Consórcios vão agora dos drones à cirurgia plástica, atraem grandes bancos e têm boom de vendas

Subutilizado, produto vem sendo turbinado com campanhas publicitárias, prêmios, alongamento de prazos e entrada em novos segmentos; tentativa é compensar perdas de receitas provocadas pelo avanço dos bancos digitais e do Pix

Grandes bancos comerciais redescobriram os consórcios e estão turbinando o mercado dessa espécie de “vaquinha” organizada, uma invenção brasileira que completa 60 anos, usada hoje para comprar de tudo. Os grupos de autofinanciamento vão de imóveis, veículos, tratores, drones, equipamentos para jogos eletrônicos a serviços, como cirurgia plástica, por exemplo. Com isso, as vendas do setor encerraram o primeiro semestre com o melhor desempenho dos últimos dez anos.

Entre janeiro e junho, foram comercializadas 1,850 milhão de novas cotas, com crescimento de 12,1% ante o mesmo período de 2021, apontam dados da Associação Brasileira das Administradoras de Consórcios (Abac). “O desempenho do primeiro semestre equivale a mais da metade (62%) do que foi vendido no ano passado inteiro”, afirma Edna Maria Honorato, presidente do Conselho da Abac e diretora-executiva do Consórcio Magalu.

Depois de pesquisar quando sairia um financiamento para fazer a cirurgia, optou pelo consórcio. Para levantar R$ 20 mil no banco, teria de parcelar em 48 meses – o prazo mínimo oferecido-, com prestações de quase R$ 800. Ou seja o desembolso total seria de R$ 38,4 mil. No consórcio, vai pagar 36 prestações mensais de R$ 683, com um gasto total estimado hoje de R$ 24,588 mil, sem contar a correção anual pela inflação. “Estou preparada para essa correção, estudei muito as condições e me senti segura.”

Consumidor deve ficar atento antes de aderir

A dificuldade do brasileiro de poupar, tanto pela falta de educação financeira como pela insuficiência de renda, explica o sucesso do consórcio. “O Brasil é um dos poucos países do mundo que têm consórcio porque falta educação financeira: as pessoas precisam de um boleto para pagar para conseguir guardar dinheiro”, afirma Pablo Alencar, diretor da corretora Valor Capital.

Atraídos exatamente por essa facilidade de fazer uma “poupança forçada” que será o passaporte para realizar um sonho de consumo, muitos compram um consórcio sem saber exatamente onde estão pisando e sem comparar as condições do contrato com as de um financiamento tradicional.

Na prática, não é possível afirmar que o consórcio é melhor do que um financiamento ou vice-versa. Tudo depende da análise das variáveis envolvidas no momento da compra do bem ou serviço e dos objetivos de quem o adquire, lembrando que no financiamento o bem é recebido na hora e no consórcio depende da sorte, ou seja, do sorteio ou lance. Mas o importante é conhecer as “pegadinhas” do consórcio para fazer a melhor escolha.

Sinais da economia

O primeiro ponto que o consumidor tem que ter em mente é que consórcio não é investimento, mas uma compra programada. “Investimento é quando se coloca um dinheiro e, ao final de um período, é possível sair do negócio com mais dinheiro do que o colocado inicialmente”, diz o especialista. No consórcio, é cobrada uma taxa de administração, que será abatida dos recursos aportados.

O argumento central a favor do consórcio em relação ao financiamento é que não há juros. No entanto, além da taxa de administração, embutida na prestação, existe um fundo de reserva usado para cobrir eventuais inadimplências e a correção anual da mensalidade por um índice previamente acordado no contrato. O objetivo da correção é atualizar o valor do bem para garantir que todos os participantes do grupo possam adquiri-lo, mesmo com o passar do tempo. No caso de imóveis, por exemplo, o indexador costuma ser o Índice Nacional da Construção Civil (INCC).

“Não é porque o juro é zero que a prestação não vai subir nunca”, afirma Alencar. Por isso, quem entra no consórcio tem que estar ciente de que assume um compromisso de pagamento com uma taxa pós-fixada, que depende da correção do preço do bem que o grupo pretende comprar. No caso do financiamento tradicional, onde incidem juros, a prestação não varia e se sabe exatamente quando será pago a cada mês.

Por isso, a simples comparação entre a taxa de administração do consórcio, por exemplo, de 0,16% ao mês para veículos pesados, com os juros mensais de 2% no caso de um financiamento, não é suficiente para saber qual a melhor alternativa.

O especialista recomenda que se calcule o Custo Efetivo Total, a CET, no jargão financeiro, em ambos os casos. No consórcio, a CET é composta pela taxa de administração, fundo de reserva e uma projeção do índice usado para corrigir a parcela. No financiamento, entram na CET a taxa de juros e a taxa de cadastro. A depender da conjuntura, isto é, do nível de juros e das projeções dos índices de inflação que corrigem os preços dos bens, essas taxas podem variar e afetar diferentemente os custos dos consórcios e dos financiamentos.

O diretor do Consórcio Bradesco, Henrique Fernandes, pondera que, se o preço do bem cair, a prestação do consórcio também diminui. “Você não pode comprar consórcio, se não ler o contrato, entender e fazer contas”, recomenda o executivo. Se a pessoa deixar de pagar a mensalidade do consórcio, por exemplo, ela só recebe os recursos de volta no encerramento do grupo, a menos que venda a cota para um terceiro.

Outro ponto a ser considerado é facilidade de entrar num consórcio. Há administradoras que não fazem uma análise de crédito do cliente, verificando se ele está inadimplente com o sistema financeiro ou se tem capacidade de bancar o pagamento do bem até o fim do grupo. No entanto, isso pode mudar a partir do momento que o consorciado for contemplado em sorteio.

Alencar explica que, caso o contemplado esteja inadimplente com sistema financeiro, há administradoras que exigem um avalista para entregar a carta de crédito. Ou, em casos extremos, adiam a entrega da carta para quando o grupo for encerrado. “Ninguém fala sobre isso na hora de vender a cota”, diz o especialista.

É também muito importante é conhecer o perfil da administradora, observa Fernandes. Isto é, a sua capacidade de manter o grupo superavitário, substituindo consorciados em caso de desistência. Além disso, qual é a média de contemplação da administradora, feita por meio de sorteio e lances. São informações relevantes que podem ser obtidas no contrato ou no site da administradora.

FONTE: https://www.terra.com.br/economia/consorcios-vao-agora-dos-drones-a-cirurgia-plastica-atraem-grandes-bancos-e-tem-boom-de-vendas,3c8c911c962a6669158bb180b54528d9ieounhr0.html