Como o QR Code transformou o Alibaba e a Tencent em meios de pagamentos

Essas empresas de tecnologia iniciaram uma revolução financeira na China que impacta toda a população, inclusive os desbancarizados

Quando o canadense Zennon Kapron chegou na China em 2004, ele tinha que sacar uma grande quantia de dinheiro no banco para conseguir pagar o aluguel. “Eu não conseguia sacar no caixa eletrônico, então sacava o dinheiro, colocava em um saco de papel e ia embora”, contou o diretor da consultoria financeira Kapronasia, que tem escritórios em Xangai, Singapura e Hong Kong.

Zennon é especialista em fintechs na China. Ele esteve no Fintech Conference da StartSe que acontece nesta quarta-feira (22).

No mesmo ano, o Alibaba lançou o AliPay, sistema de pagamento através de QR Code. “Hoje as pessoas não aceitam o dinheiro, elas aceitam o QR Code. Fintechs trouxeram mudanças em muitos lugares, mas em nenhum lugar do mundo podemos ver a mesma mudança que aconteceu na China”, comentou.

Hoje os QR Codes dominaram o mundo físico, mas a mudança foi pensada inicialmente para o pagamento de compras online. “O objetivo era de diminuir a fricção das transações. Nós pagávamos em dinheiro para o responsável pela entrega, o que era ineficiente e pouco confiável. O AliPay surgiu para resolver o problema de confiança”, explicou Kapron.

WeChat, aplicativo de mensagens semelhante ao WhatsApp e que se tornou um super aplicativo na China, implantou o WeChat Pay logo depois. Produto da Tencent, outra gigante de tecnologia chinesa, o aplicativo passou a dividir o mercado com o AliPay. “Um ano depois, minha mulher estava feliz que eu havia gastado menos no AliPay, mas o que aconteceu é que o WeChat ganhou tração e eu passei a usá-lo também”, explicou o consultor financeiro.

A penetração de smartphones na China foi indispensável para as mudanças nas formas de pagamento, pois os celulares se tornaram o próprio banco. A adoção aconteceu mais rapidamente do que em qualquer outro lugar do mundo, segundo Kapron (gráfico). Agora, é possível realizar empréstimos, pagamentos e transferências através de apenas um aplicativo – se o AliPay ou WeChat, fica ao gosto do freguês.

Apesar de tudo ter começado com os meios de pagamento, os superaplicativos chineses hoje concentram soluções de diversas empresas bilionárias e líderes de mercado. Não é necessário realizar reservas de hotéis através do Kayak, por exemplo – é possível fazê-lo no mesmo aplicativo em que você troca mensagens. Pedir uma corrida por aplicativo na China não significa abrir o aplicativo da Uber ou Lyft, mas buscar uma corrida da Didi Chuxing no próprio WeChat.

Uma carteira digital internacional

Empresas como a Tencent e Alibaba estão saindo da China e fortalecendo suas operações fora do país. Um dos objetivos é criar uma carteira digital internacional que seja capaz de enviar dinheiro para qualquer lugar do mundo em poucos segundos, segundo relata Kapron.

Por oferecer tantas opções de serviços online aos usuários, essas companhias acabam acumulando uma das maiores riquezas no setor de tecnologia hoje: dados. Segundo pesquisa da Kapronasia com 2 mil millenials (a famosa geração Y), 53,5% não se importaria se um banco sugerisse um produto de gestão financeira com base em seus salários e hábitos de consumo. “Eles estão dispostos a trocar a privacidade para ter mais produtos financeiros”, explicou Zennon.

Isso é importante porque muitas dessas pessoas eram desbancarizadas ou possuíam pouco acesso a empréstimos e outros produtos financeiros devido a uma falta de histórico de crédito. Agora, além de vender produtos – o principal negócio do Alibaba é o e-commerce -, a empresa começa a atuar como um banco para os chineses. O mesmo acontece com a Tencent, que deixa de oferecer apenas jogos e aplicativos para a população e passa a ser intermediadora de pagamentos e fonte de serviços financeiros.

FONTE: STARTSE