Após a morte do pai, professor de Goiás cria aplicativo que identifica doenças cardíacas de forma simples e rápida

O professor Sandro Moreira desenvolve aplicativo para apontar doenças cardíacas (Foto: Paula Resende/ G1)

O professor goiano Sandro Moreira transformou a dor da perda do pai em um incentivo para desenvolver um aplicativo que ajudasse as pessoas a descobrirem, de forma simples e rápida, se têm alguma doença nas válvulas do coração. Ele afirma que já testou o sistema em 300 batimentos cardíacos e obteve um índice de 86% de precisão.

“O intuitivo é salvar vidas, dar qualidade de vida. Se uma doença é identificada precocemente, se inicia a medicação correta e, se necessário, faz a cirurgia quando ainda se tem vigor para isto”, disse o pesquisador.

Batizado de DeepCardio, o aplicativo começou a ser desenvolvido em julho de 2016, logo após a morte do pai de Moreira. Ele tinha estenose aórtica e só descobriu aos 63 anos, após sentir cansaço. No caso do idoso, a única saída era a cirurgia, mas ele morreu horas antes de passar pelo procedimento.

Moreira resolveu usar o conhecimento adquirido no ambiente hospitalar por acompanhar o tratamento do pai para desenvolver o projeto de doutorado da Universidade Federal de Goiás (UFG).

“Eu já estava trabalhando com inteligência artificial, mas não tinha projeto definido. Acabei usando a série de aprendizados para fomentar o produto que estou trabalhando hoje, foi uma forma de lidar com o luto, comecei a pensar em quantas pessoas acabavam falecendo sem saber o que, de fato, tinham”, contou.

Simplicidade e mobilidade

O aplicativo ainda está em fase de testes e, por enquanto, só pode ser acessado em computadores. A proposta do professor é desenvolver formatos para uso em celulares e tablets para que o sistema possa ser levado a qualquer lugar.

Além da mobilidade, Moreira também preza pela simplicidade do sistema para que agentes de saúde e até mesmo as próprias pessoas possam fazer o teste em casa.

“A proposta é para a área médica, mas nada impede que a pessoa tenha em casa e faça um levantamento inicial. A interface é simples até mesmo para o usuário que não tem muito conhecimento de informática ou médico”, explicou.

Professor Sandro Moreira desenvolve aplicativo para apontar doenças cardíacas em Goiás (Foto: Paula Resende/ G1)

Professor Sandro Moreira desenvolve aplicativo para apontar doenças cardíacas em Goiás (Foto: Paula Resende/ G1)

Professor Sandro Moreira desenvolve aplicativo para apontar doenças cardíacas em Goiás (Foto: Paula Resende/ G1)

Para realizar o teste, é necessário ter um estetoscópio para captar os batimentos que serão analisados. O aparelho é colocado no paciente e conectado ao computador pela entrada de microfone. Depois de 30 segundos de gravação, o áudio é analisado e, em até 45, apresenta o resultado positivo ou negativo para a existência de anormalidade.

“Não é tirar o papel do cardiologista, mas dar uma ferramenta simples para fazer o diagnóstico inicial rápido no consultório ou para que a pessoa procure um médico o quanto antes”, ressaltou.

A mobilidade e a simplicidade são fundamentais para o professor devido à escassez de cardiologistas e de aparelhos para exames no coração em cidades do interior. Por causa desta ausência, pacientes viajam longas distâncias para serem analisados e, além disso, na rede pública há fila de espera para fazer os procedimentos.

Presidente da Sociedade Goiana de Cardiologia, o médico Gilson Cassem calcula que na Grande Goiânia há 1 especialista para cada 5 mil pessoas, sendo que a Organização Mundial da Saúde define a proporção de 1 médico para cada 1 mil habitantes. Para ele, o déficit de especialistas na área ocorre em cidades pequenas.

“Os especialistas se concentram em locais que dão suporte para trabalharem, é necessário de infraestrutura, e isso não se encontra em interiores muito longínquos”, explica o médico.

Próximos passos

Moreira selecionou os 300 batimentos cardíacos testados no aplicativo em um bando de dados disponível para pesquisadores. A partir de agora, ele iniciará a fase de testes em pacientes com acompanhamento de cardiologistas.

Além de melhorar o nível de precisão do sistema, o professor também visa que ele, inclusive, aponte se a disfunção se trata de algumas destas doenças: estenose aórtica, regurgitação mitral, regurgitação aórtica, estenose mitral e persistência do ducto arterioso.

Doenças comuns

Cassem vê com bons olhos o aplicativo relacionado à escuta cardíaca. “Neste caso, a mais comum das doenças valvares é reproduzir o chamado sopro cardíaco, que pode ser um indicativo de uma doença cardíaca, não que dê o diagnóstico, mas indica que pode ter uma doença cardíaca. Nesta situação, o indivíduo pode, precocemente, procurar um cardiologista para investigar se realmente se trata de uma doença cardíaca ou sopros fisiológicos comuns”, avalia.

O cardiologista pondera que as doenças cardíacas mais comuns não podem ser diagnosticadas por meio do som dos batimentos. “Estima-se que 35% dos adultos têm hipertensão arterial. É um índice muito alto, de caráter epidêmico. Já o infarto agudo do miocárdio mata aproximadamente 300 mil pessoas por ano, ou seja, uma cidade do porte de Anápolis some do mapa todos os anos”, alerta.

FONTE: G1