‘Google do Agro’, unicórnio Indigo dá primeiros passos no Brasil

Empresa já oferece no País o tratamento biológico de sementes com micróbios, com ajuda de inteligência artificial

Tecnologia e agronegócio andam de mãos dadas há décadas no Brasil. Inteligência artificial (IA), big data, geolocalização e algoritmos tornaram-se tão comuns que é praticamente impossível falar em genética, análise de solo, defensivos ou fertilizantes sem usar essas ferramentas. Com dezenas de startups na área, o que não havia ainda no Brasil, era a presença de uma empresa que unisse diversas tecnologias de ponta, ao mesmo tempo. Não havia: a startup americana Indigo está desde o início do ano oferecendo seus serviços no Brasil.

 Nos Estados Unidos, Indigo consegue aumentar produção em até 10%

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Do desenvolvimento da lavoura, à plataformas de comercialização e contratos com blockchain e logística, ela é conhecida como o ‘Google do Agro’. Nem todos os produtos e serviços virão para o Brasil num primeiro momento, mas os tentáculos da empresa começam a se espalhar.

Fundada em 2014, ainda sob o nome de Symbiota, a Indigo é um dos primeiros unicórnios das agritechs (startups do agronegócio). Hoje, a startup está avaliada em US$ 3,5 bilhões. É uma das poucas empresas do setor que alcançaram a marca e permanecem independentes – a primeira companhia a alcançar tal status foi a Climate Corporation, comprada pela Monsanto em 2013 por US$ 1,1 bilhão.

Um dos primeiros serviços a ser oferecido no Brasil será o tratamento biológico de sementes com micróbios. É mais ou menos como se as sementes tomassem um banho de iogurte, personalizado por um robô que leu uma grande biblioteca de dados. Põe grande nisso. A plataforma de inteligência artificial lê informações sobre solo e clima de cada fazenda que requisita seus serviços e as une a um banco de dados de 70 mil cepas de micróbios, cujos DNAs foram sequenciados. Com as marcações genéticas, o algoritmo consegue indicar quais os melhores micro-organismos para aumentar a produtividade da soja, ou proteger milho contra doenças e clima.

Dois mundos. “A indústria de biotecnologia avança com ajuda de inovações como barateamento do sequenciamento de DNA, aprendizado de máquina e computação em nuvem”, diz David Perry, presidente executivo da Indigo. “Não estamos fazendo coisas que não foram feitas antes: nós só a aplicamos na agricultura.”

No mundo, a Indigo oferece tratamentos para soja, arroz, algodão, milho e trigo. Por enquanto, só a tecnologia voltada à soja está sendo oferecida no Brasil, por meio de sementeiros, profissionais que comercializam sementes para grandes produtores. Em vez de vender os serviços, o acordo é que a empresa ficará com metade da produção extra gerada por seu tratamento – uma sofisticação do barter, método no qual o agricultor paga fornecedores com parte de sua produção. Segundo a Indigo, a expectativa é que, no Brasil ela seja capaz de aumentar a eficiência das lavouras em 3%. Nos EUA, onde está há mais tempo e já domina os dados, esse índice pode chegar a 10%.

David Perry: 'Não estamos fazendo [na Indigo] coisas que não foram feitas antes: nós só a aplicamos na agricultura.'

David Perry: ‘Não estamos fazendo [na Indigo] coisas que não foram feitas antes: nós só a aplicamos na agricultura.’

Além de dispensar testes demorados, a solução por meio de inteligência artificial pode resultar no aumento da produtividade e na redução do uso de produtos químicos, como fertilizantes e pesticidas.

“No tratamento de sementes, o maior problema é selecionar os elementos mais eficazes”, diza José Otávio Menten, professor da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, da USP em Piracicaba. “A possibilidade de explorar rapidamente um grande número de dados aumenta as chances de êxito.”

Cada vez que vai se estabelecer em um país, a empresa busca estudar exemplos de micro-organismos da região. No Brasil, a Indigo fez parceria com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), enquanto fazendas como a Terra Santa cederam espaço para testes – ao todo, a companhia já tem mais de 200 acordos de colaboração para soja, arroz, milho e outros grãos.

A empresa fechou ainda parcerias com startups locais, como a Agrosmart, que trabalha com imagens de satélite e sensoriamento. A Indigo também chega ao País oferecendo sua tecnologia de blockchain para investidores fecharem contratos de barter – a tecnologia permite que os acordos sejam menos burocráticos e mais seguros.

Conectividade. O tratamento de sementes não é a única parte da Indigo a utilizar inteligência artificial. Nos EUA, a companhia tem uma plataforma de comércio, que conecta produtores e compradores de grãos. Permite que as negociações sejam feitas sem intermediários e também abre a possibilidade para que produtores ofereçam diferentes qualidades de grãos.

“O comprador pode começar a especificar o que deseja na plataforma, como grãos com nível específico de proteína. Assim, fazendeiros podem produzir a colheita com valor agregado e lucrar mais”,diz Perry.

Grãos especiais ou destinados para ração animal podem ser negociados a valores diferentes. É como um Tinder rural: o comprador “dá match” com o produto que melhor combina com suas necessidades.

Para entregar essa produção, a Indigo tem também uma plataforma de logística que usa algoritmos para conectar caminhoneiros com as rotas mais eficientes. A Indigo planeja trazer os serviços para o Brasil até 2020, mas diz que antes precisa construir uma base junto aos caminhoneiros.

Para fechar, a empresa também usa IA para analisar imagem de satélite – no fim de 2018, comprou a TellusLabs, uma startup do setor. A tecnologia será usada para gerar previsões sobre safras, uma arma na mão da empresa para convencer fazendeiros a adotar o tratamento de sementes ou atrair investidores.

“A Indigo traz uma mudança de paradigma para o agro, que passa a ter uma plataforma de serviços”, avalia Guilherme Raucci, professor do MBA de Agronegócios da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV-SP).

FONTE: LINK O ESTADÃO