A fuga das galinhas

A aprovação final do departamento de agricultura dos EUA (USDA) para a comercialização no varejo da carne de frango cultivada das norte-americanas Upside Foods e Good Meat (divisão da Eat Just) é um marco histórico, e abre um novo capítulo, mais sustentável, para o consumo de proteína animal no planeta. A galinha Ginger e o galo Rocky, da animação “A Fuga das Galinhas” devem estar celebrando a perspectiva de um futuro menos terrível para si.

Até agora, apenas Singapura, desde 2020, permitia a comercialização da carne cultivada de frango da Good Meat, a divisão de lab grown meat da Eat Just. A empresa produz alimentos plant-based, como a linha de ovos líquidos JUST Egg, que cresceu 85% nos últimos doze meses por conta da crise de abastecimento de ovos nos EUA e pela mudança de comportamento dos consumidores, que buscam alimentos mais sustentáveis.

Para o médico cardiologista Uma Valeti, CEO e fundador da Upside, a notícia coroa um esforço de oito anos desde a fundação da startup. “O fato de conseguirmos isso em apenas oito anos é um testemunho do tipo de progresso que pode ser atingido quando acreditamos que o status quo é uma escolha, e que tem hora que precisamos rejeitá-lo”. Valeti teve muita ajuda: desde 2015, a Upside levantou US$ 608 milhões em venture capital

A carne cultivada em bioreatores é, de fato, carne. Ela chega à mesa com o mesmo tipo de fibra e sabor da carne que vem dos animais, porque nasce a partir de células-tronco que se multiplicam dentro desses bioreatores mergulhadas em um caldo biológico (entenda mais aqui)

Aí reside uma questão crucial dessa indústria, que tem gerado cetiscismo de uma parte do mercado: a escalabilidade da produção depende do tamanho e quantidade dos bioreatores e o desafio é chegar a preços que sejam razoáveis para o consumo em larga escala.

Um dos mais céticos é o engenheiro químico David Humbird, que publicou um estudo extenso afirmando que a carne cultivada tem “desafios intratáveis” para se tornar realidade de mercado. “Nada disso faz sentido comercial até que todos estejam comendo”, disse ele em um evento recente (a conferência SynBioBeta). O estudo de Humbird foi contestado por especialistas do Good Food Institute (GFI), que publicaram um artigo rebatendo as análises em face das inovações tecnológicas recentes.

A Upside está melhor preparada para o desafio. Ela tem bioreatores capazes de produzir 22 mil quilos de carne por ano no momento, que podem ser expandidos para 1,8 milhão de quilos e está prometendo uma nova unidade com mais capacidade.

2023 é um ano-chave para essa indústria, porque vai enfrentar o veredito dos consumidores. Por hora, as duas empresas vão oferecer seus produtos em dois restaurantes: a chef Dominique Crenn (3 estrelas Michellin) vai cozinhar com a carne da Upside, enquanto a Good Meat será oferecida no restaurante do chef humanitário José Andrés.

Não é só carne de frango: um levantamento da Vegfaqs identificou 25 top startups cultivando carne vermelha, frango, peixe e frutos-do-mar, para humanos e para pets. E o Statista mapeia 156 empresas, apontando um grande crescimento do setor desde 2015.

FONTE: THESHIFT.COM