Juntando a fome com a energia

Plantação de brócolis na Coreia do Sul, cultivo de plantas nativas na caatinga nordestina, criação de ovelhas em torno de painéis solares nos EUA e Nova Zelândia. Os sistemas agrivoltaicos (agrivoltaic farming ou agrophotovoltaics) estão mirando na abundância da luz do sol para gerar energia limpa, água potável e alimentos em diferentes regiões do mundo, mudando, literalmente, a paisagem do agribusiness global.

O conceito de agrivoltaic farming — a simbiose entre painéis de captação de energia solar, agricultura e criação de animais — traz a promessa de atacar a insegurança alimentar global e, simultaneamente, utilizar a terra produtiva para gerar energia limpa para a região. Um modelo sustentável, portanto, para a agricultura.

Em alguns casos, como o Ecolume, no Brasil, a água captada pelas calhas das estruturas de painéis fotovoltaicos é usada para cultivo hidropônico. O sistema produziu até 70% mais vegetais e diminuiu a necessidade de água, dependendo da cultura e do ambiente.

A ideia do uso dual da terra produtiva para energia e agricultura foi lançada pelo físico alemão Adolf Goetzberger, em 1981. Goetzberger fundou a Fraunhofer ISE, de tecnologia fotovoltaica para todo tipo de estrutura, incluindo uso no topo da caçamba de caminhões elétricos.

A tecnologia só começou mesmo a ser testada e implementada no Século 21. Primeiro no Japão, em 2013, depois na Alemanha e França. No Japão, as estruturas de painéis solares têm altura para abrigar a plantação e permitir a circulação de pessoas e equipamentos.

Atualmente, há mais de 2 mil fazendas agrovoltaicas no Japão, com 120 tipos de culturas, de matcha, gengibre e cebolinhas, à criação de camarões e peixes. Gerando entre 500.000 e 600.000 megawatts-hora de energia por ano. O uso de painéis solares em 5% das terras (cerca de 200.000 hectares) poderia gerar 20% da eletricidade do país.

Nem toda plantação ou criação se beneficia da cultura agrovoltaica. Plantas com alta tolerância à sombra obviamente se dão muito bem, incluindo folhas verdes e tubérculos. Os tomates estão na lista dos grandes beneficiários e pimentas, como a chiltepin, ganharam aumento considerável na produção.

Um estudo nos EUA mostra que as ovelhas se dão muito bem na convivência com painéis solares, especialmente na hora de descansar e dormir à sombra. E são boas cortadoras de grama.

O sistema agrovoltaico para cultivo produtivo foi aplicado pela primeira vez no Brasil no projeto Ecolume, na região semiárida do Nordeste, sem agredir o bioma da Caatinga.

A Coreia do Sul quer gerar 10 gigawatts de capacidade agrivoltaica até 2030. O país testa o cultivo de brócolis sob painéis solares (gráfico), e descobriu que a sombra melhora a cor do vegetal sem prejudicar seu benefício para a saúde.

A Itália planeja investir 1,1 bilhão de euros (US$ 1,2 bilhão) em energia agrovoltaica para criar cerca de 2 gigawatts de capacidade. A África inaugurou o primeiro projeto no ano passado. E a China, maior produtora mundial de painéis solares, abriga um projeto de 20.000 hectares de terra no deserto de Ningxia.

A capacidade global instalada de geração de eletricidade via sistemas agrovoltaicos é estimada em 14 gigawatts (2022).

O mercado global de agrovoltaicos foi avaliado em US$ 3,17 bilhões em 2021 e deve chegar a US$ 8,9 bilhões até 2030, com uma taxa composta de crescimento anual (CAGR) de 12,15%, entre 2022 a 2030.

FONTE: https://theshift.info/