dois minutos. A conexão ultrarrápida pode viabilizar tecnologias que exijam muito da internet, como transportes autônomos e cirurgias à distância.

Rede mais estável

Para contornar riscos de interferências de sinal e internet instável, algumas pesquisas estudam como a possibilidade de criar superfícies “refletoras” de sinal de rede, que ajudariam a transmitir o sinal do 6G adiante em caso de intermitência.

Paralelamente, aparelhos compatíveis com a futura rede deverão utilizar inteligência artificial para administrar essa troca automaticamente de “conversa” com o ponto de internet que estiver disponível e mais estável.

Segundo a Anatel, seu grupo de estudo discute a possibilidade de não só aplicar antenas e superfícies refletoras de sinal, como também “redes não terrestres” como usar satélites e estações rádio-base em alta altitude.

Internet do pensamento

A Ericsson, por exemplo, está desenvolvendo ferramentas que viabilizariam o que eles chamam de “internet do pensamento”, que dispensaria interfaces físicas para mexer em computadores, celulares ou dispositivos de casa conectada.

“Em uma nova rede com esse potencial, você vai ser capaz de controlar objetos à distância com o pensamento humano”, diz Edvaldo Santos, o vice-presidente diretor de pesquisa, desenvolvimento e inovação da empresa. O profissional trabalha há anos na Ericsson desenvolvendo aplicações para o 5G no mundo.

O engenheiro também estima que isso levará a uma mudança radical na forma como nos conectamos, proporcionando, por exemplo, uma “telepresença” — tecnologias que permitam se sentir transportado para outro lugar, em ambientes virtuais com cheiros, tatos e gostos.

Tecnologias sustentáveis

O desenvolvimento do 6G pode acabar influenciado pelos ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) da ONU para 2030 — entre eles erradicação da pobreza e criação de tecnologias sustentáveis.

“Essa mudança de paradigma é para um processo de evolução da população humana, que está envelhecendo. Precisamos prover uma tecnologia que possa nos atender, sem esquecer da inovação”, diz Rufino.

“Tecnologia, economia e social são um tripé. Para trabalhar, precisam ficar juntos”, acrescenta Lourival Moreira, engenheiro eletricista e ex-diretor do CEFET/RJ (Centro Federal de Educação Tecnológica). “O social não é só uma questão de dignidade. É questão de sobrevivência do sistema.”

E as mudanças que o 5G promete?

Parte dessas promessas soa familiar com as revoluções destacadas pelo 5G. E não é à toa, de acordo com Christian Rothemberg, pesquisador do Smartness (Centro de Pesquisa Smart Networks and Services for 2030), da Unicamp.

“É possível que a evolução [de uma para outra], em muitos dos aspectos, seja para o que estava previsto para o 5G”, diz.

Outros pesquisadores defendem que é cedo para pôr um teto restrito do potencial do 5G: “ainda estamos praticamente nas primeiras versões. A gente só vai saber ver categoricamente o que foi prometido e o que realmente ficará em crédito para o 6G em 2025”, afirma Pereira.

Para Edvaldo Santos, o problema é outro: nem sempre as indústrias acompanham o que a evolução tecnológica oferece: “[Esse hype] pode cair no colo do 5G, não porque ele é o catalisador, mas porque os outros componentes do ecossistema não investiram na velocidade que o 5G consegue proporcionar.”

A implantação do 5G no Brasil deve seguir o cronograma:

  • Cidades com mais de 500 mil habitantes: até julho de 2025
  • Cidades com mais de 200 mil habitantes: até julho de 2026
  • Cidades com mais de 100 mil habitantes: até julho de 2027
  • Cidades com mais de 30 mil habitantes: até julho de 2029

6G pode demorar para chegar aqui?

Para Rothemberg, o risco de demora é real: “são modelos de negócio que têm que justificar os investimentos, e tem que ter alguma contrapartida para as operadoras.” O Brasil é um país grande em território, então existe um custo elevado de implantação.

Brito, por sua vez, acredita que a participação atual do Brasil na criação do padrão fará as coisas acontecerem bem mais rápido do que foi anteriormente:

“No 5G a gente já conseguiu dar um passo nessa direção quando o governo fez um leilão-não arrecadatório, em que uma parte significativa do recurso abordado pelas operadoras [o 5G gerou no total R$ 46,7 bilhões] vai para aumentar a cobertura ao invés de ir para os cofres. Isso torna economicamente viável ter 5G numa cidade de 2 mil habitantes”, conclui.

FONTE:

https://www.uol.com.br/tilt/noticias/redacao/2023/03/07/o-que-e-6g-quando-chega-qual-velocidade-nova-rede-no-brasil-melhor-que-5g.htm