Enquanto os Estados Unidos dificulta os vistos para a indústria da tecnologia, o Canadá se abre aos negócios

 Nova York – Uma startup de inteligência artificial no distrito Flatiron estava tentando se expandir, contratando novos engenheiros que sabiam uma linguagem computacional específica.

Os contratados são de Marrocos, Bielorrússia, França, Geórgia e Canadá. Mas não estão trabalhando em Nova York – estão em Montreal, onde as políticas de imigração permitem obter permissões de trabalho em duas semanas, e a indústria de tecnologia canadense está cortejando agressivamente empresas estrangeiras.

“É cada vez menos atrativo ir para os Estados Unidos”, disse Tim Delisle, 26, fundador da Datalogue, startup que usa inteligência artificial para preparar e sintetizar dados para outras empresas. Ele acrescentou que os trabalhadores estrangeiros qualificados desejam a maior estabilidade que os imigrantes têm no Canadá em comparação com os Estados Unidos.

Embora tenha sido dada muita atenção às políticas do presidente Donald Trump para barrar a imigração ilegal, o governo também se movimentou para restringir a imigração legal, especialmente na indústria de tecnologia, que atrai muitos trabalhadores do exterior. Em abril, Trump apresentou uma ordem executiva, a Buy American and Hire American (compre de americanos e contrate americanos), que incluiu pedidos para revisão do programa de visto H-1B para beneficiar os trabalhadores dos Estados Unidos.

O programa atribui 85 mil vistos temporários anualmente a trabalhadores estrangeiros altamente qualificados para vagas consideradas “ocupações especializadas” através de uma loteria. Entre o pedido e as taxas legais, o processo de candidatura a um visto H-1B pode custar até US$ 6 mil a uma empresa, dizem os advogados, e pode durar meses; também é tão incerto quanto uma roleta, com centenas de milhares de candidatos.

Este mês, o Departamento de Segurança Interna publicou uma proposta para alterar as regras de forma que dificultaria ainda mais a qualificação para os vistos ainda mais difíceis, para garantir que apenas trabalhadores estrangeiros “melhores e mais brilhantes” sejam selecionados. A proposta também esperava eliminar a autorização de trabalho para os cônjuges de alguns dos titulares de vistos.

Por outro lado, a agência de imigração do Canadá deu início em junho à Estratégia de Habilidades Globais para que trabalhadores do exterior altamente qualificados obtenham uma autorização de trabalho em duas semanas.

“Isso é incrivelmente rápido. Adoramos o governo que é cuidadoso com essa questão porque sabemos que é um jogo de talento”, disse Hubert Bolduc, diretor executivo da Montreal International, uma parceria público-privada que recruta empresas estrangeiras para se mudar para o Canadá e oferece apoio quando chegam a Montreal.

Em 2017, a organização realizou oito missões internacionais de recrutamento em Londres, Paris, San Francisco e Los Angeles. Os diretores fizeram várias visitas informais a Nova York, onde convocaram uma empresa de videogames em dezembro.

Com as políticas de imigração do governo Trump, “estamos quase dizendo: ‘Não venham'”, disse Sunil Hirani, co-fundador da trueEx, que trabalha com taxas de juros globais, também sediada no bairro Flatiron. Ele chegou a Nova York vindo da Índia ainda criança, há 40 anos. “Como você pode ter um programa ‘Venha para a cidade de Nova York’ se as pessoas de Nova York forem expulsas? Como se vende isso?”

No ano passado, a diretora executiva e presidente da trueEx, Karen O’Connor, buscou opções para expandir o grupo de engenheiros de informática da empresa. Um consórcio relacionado à Montreal International a convidou para uma visita ao Canadá, o que a fez se sentir como um dignitário estrangeiro, disse ela. Houve um almoço elegante, reuniões precisamente coordenadas com possíveis parceiros de negócios e uma visita à Bolsa de Valores de Montreal.

O’Connor disse que a empresa de 50 pessoas poderia economizar mais de US$ 1 milhão em salários se contratasse engenheiros em Montreal. Em parte, isso ocorre porque o custo de vida era muito menor em comparação com Nova York, e porque a empresa poderia se qualificar para certos benefícios fiscais.

Mas, depois que Trump foi eleito, a trueEx hesitou, tentando reavaliar a situação; agora, está novamente considerando a expansão para o norte da fronteira em 2018, disse O’Connor, em parte porque recebeu uma visita do Departamento de Segurança Interna em meados de 2017 para verificar os registros dos seus empregados com vistos H-1B. Os executivos da empresa acharam o processo estressante.

“O meu conselho para outras empresas seria: segure-se o quanto puder, mas explore outras opções”, disse Hirani.

Mas John Miano, um advogado que representa trabalhadores americanos que dizem que perderam empregos injustamente para titulares de visto H-1B pouco qualificados, achou que era “pose” das empresas dizerem que estão cruzando a fronteira para encontrar melhores talentos. “O problema é que você tem que ir para o Canadá. A realidade é que os EUA ainda são o lugar para se fazer negócios.”

A expansão da Datalogue para Montreal, a cidade natal de Delisle, aconteceu rapidamente. Ele e um parceiro fundaram a empresa em 2016, na Cornell Tech em Manhattan, e tiveram sorte quando um magnata da tecnologia, Charles E. Phillips Jr., executivo-chefe da Infor, deu a eles duas mesas no quinto andar da elegantemente reformada sede da companhia em Flatiron.

Na primavera de 2017, a Datalogue cresceu para cinco funcionários e levantou US$ 1,5 milhão em investimento. Porém, trazer mais engenheiros teria custado milhares de dólares em taxas de visto e, mesmo assim, o processo não seria garantido, explicou Delisle. O Canadá tem um setor de inteligência artificial em expansão e a empresa abriu seu escritório de Montreal em abril no moderno bairro de Mile End; conseguiu mais US$ 1,5 milhão em investimentos até novembro.

Ainda assim, Delisle disse que a empresa tem melhor acesso aos clientes em Nova York, e por isso manteve sete funcionários lá para vendas e marketing.

O setor de tecnologia ainda prospera em Nova York, a indústria de crescimento mais rápido na cidade, mas perder escritórios ou empresas inteiras para o Canadá poderia ser uma preocupação, disse Kevin Ryan, empresário que fundou meia dúzia de startups.

“Quando alguém decide se juntar a uma startup em Toronto e não aqui, alguns deles podem sair da empresa e começar uma nova do outro lado da rua. O impacto mais amplo será sentido, literalmente, por décadas”.

Delisle concordou. “Não estou necessariamente assustado com Nova York, que tem programas fenomenais. Estou mais assustado com as políticas abrangentes que estão sendo aplicadas agora.”

FONTE:  GAUCHAZH –  Por Liz Robbins