O 5G bate à porta

Tecnologia amplia uso de dados para melhorar a vida do cidadão

Por Martha Funke

A chegada do 5G rompe a barreira da conectividade e amplia possibilidades para as cidades inteligentes com velocidade de transmissão, capacidade de conectar até 1 milhão de dispositivos por km2, dedicação de pedaços da rede para serviços específicos e capacidade de programar tudo isso para atender demandas do poder público, do setor privado e, claro, dos cidadãos.

“O 5G abre a porta para as demais tecnologias”, resume Luciano Saboia, da IDC. Plataformas e aplicativos em nuvem, internet das coisas, análise para transformar dados em inteligência para a comunidade e inteligência artificial são algumas delas e vão além da digitalização usada até agora, mais voltada a atendimento do que à eficiência dos serviços para o cidadão – entre eles, segurança pública, mobilidade, saúde, educação e iniciativas departamentais, a exemplo de iluminação pública ou saneamento. “A conectividade permite aplicações mais sofisticadas”, acrescenta Renato Paquini, da Frost & Sullivan.

Dados da Juniper Research indicam gastos globais de US$ 70 bilhões com infraestrutura de cidades inteligentes em 2026, ante US$ 35 bilhões em 2021. No Brasil, chegarão perto de US$ 2,6 bilhões, quase metade do total da América Latina e boa parte voltada a redes inteligentes de iluminação (smart grids). Em 2022, as operadoras de telecomunicações devem aportar R$ 30 bilhões no país para colocar 5G nas capitais estaduais até julho e expandir o 4G, segundo estimativas da Conexis. Doze delas já estão com infraestrutura e legislação prontas para o 5G, informou o Ministério das Comunicações.

A IDC projeta a magnitude de problemas urbanos a serem mitigados com tecnologia. Até 2030 serão mais de 700 cidades com população acima de um milhão de habitantes no mundo e desastres como os relacionados ao clima vão consumir mais de US$ 415 bilhões ao ano. Os exemplos ainda mostram que as soluções são mais pontuais que integradas, sejam equipamentos para carregamento e estacionamento de veículos elétricos em Daegu (Coreia do Sul), plano inclusivo para educação a distância em Eugene (Oregon, EUA) e câmeras em uniformes da Polícia Militar em São Paulo (SP). A expectativa da IDC é que, em 2024, um quinto de todos os dados administrativos das cidades estejam conectados e empregados entre diferentes departamentos para melhoria dos programas de governos.

Por outro lado, com apoio do 5G, proliferação de sensores e digitalização de infraestrutura crítica, 40% das cidades podem ser vítimas de ciberataques bem sucedidos até 2025. Integração massiva em nuvem com apoio do 5G fez de Xangai, na China, a número 1 no ranking mundial de cidades inteligentes da Juniper, que prioriza a tecnologia. “O 5G muda o jogo para as cidades”, diz o relatório de fevereiro. A cidade criou uma plataforma com mais de 1,1 mil serviços para o cidadão – de registros de nascimento a educação, transporte e saúde. Em segundo lugar ficou a sul-coreana Seul, líder mundial em performance 5G, segundo levantamento da Ookla.

Já a lista Smart Cities da suíça IMD é liderada por Cingapura (Malásia). Apesar do 29º posto em 5G, ganha pontos por jardins e plantas de energia solar suspensos e baixos índices de criminalidade, pobreza e tráfego. Zurique (Suíça) conquistou o segundo lugar por segurança e combinação de vida urbana criativa e natureza, e Oslo (Noruega), o terceiro, com iniciativas como ônibus e táxis livres de emissões de carbono, construções verdes e dados em ambiente aberto. São Paulo, líder no índice brasileiro da Urban Smart Cities, e Rio de Janeiro (RJ) ocupam os dois últimos lugares entre 118 cidades do índice IMD. Em 2019 chegaram a ficar, respectivamente, em 90º e 96º lugares.

A questão é que mesmo com avanços, a falta de integração faz a inteligência passar despercebida. Bicicletas compartilhadas, uso do Google para localizar lojas abertas e serviços de delivery tornam a cidade mais inteligente, mesmo sem ente centralizador. “O uso do 5G como plataforma pode trazer mais sinergia”, diz Rodrigo Dienstmann, presidente da Ericsson para o Cone Sul da América Latina. Ele destaca oportunidades em 5G para transporte coletivo e segurança pública, com apoio de drones no futuro. A Ericsson fez parceria com Tim, Qualcomm e Enel para teste de 5G em rede de distribuição de energia no projeto Urban Futurability, na região da Vila Olímpia, na capital paulista.

Com Claro e Embratel, somou-se à USP e ao Parque Tecnológico de São José dos Campos (SP), e com a Vivo, à FEI, em busca de soluções em setores como cidades. O diretor de internet das coisas (IoT) da Claro, Eduardo Polidoro, lembra que áreas como saneamento são bem atendidas por tecnologias como 4G, enquanto a alta capacidade móvel do 5G beneficia segmentos como mobilidade e segurança. Parcerias e ecossistemas são essenciais para a cidade inteligente. “O 5G é facilitador, sozinho não muda nada”, diz Leonardo Capdeville, CTO da Tim. A operadora fechou acordo com a Huawei para cobrir 100% de Curitiba (PR) com 5G e criar casos com gestão urbana dinâmica, como os “corredores verdes” para situações de emergência. Os primeiros exemplos devem envolver câmeras móveis, acredita.

A Huawei traz a experiência de 5G em lugares como Shenzen, na China. Isso vai de semaforização inteligente e reconhecimento de imagens (facial ou veicular, por exemplo) até lousa inteligente e realidade virtual ou aumentada para educação. Shenzen criou um centro de comando e controle com dados desde poluição até indicadores econômicos, detalha o diretor de relações governamentais da Huawei, Atilio Rulli. A Vivo manteve projeto em Águas de São Pedro (SP), com iniciativas de iluminação, estacionamento e monitoramento e hoje migra soluções como gestão de equipes remotas e frotas para 5G.

Mas para Diego Aguiar, diretor da Telefónica Tech, a cidade inteligente de fato é gerenciada de forma integrada em tempo real. É aí que o 5G faz a diferença. Além disso, a inovação poderá vir de onde nem se espera. Da mesma forma como o Uber nasceu do 4G, o 5G trará novos atores, avalia.

FONTE: https://valor.globo.com/publicacoes/suplementos/noticia/2022/03/30/o-5g-bate-a-porta.ghtml