Bradesco entra na era da computação quântica

Garantir segurança de informações críticas motiva a contratação de serviços da IBM.

O Bradesco adentrou o mundo das supermáquinas da computação quântica, tecnologia ainda experimental com capacidade de processamento exponencialmente maior que os computadores tradicionais e capaz de resolver enigmas matemáticos e desafios da humanidade nas áreas de saúde pública, mudanças climáticas, logística, entre outras, que lidem com múltiplas variáveis e complexidade de dados.

A principal motivação, no entanto, é garantir a segurança de informações críticas – caso de senhas, dados de clientes, acesso a recursos etc – que poderão, hipoteticamente, ter a criptografia quebrada quando essas supermáquinas caírem nas mãos de “hackers” ou do crime organizado, evento que assombra governos, instituições financeiras e corporações.

Para se precaver contra esse cenário hipotético, o banco contratou os serviços de segurança da IBM, que tem a maior frota de computadores quânticos e desenvolveu o aparelho com a maior capacidade hoje no mundo, chamado Osprey, de 433 qubits (unidade de bit quântico) e que chegará a 1.000 qubits ainda este ano. Acredita-se que a criptografia da internet será facilmente quebrada quando esses computadores se aproximarem de 1 milhão de qubits, algo que pode ocorrer entre 15 e 20 anos.

A ideia é fazer uma varredura de dados potencialmente sensíveis e vulneráveis, acumulados durante décadas de operação com clientes, para colocá-los sob a proteção de uma criptografia resistente aos computadores quânticos que surgirão, chamados de algoritmos pós-quânticos.

Antevendo a vulnerabilidade da criptografia em uso hoje, o Instituto Nacional de Padrões e Medidas (Nist) dos EUA fez simulações matemáticas de 72 algoritmos comumente utilizados na proteção de dados para identificar quais seriam resistentes no futuro à ação dos computadores quânticos. Dos 72 estudados, apenas quatro se mostraram resistentes, sendo que três deles são da IBM (o quarto é ligado a universidades americanas, mas seu principal desenvolvedor foi contratado também pela IBM).

No Bradesco, a primeira leva desse trabalho de “upgrade” de algoritmos para o padrão pós-quântico se dará com as aplicações do “open finance”, que permitem o compartilhamento de dados dos clientes com outras instituições financeiras e que começaram a funcionar não muito tempo atrás. Sistemas e serviços mais antigos – o chamado legado tecnológico, que os bancos se debruçam rotineiramente para atualizar- serão endereçados mais tarde.

Tecnologia chega para resolver problemas que hoje demorariam anos para se executar” —

Cíntia Barcelos “

A computação quântica não vem para substituir a clássica. As duas vão coexistir. A computação quântica chega para resolver problemas que hoje demorariam anos para se executar. Uma das consequências no futuro pode ser o impacto nos sistemas de proteção de dados. Entendemos que nossa preparação é prioridade neste momento. A segurança é inerente à nossa missão como banco”, disse Cíntia Barcelos, diretora de tecnologia do Bradesco.

Segundo Ana Paula Appel, cientista de dados e “embaixadora quântica” da IBM no Brasil, os especialistas da casa ajudarão o banco a identificar aplicações e algoritmos criptográficos sob risco de ataques. Com base nessa avaliação, o Bradesco planeja criar uma metodologia para determinar outras aplicações que possam se beneficiar de tecnologias pós-quânticas e prepará-las para integrar os algoritmos resistentes aos futuros computadores quânticos. Também deve formar internamente profissionais aptos a trabalhar com essa tecnologia.

Além do serviço na área de segurança, o Bradesco entrou em uma rede organizada também pela IBM, da qual participam várias outras empresas globais, para testar casos de uso e fazer experimentos com a tecnologia quântica.

O banco está particularmente interessado em testar a novidade para resolver dilemas da avaliação de derivativos, gestão de riscos e portfólios, elaboração de cenários macroeconômicos e otimização do uso da infraestrutura de distribuição de dinheiro nos caixas eletrônicos. São todas operações complexas, sendo algumas bastante custosas, que demandam tempo e capacidade de processamento dos computadores tradicionais, mas que em tese poderão ser facilmente assumidas pela tecnologia quântica.

“À medida que as capacidades da computação quântica avançam, isso pode nos permitir um dia ver uma maior eficiência operacional e a resolução de problemas que atualmente são considerados difíceis para os computadores clássicos. Esperamos que a tecnologia possa ser amplamente utilizada em um período de cinco a dez anos”, disse Barcelos.

Appel, da IBM, lembra que a tecnologia ainda é experimental, não está disponível para uso comercial, e os dados provenientes dos sistemas legados precisam ser adaptados para funcionar em softwares quânticos. “Para ter um modelo rodando em quantum, precisa conectar com os bancos de dados e com as transações dos clientes vindas do computador clássico”, disse a cientista.

O acesso é remoto, por meio de serviço de nuvem, aos computadores quânticos que ficam nos EUA. O banco poderá trocar experiências com participantes da rede e terá assessoria para utilizar softwares quânticos e desenvolver suas aplicações.

Extremamente sensíveis e instáveis, os supercomputadores quânticos são do tamanho de um barril e parecem um candelabro de luzes. O processador em si é pequeno, do tamanho de um chip, mas o envoltório é importante para isolar as partículas subatômicas, como elétrons e nêutrons, responsáveis pelo processamento quântico de dados.

O aparelho precisa ficar em ambientes completamente isolados e controlados, a uma temperatura de cerca de -273ºC (próximo do zero absoluto da escala Kelvin). Qualquer ruído, campo magnético, abalos sísmicos e até raios cósmicos podem influenciar a operação das partículas, ocasionando erros de processamento.

FONTE:

https://valor.globo.com/financas/criptomoedas/noticia/2023/07/31/bradesco-entra-na-era-da-computacao-quantica.ghtml