Coisas que aprendi com o modelo de inovação israelense

Startup Nation

Foi com a expressão “Start-up Nation” que Israel ficou famoso, logo após o lançamento do livro de Saul Singer, no qual o autor explora o modelo de inovação israelense.

Nele, Singer fala sobre o fenômeno de que mesmo Israel sendo um país minúsculo, com 9 milhões de habitantes (menos que a cidade de São Paulo), ter 60% do seu território desértico e viver em um constante estado de guerra, o país também é um dos maiores e mais importantes pólos de tecnologia e de nascimento de startups do mundo.

Hoje são 6.000 startups, sendo quase uma startup a cada 1.500 habitantes! Eu estudei futurismo e tecnologia na Universidade Hebraica de Jerusalém, faço viagens de inovação com grupos de empresários e estou sempre muito próxima do ecossistema israelense e por isso, resolvi reunir nesse texto os meus 10 principais aprendizados do que faz com que um país tão pequeno, com tantas adversidades e escassez de praticamente tudo seja um case global.

Pense e faça tudo como uma startup

Quando pensamos em uma startup, sempre nos questionamos: qual é o problema que você ou sua empresa resolvem? Agora imaginem que o problema é a sobrevivência de uma população inteira! No meio do deserto pessoas de diversas nacionalidades tiveram que construir uma nação. Israel é isso, um país feito por imigrantes refugiados de guerra ou sionistas, que vieram de culturas, valores e estilo de vida completamente diferentes entre si, e que foram obrigados a co-habitar e se unir para melhorar sua qualidade de vida.

Imigrantes possuem características que foram essenciais para moldar o mindset israelense: não têm nada a perder e são totalmente abertos a correr riscos. Podemos dizer então que Israel é uma startup de 70 anos de idade, que viu em sua história a necessidade de se reinventar e resolver adversidades o tempo todo.

Inovação só acontece em um ambiente de liberdade e diversidade

Um dos principais problemas das empresas hoje é a dificuldade em inovar e sabemos que diversidade é um dos principais pilares para inovação. Vemos hoje um grupo de profissionais que veio do mesmo lugar, com os mesmos pensamentos, raça, formações universitárias, gostos, classe social e é por isso que as empresas sentem essa grande dificuldade em inovar.

Ao contrário disso, Israel é uma terra de muitas e extremas liberdades e diversidades que refletem na forma como os israelenses vivem seu cotidiano e abraçam pontos de vista diferentes. Um exemplo disso é que lá o exército é sim lugar de mulher. Em Israel, o serviço é obrigatório para homens e mulheres e hoje existe um equilíbrio entre seus membros: 50% de homens e 50% de mulheres que exercem as mesmas funções e correm os mesmos riscos. Lá homens e mulheres são tratados iguais; afinal, um país em guerra constante não pode se dar luxo de carregar valores ultrapassados e ainda acreditar que existe um “gênero frágil.”

O mesmo acontece no universo LGBTQA+. Israel é um dos países do mundo mais abertos a diversidade, sem dúvida nenhuma o único país aberto do Oriente Médio. A comunidade tem leis que protegem os direitos, o casamento entre pessoas do mesmo gênero é legalizado e possui uma das maiores paradas do orgulho LGBTQA+ do mundo.

Outro ponto é a cultura liberal onde, por exemplo, hoje já é permitido o uso da maconha para fins recreativos e também uso medicinal. Possui um universo grande de cannabusiness (mercado do cannabis) sendo desenvolvido e está sempre de olho em oportunidades emergentes de negócio.

O mundo todo pode ser o seu mercado

Israel não possui mercado interno e, por isso, precisou olhar para a sua economia de maneira global. É praticamente o oposto do que acontece no Brasil por exemplo, que possui um mercado interno imenso. Diante das adversidades, Israel investiu em tecnologia e inovação, como maneira de atrair o mercado externo e poder exportar seus conhecimentos e se tornou um dos maiores experts e referência do mundo em tecnologia de ponta. Hoje, o mundo todo consome a tecnologia israelense. Praticamente tudo que usamos e consumimos no nosso dia-a-dia tem tecnologia israelense embarcada. Sabe o tomate cereja? Criação israelense. Sabe o pen drive? Invenção israelense. E o Waze que você usa todos os dias? Empresa israelense.

Empreendedores mais velhos criam negócios mais sustentáveis

Diferente do restante do mundo, onde ao pensar em uma equipe de startup associamos a figura de vários jovens e amigos numa garagem construindo uma ideia milionária, por lá é bem diferente. Os empreendedores têm uma trajetória diferente.

Eles vão para a escola, depois servem o exército por três anos, fazem um ano sabático (para se recuperarem do período intenso imersos na guerra) e só depois que voltam entram para a faculdade, e aí quatro anos depois começam a empreender, muito mais velhos. É comum ver em Israel pessoas com 50, 55 anos de idade fazendo pitches de startups. Muitos iniciando, mas outros já em sua segunda ou terceira empreitada.

É o caso do professor Amnon Shashua e Ziv Aviram, fundadores da Mobileye (startup de carros autônomos que foi comprada pela Intel por US$ 15 bilhões), que logo após venderem a Mobileye cofundaram sua nova startup, a OrCam, que usa computer vision (visão computacional, em português) para ajudar deficientes visuais a “enxergar”. O que podemos aprender com esse modelo é que nem sempre o momento certo é agora. A experiência de vida e segurança do empreendedor são fatores essenciais para a criação de um negócio durável.

Educação é o pilar que mais impulsiona a inovação

A educação é um dos principais investimentos do governo israelense, e não é para menos que país tem um dos maiores índices do mundo de formação universitária (46% da população). Além disso, a universidade é um dos maiores impulsionadores para o empreendedorismo, já que boa parte das instituições educacionais é conectada com o mundo de inovação, startups e tecnologia, e muitas vezes a própria universidade entra com incentivos aos alunos para criarem seus negócios próprios.

Um dos exemplos mais interessantes do papel da universidade pra mim é a questão de patentes: elas registram patentes (de produtos, idéias, projetos) e depois repassam aos seus alunos para que iniciem suas startups a partir das patentes que a universidade possui. Não é sensacional? A universidade vira sócia do aluno, que já têm um grande caminho construído, o apoio da instituição e uma chance infinitamente maior de dar certo. Só a título de curiosidade, a Universidade Hebraica de Jerusalém, além de ter sido fundada por Albert Einstein, é uma das universidades com o maior número de patentes registradas do mundo.

FONTE: UOL