Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), há aproximadamente 70 milhões de pessoas com autismo em todo o mundo, sendo 2 milhões somente no Brasil. Estima-se que uma em cada 88 crianças apresenta traços de autismo, com prevalência cinco vezes maior em meninos. “O autismo é um transtorno do neurodesenvolvimento que se dá por conta de desordens durante a fase do desenvolvimento cerebral. É importante ressaltar aqui que o autismo não é uma doença. Perpetuar esse termo só dá força aos preconceitos que envolvem o transtorno”, explica a Dra. Milene Rosenthal, psicóloga e co-fundadora da Telavita, uma plataforma de consultas online.
A psicóloga também enfatiza que o tratamento, quando realizado adequadamente e desde cedo, ajuda a diminuir os sintomas e possibilita um melhor desenvolvimento e aprendizagem ao paciente. “Os procedimentos devem ser adotados por todos os envolvidos, tanto na educação através das terapias, quanto pela família. Uma família bem informada e preparada para compreender e atender as necessidades de quem possui o transtorno, é o grande pilar para a construção das características, identidade e potencial dessa pessoa”, ressalta.
Além disso, segundo a profissional, o acompanhamento psicológico envolve o controle da raiva, processamento sensorial, teleprática, análise de comportamento aplicada, terapia assistida por animais e terapia comportamental. Não podemos esquecer que a fonoaudiologia é fundamental para os casos em que a comunicação é comprometida. O uso de medicamentos antipsicóticos pode ser prescrito para alguns casos, mas somente especialistas podem fazê-lo. Os casos de autismo podem ser tratados por psiquiatras, neurologistas, pediatras e fonoaudiólogos. Milene acrescenta que o diagnóstico do autismo pode ser dado a partir da primeira infância, mas nada impede que muitas pessoas só o recebam na idade adulta. Isso, inclusive, é muito comum nos casos de autismo leve. É por isso que o acompanhamento psicológico para todos é fundamental, pois o psicólogo percebe se o paciente pode estar dentro do espectro e faz o encaminhamento para um neurologista.
App ajuda estudantes com autismo
No Colégio Pauliceia, em São Paulo, pelo menos 30% dos alunos possuem algum tipo de deficiência. Dessa fatia, a maioria apresenta quadro de autismo. O colégio oferece a utilização de tablets para a comunicação alternativa, com um aplicativo de comunicação por símbolos chamado Snap Core First. Basicamente, o app conta com um suporte de palavras básicas. Ele está disponível para download gratuito, mas há também uma versão paga, mais completa.
“A compreensão da diversidade implica em entender que as pessoas são diferentes, que têm necessidades específicas que precisam ser atendidas diferentemente. Defendemos o modelo de inclusão da pessoa com autismo baseada em Análise do Comportamento Aplicada. Nesse modelo, a pessoa responsável elabora, em conjunto com a escola, um currículo adaptado, levando em consideração o currículo típico e o conhecimento de repertório da criança com autismo. Idealmente, esse currículo adaptado é aplicado pelo AP (acompanhante personalizado) que atua integrado ao professor”, conta Carmen Lydia Trunci, a diretora do colégio.
Movimento Web Para Todos
O Web para Todos consiste em um ponto de encontro entre as organizações, desenvolvedores e pessoas com deficiência com o objetivo de mobilizar a sociedade para a causa da acessibilidade digital, e contribuir para transformar a web brasileira em um ambiente inclusivo para todos. Na plataforma online do Movimento, há compartilhamento de experiências (boas e ruins) que as pessoas com deficiência tiveram ao navegar em sites brasileiros – a partir desses relatos, os especialistas entram em contato com as organizações para conscientizá-las sobre a questão e direcioná-las à área de Educação da plataforma. Além disso, há também consultorias especializadas para adequar sites, aplicativos e outras plataformas digitais para a navegação de pessoas com deficiência. No próprio site, há pesquisas e artigos em torno não só do autismo, como outros transtornos também.
“Nós associamos acessibilidade quando vamos estacionar e vemos vagas para pessoas com deficiência, ou quando vemos um cadeirante tentando se movimentar pela cidade. Mas acessibilidade é muito mais que isso”, aponta Thiago Sarraf, especialista em e-commerce e embaixador do Movimento Web para Todos. “Quem tem epilepsia ou autismo pode sofrer convulsões dependendo das cores usadas na tela. A tela não pode ser pequena para quem tem dificuldade de enxergar. Deixar disponível apenas a opção de ligar não é bom para quem tem deficiência auditiva”, completa. Ele ainda defende que a acessibilidade é um esforço coletivo, e que é necessário pensar em vários tipos de deficiência e dificuldades que a pessoa possa ter, como o daltonismo, que é um tipo de deficiência visual. “É um mundo completamente novo que a gente precisa trabalhar”.
O professor Anselmo Frizera Neto, membro do Instituto de Engenheiros Eletricistas e Eletrônicos (IEEE) desenvolveu uma pesquisa de inclusão de pessoas com déficit cognitivo, que possui aplicação de robótica e Inteligência Artificial. Trata-se de um dispositivo para detectar o autismo, usando o método de aprendizagem de máquina, onde o sistema é alimentado com dados dos exames de pacientes com suspeita da doença. Após processar as informações, o algoritmo avalia se a pessoa possui ou não autismo. Em um ambiente monitorado por câmeras e sensores, um robô interage com a criança. Cada reação é avaliada pelo sistema, que indica potenciais sintomas, possibilitando o diagnóstico precoce e o tratamento adequado.
O professor conta que a ideia do projeto surgiu durante uma banca de doutorado da qual participou no Programa de Pós-Graduação em Ciências Fisiológicas na UFES. Ao ver como era feita a avaliação e os trabalhos de pesquisa com crianças com autismo, usando tecnologias atualmente disponíveis (como a eletroencefalografia ou a ressonância magnética funcional) e as grandes dificuldades de compatibilizar tais tecnologias com o conforto da criança durante a avaliação, foi discutido se não haveria outra forma de medir os parâmetros de interesse. Segundo Frizera, a alternativa deveria ser menos invasiva e mais transparente para o paciente, de forma a obter informação sem as dificuldades atualmente encontradas.
“Então pensamos em realizar medições do foco de atenção visual usando câmeras escondidas no ambiente durante a intervenção com psicólogos treinados. De forma complementária, pensamos ainda em desenvolver um pequeno dispositivo robótico que apoiasse o profissional da saúde durante as intervenções. E, assim, começamos a trabalhar na ideia, sem financiamento específico para tal fim”, relembra.
Para Frizera, qualquer tecnologia que venha a ser desenvolvida para melhorar a qualidade de vida das pessoas têm importância extrema. “No entanto, o impacto pode ser ainda maior se direcionamos os nossos esforços de pesquisa e desenvolvimento para apoiar as pessoas com necessidades especiais e encontrar formas de melhor incluí-las na sociedade”, afirma o professor. Por fim, ele ainda observa que o foco é no desenvolvimento e validação do conceito/protótipo e que ainda faltaria a participação de empresas que pudessem comercializar e levar tais desenvolvimentos para o mercado.