Implante impresso em 3D recupera lesões de ossos e cartilagens

A criação de próteses com o uso dessa tecnologia é uma realidade, e a expectativa é que os métodos sejam inseridos em diversas áreas médicas

O biocientista Sean Bittner, autor do estudo, exibe um protótipo da estrutura criada tridimensionalmente

As impressões 3D têm se tornado grandes aliadas da medicina. A criação de próteses com o uso dessa tecnologia é uma realidade (leia mais nessa página), e a expectativa é que os métodos sejam inseridos em diversas áreas médicas. Biocientistas da Universidade Rice e da Universidade de Maryland, nos Estados Unidos, testam a possibilidade da criação de tecidos artificiais impressos tridimensionalmente para ajudar na recuperação de ossos e cartilagens. Batizados de “andaimes de engenharia”, os experimentos replicam as características físicas dos tecidos cartilaginosos e ósseos para minimizar lesões esportivas nas articulações, como as de joelhos, tornozelos e cotovelos.
As lesões osteocondrais, desde pequenas rachaduras a cartilagens que se quebram, são dolorosas e, muitas vezes, interrompem carreiras de atletas, além de poderem causar artrite incapacitante. “Os atletas são afetados desproporcionalmente por esses tipos de ferimentos, mas eles podem atingir todo mundo. Acredito que a pesquisa será uma ferramenta poderosa para ajudar pessoas com lesões esportivas comuns”, diz Sean Bittner, aluno do terceiro ano de pós-graduação em bioengenharia da Universidade de Rice, pesquisador da Fundação Nacional de Ciência dos EUA e autor do estudo.
O experimento é um estudo de prova de conceito, que demonstra a capacidade de usar a impressão 3D para desenvolver estruturas artificiais que ajudem na cicatrização de ossos e cartilagens lesionados. O objetivo final é desenvolver uma técnica para imprimir substituições de tecidos de espessura total, capazes de curar as áreas danificadas, uma vez implantados.
“Hoje em dia, lesões desse tipo são tratadas com métodos que tentam estimular o corpo a formar uma cicatriz na área lesionada. Essa cicatriz será formada por fibrocartilagem, um tecido diferente da cartilagem em composição e resistência”, explica o ortopedista Bruno Ohashi, traumatologista esportivo pela Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia (Sbot). “Dependendo do método empregado, a fibrocartilagem terá composição próxima à da cartilagem normal, mas nunca igual. O maior desafio no trauma esportivo é a prevenção e o tratamento das lesões de cartilagem, porque elas não se regeneram. Com a pesquisa, essas lesões podem ser tratadas com substitutos de resistência semelhante”, acredita.

Modelo

Assim que o paciente é diagnosticado com uma lesão osteocondral, exames diagnósticos são feitos para obter um modelo específico da área lesionada. Esse molde é usado para imprimir em 3D um “andaime” que usa duas misturas: uma de polímero personalizado e outra, de cerâmica. Depois da impressão, os “andaimes” podem ser implantados cirurgicamente na região danificada. A segunda mistura, de cerâmica, tem poros embutidos para que as próprias células e os vasos sanguíneos do paciente consigam se infiltrar no implante, eventualmente permitindo que ele se torne parte natural do osso e da cartilagem. A chave do estudo é copiar o tecido que será transformado gradualmente de cartilagem, na superfície, para o osso, por dentro.
“A porosidade foi incluída para que a disposição dos vasos sanguíneos possam crescer a partir do osso nativo. Nós não temos que fabricá-los, nós mesmos”, afirma Bittner. A longo prazo, os pesquisadores poderão descobrir como imprimir um implante para lesões osteocondrais que se encaixe perfeitamente em cada paciente, permitindo que o implante poroso cresça e consiga se unir ao osso e à cartilagem.
“O que mais se pesquisa na área de lesões em atletas é um tratamento eficaz, que possa curar o atleta o mais rápido possível para ele retornar ao esporte. Essa pesquisa apresenta mais uma tentativa de tratar umas das piores lesões que podem ocorrer no atleta, as de cartilagem nas articulações”, diz José Humberto de Souza Borges, mestrando em medicina esportiva pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). “Os pesquisadores tentam reproduzir uma cartilagem artificial para substituir a cartilagem danificada porque, em uma lesão desse tipo, o organismo não consegue se regenerar, o que leva a dores constantes, limitações dos movimentos, perda de rendimento e, consequentemente, um longo período de afastamento de suas atividades, até mesmo ao abandono ao esporte.”
Para Bruno Rezende, especialista em cirurgia de quadril e joelho pelo Hospital Mount Sinai, filiado à Universidade de Toronto, no Canadá, os possíveis desdobramentos da pesquisa podem significar um grande avanço. “Hoje, não temos muitas alternativas para o tratamento dessas lesões, e parte das alternativas existentes inviabilizam o retorno ao esporte”, ressalta. Antonios Mikos, bioengenheiro e coautor do estudo, ressalta a importância do experimento: “O que fizemos é impactante e pode levar a novas soluções de medicina regenerativa”, garante.
FONTE: CORREIO BRAZILIENSE