Aprendendo a aprender sobre IA, algoritmos, agentes de silício… e a vida

Este é um aspecto — o aprendizado — sempre presente, mas que não parece ser explorado em sua plenitude e que deveria ser extraído e aplicado aos processos e decisões de uma empresa

Quando se toca no tema analytics e temas relacionados a dados — com as suas derivações como informação, insights e mais recentemente inteligência —, um aspecto sempre presente, mas que não parece ser explorado em sua plenitude é o aprendizado, que deveria ser extraído e aplicado aos processos e decisões de uma empresa.

Vale um raciocínio muito similar para as pessoas envolvidas nesse processo, quaisquer que sejam seus papéis: desde o responsável pela informação, o cientista de dados, o analista de negócios ou outro papel no ciclo de vida da informação.

Chegar a uma conclusão interessante ou descobrir algo sem agir efetivamente sobre isso não gera valor. Mas também fazer esse ciclo sem aprender é, em alguns casos, um desperdício de oportunidades para melhoria contínua, seja dos processos e eficiência corporativa ou do próprio crescimento pessoal e profissional.

Desde que desenvolvemos as habilidades cognitivas como espécie, a questão de “como aprender” — ou “como ensinar” — é discutida e tratada nas escolas e academia, nos cursos de formação e pós-graduação de professores e, recentemente, também se tornou preocupação de profissionais de tecnologia, não apenas no sentido de como aportar elementos tecnológicos no processo de ensino, mas no sentido de complementar, potencializar ou substituir o próprio intelecto humano em algumas atividades.

Sempre tive muita curiosidade e inquietude para aprender novos temas e entender como colocá-los em prática, e por uma série de fatores, atualmente lido com uma dualidade interessante: enquanto minha esposa está fazendo uma graduação orientada ao ensino de seres humanos (mais comumente conhecida como pedagogia), eu tenho me educado e aplicado muito conhecimento e pesquisa orientado ao ensino de agentes virtuais.

A princípio parece haver poucas similaridades entre esses ensinos, afinal de contas, até o “substrato” do objeto do ensino é diferente (a menos que alguém discorde de que somos feitos de pastilhas de silício e outros materiais), mas os objetivos, técnicas e demanda por conhecimentos multidisciplinares é realmente muito parecido.

Por exemplo, em diversas situações, as técnicas de reforço de aprendizagem (ou reinforcement learning) que usamos — muitas vezes sem tomar ciência disso — para ensinar crianças a andar de bicicleta estão sendo aplicadas de forma ampla e profunda no ensino de agentes virtuais. No caso dos agentes de silício, as técnicas são de reforço de aprendizagem profundo (deep reinforcement learning).

O desenvolvimento de interações entre seres humanos e algumas espécies de primatas é feito com uma técnica onde o primata busca entender o ambiente e “comportamentos observados” para inferir um resultado (ou recompensa) a partir dessas observações parciais (já que muitas vezes o primata é mantido em um ambiente controlado onde ele não tem acesso a toda informação, interações ou variações que seriam possíveis no seu habitat natural).

Existe uma técnica incrivelmente parecida com esta para ensino de agentes virtuais, chamada de aprendizado por reforço invertido (ou inverse reinforcement learning), que tem sido aplicada com sucesso em algumas pesquisas emergentes sobre temas de diagnóstico e tratamento de diabetes (em seres humanos).

Desde que cientistas de computação descobriram que “neurônios artificiais” poderiam ser base de estruturas de execução de algoritmos com particularidades envolvendo aprendizado (as redes neurais), muito progresso rápido foi visto pela comunidade científica em pouco tempo (entre 1956 quando o termo inteligência artificial foi utilizado pela primeira vez no contexto que hoje o entendemos e também meados de 1970).

Isso porque muitas atividades (como realização de aritmética complexa, provas de teoremas de álgebra, inferências lógicas) que se acreditavam não poder ser replicadas (ou executadas) com sucesso por algoritmos e máquinas, acabaram passando por essa situação e de forma recorrente e consistente

Porém, depois deste período, diversas teorias, hipóteses e algoritmos mostraram-se muito ineficientes, seja para generalizar os problemas específicos que tinham sido “programados”, realizar aprendizados mais complexos e em ambientes menos controlados ou com menor quantidade de informação exata, disponível e catalogada (ou anotada, como alguns pesquisadores utilizam).

Só nos últimos anos, com a aceleração continuada da queda do custo de processamento e armazenamento houve uma retomada e avanços interessantes na área. A expansão “horizontal” de práticas de conhecimento trazendo para a discussão não apenas cientistas de computação e programadores, mas médicos, filósofos, geneticistas e outros pesquisadores de áreas de humanas, o que trouxe um novo panorama para o setor.

