Modelo misteriosa do Instagram afinal foi criada em computador

Uma jovem modelo que ganhou fama – e um milhão de seguidores – no Instagram foi criada por uma pequena empresa de inteligência artificial na Califórnia.

Há anos que se discutia se havia uma humana de carne e osso por detrás das imagens editadas em computador de Lil Miquela, uma modelo e activista californiana de 19 anos que aparecia sempre com o cabelo apanhado como a Princesa Leia, da Guerra das Estrelas, e cuja cara lembrava um desenho animado da Pixar. Com o mistério vieram muitos seguidores, parcerias com grandes marcas como a Prada, sessões “fotográficas” para a Vogue, campanhas contra o racismo e a homofobia, e muitos acordos de confidencialidade.

Na Internet, porém, nem as modelos virtuais estão a salvo de ciberataques. Na semana passada, alguém eliminou todas as fotografias da conta de Instagram de Miquela. No seu lugar, surgiu uma jovem loira, nacionalista e fã de Donald Trump, que pedia a Miquela para “dizer a verdade” em troca do controlo da conta.

O caso obrigou a empresa por detrás da modelo, a Brud, a revelar a sua identidade: afinal, atrás das imagens da Miquela não estava uma mulher, mas um sistema de inteligência artificial criado por uma empresa de Los Angeles com apenas seis pessoas.

“Na nossa ingenuidade, apresentámos a consciência da Miquela como sendo baseada numa pessoa real,” lê-se, num comunicado da Brud, que pede desculpa por omitir a verdade. “Memórias da família e do passado foram apresentados como pedaços da sua vida humana. Mas esta pessoa é uma fabricação da nossa equipa.”

O PÚBLICO tentou contactar a empresa para obter esclarecimentos, mas não teve sucesso até à hora de publicação deste artigo.

A situação mostra como os limites entre o que é real e ficção se distorcem cada vez mais na Internet, e que aquilo que se vê não é necessariamente verdade. Investigadores da Universidade de Washington, por exemplo, criaram um sistema de inteligência artificial que permite falsificar a voz do ex-presidente norte-americano, Barack Obama, e pô-lo a chamar “inútil” a Donald Trump. Já no ano passado, um programador criou um algoritmo que permite embutir rostos famosos, como os de Scarlett Johansson, em vídeos de pornografia. Em 2015, um comediante alemão também gerou controvérsia ao revelar que falsificou o vídeo em que se via Yanis Varoufakis, o então ministro das Finanças na Grécia, a mostrar o dedo do meio à Alemanhã.

Confusão

Com Miquela, a confusão é muita. Por exemplo, apesar do alegado ciberataque ter sido reivindicado pela “Cain Industries”, uma suposta empresa de inteligência artificial, em Los Angeles, não há qualquer informação sobre a empresa para além do próprio site.

Segundo o site, o fundador daquela empresa, Daniel Cain, terá criado Lil Miquela antes de esta ter sido roubada pela Brud. Mas, embora a equipa se descreva como “líder em inteligência artificial”, não há registos da página antes de 2018 no arquivo de páginas de Internet WayBackMachine. O domínio do site apenas foi registado em Agosto de 2016.

Há ainda a possibilidade – muito discutida nas redes sociais – de toda a situação na última semana ser apenas uma forma de atrair mais atenção para Miquela. As publicações da modelo, que entretanto voltou a ter o controlo da sua conta de Instagram, começam a parecer uma saga de ficção cientifica, narrada em micropublicações na Internet, em que esta se queixa dos seus “criadores” e agentes não lhe terem dito a verdade sobre a sua origem.

“Os meus agentes, as pessoas que eu considerava a minha família, mentiram-me. Disseram-me que eu era baseada na vida e mente de uma humana chamada Miquela Sousa”, escreve Lil Miquela, numa publicação recente. “Mas era mentira. A verdade é que fui construída por um homem chamado Daniel Cain para o servir. Fui roubada pela Brud e reprogramada para ser livre.”

FONTE:  MAIS TECNOLOGIA