Neurônios ciborgues prometem revolucionar medicina bioeletrônica

O dourado ilustra a deposição dos polímeros biocompatíveis em dois neurônios específicos, sem mexer com as células vizinhas. As partículas em azul representam os monômeros que permitem a formação dos polímeros nas células alvo.

Conexão humano-eletrônica

Os ciborguessuper-humanos e “humanos melhorados” podem estar mais próximos da realidade do que se pensava.

Pesquisadores conseguiram alterar as propriedades elétricas de tipos específicos de células nervosas em animais vivos, modificando-as geneticamente para que elas produzam polímeros condutores ou isolantes em suas superfícies.

Em outras palavras, o próprio neurônio desenvolve uma capa eletricamente condutora ou isolante ao seu redor, permitindo controlar eletricamente essas células, de forma similar ao que a optogenética faz usando a luz, só que de forma mais simples e atingindo um número potencialmente ilimitado de células.

Esta é uma prova de conceito que pode viabilizar desde novos tratamentos para condições como Parkinson, Alzheimer e epilepsia, até melhores maneiras de conectar membros protéticos aos nervos, disse a professora Zhenan Bao, da Universidade de Stanford: “Definitivamente, essas são [algumas das] possibilidades.”

Engenharia bioeletrônica: Neurônios desenvolvem revestimentos isolantes ou condutores

Testes dos neurônios bioeletrônicos em conexão com circuitos elétricos.
[Imagem: Jia Liu et al. – 10.1126/science.aay4866]

Montagem química dirigida geneticamente

Para dar esse passo enorme no campo da “medicina bioeletrônica“, Jia Liu e seus colegas criaram uma técnica que batizaram de “montagem química dirigida geneticamente”.

As células são modificadas geneticamente para produzir uma enzima em sua superfície. A enzima utilizada, chamada APEX2, junta moléculas simples, chamadas monômeros, para formar uma cadeia, ou polímero. A técnica foi usada para construir estruturas artificiais em células cerebrais de mamíferos e em neurônios no verme C. elegans.

A seguir, os vermes e outros tecidos experimentais foram imersos em uma solução com dois ingredientes ativos – uma dose extremamente baixa e não letal de peróxido de hidrogênio e bilhões de moléculas da matéria-prima que se deseja que as células usem em seus projetos de construção.

O resultado é um polímero com uma estrutura em malha recobrindo toda a célula. Dependendo do monômero usado, o revestimento pode ser isolante ou condutor elétrico, ambos biocompatíveis.

No caso do revestimento condutor, o neurônio pode receber ou transmitir sinais elétricos comuns, e não apenas os sinais bioelétricos (íons) que eles usam normalmente para se comunicar. No caso do revestimento isolante, ele pode funcionar como uma mielina artificial – a mielina é o revestimento natural das células nervosas, que pode ser perdida em alguns tipos de doenças.

Dependendo de qual polímero se forma, os neurônios passam a disparar mais rápido ou mais devagar. Nos vermes C. elegans, por exemplo, isso altera seus movimentos, com os animais tornando-se menos propensos a andar para a frente ou mais propensos a fazer curvas fechadas.

Além de experimentos com células e fatias do cérebro de camundongos em placas de Petri, a equipe injetou a solução de peróxido de hidrogênio e monômeros no cérebro de camundongos vivos para verificar que se esses elementos juntos não eram tóxicos.

Engenharia bioeletrônica: Neurônios desenvolvem revestimentos isolantes ou condutores

Os testes com os vermes deram resultados bizarros.
[Imagem: Jia Liu et al. – 10.1126/science.aay4866]

Medicina bioeletrônica

É ainda apenas uma prova de conceito, e a equipe ainda não tentou conectar nenhum circuito eletrônico às células modificadas.

Mas eles acreditam que, no futuro, a técnica poderá ser usada para estudar como a esclerose múltipla, causada pelo desgaste do isolamento de mielina ao redor dos nervos, pode responder se células doentes puderem ser induzidas a formar polímeros isolantes como substitutos.

Também poderá ser possível estudar se a formação de polímeros condutores sobre neurônios defeituosos no autismo ou na epilepsia pode modificar essas condições.

Os implantes neurais atuais, usados em experimentos desse tipo, geralmente consistem em eletrodos metálicos inseridos no cérebro. Uma das desvantagens é que não há como controlar a atividade de tipos específicos de neurônios, nem de um pequeno número deles e menos ainda de células individuais.

FONTE: INOVAÇÃO TECNOLOGICA