Reforçar os conhecimentos

Aprender é o ato de adquirir novos ou reforçar conhecimentos, comportamentos, habilidades ou valores existentes. Os seres humanos têm a capacidade de aprender. No entanto, com o progresso na inteligência artificial, as técnicas de aprendizagem de máquina tornaram-se recursos que podem aumentar ou até mesmo substituir a aprendizagem humana. O aprendizado não acontece de uma só vez, mas ele se baseia e é moldado pelo conhecimento prévio. Para esse fim, aprender pode ser visto como um processo, em vez de uma coleção de conhecimento factual e processual. Por dentro do assunto: Veja com a Hekima a evolução da inteligência artificial do século XIV à era Big Data Patrocinado 

Tanto a aprendizagem humana quanto a máquina geram conhecimento, uma residente no cérebro e a outra residindo na máquina. Isso levanta a questão de como aplicamos o tipo de conhecimento e a forma como equilibramos esses recursos de conhecimento para resultados ótimos.

Seguem algumas obras que exploram de forma muito interessante tanto a evolução da espécie humana quanto de sua cognição e paralelos com a evolução de aprendizagem de máquina.

Recomendo a todos investirem um tempo de qualidade expandindo seu conhecimento, desenvolvendo sua curiosidade e entender como este avanço cada vez mais rápido de tecnologia pode ser usado em benefício de todos:

. Sapiens: A Brief Story of Humankind e Homo Deus: A Brief History of Tomorrow, escritos pelo professor Yuval Noah Harari: abordam a história da humanidade desde o início da vida até nosso atual estágio de evolução cognitiva, além de tecer algumas hipóteses para um futuro baseado cada vez mais em poder computacional e dados.

. What Algorithms Want : Imagination in the Age of Computing (https://mitpress.mit.edu/books/what-algorithms-want) e www.youtube.com/watch?v=5mS06id_v_A), escrito por Ed Finn: Discorre sobre o que está “por dentro” de soluções analíticas e algoritmos usados por todos nós em serviços do dia-a-dia, e no que eles podem tornar-se com abordagens mais estruturadas;

. The Master Algorithm: How the Quest for the Ultimate Learning Machine Will Remake Our World (www.amazon.com/Master-Algorithm-Ultimate-Learning-Machine/dp/0465065708 e www.youtube.com/watch?v=B8J4uefCQMc), por Pedro Domingos: Compartilha a evolução de sua busca por um algoritmo único que poderia ser a base para o aprendizado geral de qualquer tema, e também disponibiliza o framework que já conseguiu construir unificando algumas das escolas de estatística (alchemy.cs.washington.edu). Sua tese é inspirada pela teoria de tudo da Física, onde todos os fenômenos (gravidade, eletricidade, etc.) poderiam ser explicadas por apenas uma teoria;

. Life 3.0: Being Human in the Age of Artificial Intelligence (www.amazon.com/Life-3-0-Being-Artificial-Intelligence/dp/1101946598 e http://www.youtube.com/watch?v=NPHpFobqItg), por Max Tegmark: Discute o conceito de Vida 3.0: Vida 1.0 consiste em ter uma existência sem alterações relevantes na composição do indivíduo (e.g.: bactérias); a Vida 2.0 consiste em ter a possibilidade de atualizar o ‘sofware’ ao longo da existência (e.g.: seres humanos, que podem aprender e desenvolver habilidades) e a Vida 3.0 contempla indivíduos que podem evoluir não só o software, mas o hardware também. Traz um debate muito relevante sobre ética e direcionamento de pesquisas.

Neste último livro fui apresentado ao instituto Future of Life, e compartilho aqui os princípios que estão norteando algumas das pesquisas mais relevantes no tema (e tem patrocínio de algumas pessoas influentes como Elon Musk e Stephen Hawking): futureoflife.org/ai-principles.

Estes princípios são conhecidos como Princípios de Asilomar por serem oriundos desta conferência, organizada no ano passado e para os quais mais de 90% dos participantes tinham consenso.

Os vídeos desta conferência podem ser vistos em www.youtube.com/channel/UC-rCCy3FQ-GItDimSR9lhzw.

Finalizo por aqui relembrando o instigante desafio de aprender; convidando todos para esta jornada e lembrando que além de livros, vídeos e cursos; também existe uma infinidade de grupos de discussão e encontros que já estão organizados em diversas cidades no Brasil.

FONTE: COMPUTERWORLD