O modelo de vendas on-line muda a cara das lojas

Lojas com vitrines digitais, óculos de realidade virtual e a possibilidade de comprar sem contato humano mudam o comércio – até no Brasil.

NÃO É REAL
Vendedor expõe geladeira em tela touchscreen. Uma prateleira virtual tem produtos e permite ver como eles ficam em casa (Foto: Edilson Dantas/Agência O Globo)

Não há vitrine. O interessado escolhe os produtos por meio de uma tela, que permite ver milhares de opções. Com óculos de realidade virtual, é possível enxergar como o item vai combinar com o restante da decoração da casa. O processo de escolha é acompanhado por câmeras capazes de captar as expressões faciais dos visitantes e, por meio de softwares de inteligência artificial, avaliar o grau de receptividade do cliente e sua satisfação com o desempenho do vendedor – agora chamado de consultor. Não há caixas, muito menos filas para pagamento. Os consultores carregam dispositivos móveis, parecidos com smartphones, onde registram a compra e o pagamento, além de também fazerem a entrega da mercadoria. Aquela história de escolher, pegar e pagar – comprar, enfim – não é mais a mesma.

Num shopping de São Paulo, a rede varejista Ponto Frio inaugurou em janeiro a primeira unidade desse modelo, tido como a loja do futuro, uma união entre e-commerce e ponto de venda tradicional. Montada em um espaço de 137 metros quadrados, é quatro vezes menor que suas lojas tradicionais, pois não é preciso espaço para abrigar um mostruário onde realmente estão geladeiras, fogões e outros itens – tudo ali é visto por uma espécie de vitrine digital de 2 metros de altura, na qual o comprador tem noção do produto em tamanho real, pode acessar informações técnicas e comprar com um toque na tela. “Nesse formato de loja, a experiência de compra passa a ser mais prazerosa e interativa”, disse Ana Paula Tozzi, presidente da AGR Consultores, especializada em varejo. “Esse consumidor encontra tudo o que encontraria na compra on-line, tem a interação da loja física e é colocado em contato com inovações tecnológicas.” Na loja do Ponto Frio há cerca de 10 mil produtos nas vitrines virtuais. O Ponto Frio pretende abrir neste ano 80 pontos de venda nesse formato que une o virtual ao comércio presencial.

Lojas assim são uma etapa das mudanças da relação entre o varejo e o consumidor, uma tentativa das empresas de atender aos gostos de quem compra por computador, celular, tablet e até presencialmente. A marca Mai&Mai, que comercializa roupas, propõe uma fórmula sem lojas e na qual o comprador não tem contato humano. O cliente preenche no site um questionário com informações sobre seu tamanho e tipo físico, preferências de cor, estilo e peças que mais usa. Dois dias depois, recebe um malote de roupas e, numa data combinada, uma sacola com as roupas não escolhidas é retirada por um emissário. “Para mim sempre deu muito certo. As peças que chegam têm a minha cara. Só não funciona se você está com pressa porque entre preencher o questionário e chegar o malote são alguns dias de espera”, afirmou a administradora de empresas Laura Silveira, de 35 anos.

Fundadora da Mai&Mai, Luciana Aidar foi funcionária da Daslu, icônica loja de luxo paulistana. Essa espécie de delivery de roupas é uma adaptação tecnológica do que a extinta Daslu fazia com algumas clientes, na base do conhecimento que suas vendedoras tinham dos gostos delas. “Foi tudo muito intuitivo. A ideia de colocar o formulário on-line surgiu do meu sócio, Luciano Balbim, que havia uns anos antes criado a Zipnet, portanto tinha uma experiência no mundo digital”, diz Luciana. Ela afirma que, graças ao questionário, o índice de acerto no tipo de roupa enviada aos clientes é próximo de 100%. Segundo Luciana, o faturamento da empresa cresce na casa de dois dígitos por ano.

A Amazon abriu uma loja física, na qual o cliente é identificado na entrada e suas compras são debitadas automaticamente

Em outro modelo de venda de roupas e acessórios, a Amaro define-se como uma “companhia de tecnologia”. Começou como loja virtual e depois passou à realidade. Mesmo assim, os pontos físicos são o que seus donos chamam de “guide shops”, nos quais o cliente pode experimentar as roupas e efetivar a compra nos computadores dos balcões ou no celular. Mas não leva: a peça é entregue em duas horas se o endereço for paulistano, ou no máximo em 48 horas, no caso das regiões Norte e Nordeste. Criada pelo suíço radicado no Brasil Dominique Oliver, dos 300 funcionários da Amaro, 35 são analistas de dados que cruzam informações para chegar às mais diversas conclusões: desde qual cor é a preferida da consumidora carioca até onde está um núcleo de consumo bom para abertura de um novo ponto de venda.

Parece anacronismo que o comércio on-line busque se instalar no mundo real, mas até a gigante Amazon faz esse caminho em busca do consumidor. No mês passado, a companhia abriu sua primeira loja física nos Estados Unidos, a Amazon Go, na qual uma tecnologia batizada de “Just walk out” (“Apenas saia”, em tradução literal) faz com que usuários cadastrados no aplicativo sejam identificados por um código individual quando entram na loja. Sempre que retiram produtos da prateleira e não recolocam, o aplicativo os inclui num carrinho de compras virtual e cobra na saída. Não há vendedores. É como comprar pelo site, mas sem precisar dar um clique.

FONTE: ÉPOCA