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Apagão não justifica pressão para substituir energia eólica por térmica

Gestão competente seria capaz de conciliar estabilidade da geração e impacto ambiental da rede elétrica.

Antes do diagnóstico técnico final, as autoridades atribuíram o apagão da semana passada à falha numa linha de transmissão da Chesf, subsidiária da Eletrobras, entre Quixadá e Fortaleza, no Ceará. O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, disse que o problema isoladamente não seria capaz de provocar queda da energia em 26 unidades da Federação. Mesmo assim, as atenções imediatamente se voltaram ao parque de geração eólica instalado no Ceará.

O apagão deflagrou uma corrida de lobbies. “Tem gente tentando aproveitar a situação para pôr a culpa na energia eólica e facilitar projetos de lei para encher o país de térmicas”, disse Elbia Gannoum, presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica (ABEEólica). A reação tem como pano de fundo a competição entre as fontes limpas, hídrica, eólica e solar, e a instalação de termelétricas a gás para usar as reservas descobertas na exploração do pré-sal.

As hidrelétricas responderam por 75,8% da energia elétrica consumida no Brasil entre janeiro e junho. As demais fontes não são desprezíveis. Usinas térmicas responderam por 8,1%, ante 11,9% das eólicas e 3,3% das solares. A previsão para o segundo semestre é que as fontes limpas continuem acima de 90%. Mesmo assim, as térmicas — que geraram 21,4% na crise de 2021 — serão ampliadas em razão do jabuti inserido na lei de privatização da Eletrobras impondo sua instalação onde não há consumo que justifique.

O principal argumento usado por seus defensores é que são uma modalidade de geração de “despacho rápido”. Basta começar a queimar o gás e a energia chega às tomadas, ao contrário da geração eólica ou da solar, que demoram a alcançar a potência necessária para que possam ser transmitidas aos linhões que alimentam o sistema. O lobby das térmicas usou a demora para restabelecer o fornecimento nos estados do Nordeste depois do apagão como argumento contra as eólicas.

É verdade que a energia eólica e a solar não são constantes. Pode haver variação brusca em função das condições meteorológicas: mais ou menos vento, mais ou menos nuvens. Mas nada que um sistema integrado de distribuição alimentado por várias fontes não consiga suportar. As hidrelétricas em operação podem sustentar a rede para absorver as oscilações típicas da geração eólica e da solar. As térmicas também têm papel fundamental para evitar choques bruscos no fornecimento.

Cada fonte geradora de energia tem seu impacto ambiental. Diante da necessidade de reduzir as emissões de gases, não faz sentido optar por termelétricas em vez de instalar um parque eólico ou solar nas regiões propícias. Sobretudo porque o custo de produção das fontes limpas já é competitivo. Ao contrário do que alegam seus lobistas, essas fontes não necessitam mais de subsídios, depois invariavelmente pagos pelo consumidor na conta de luz.

A rede elétrica brasileira já está dentro dos padrões necessários para gerenciar o equilíbrio entre, de um lado, a estabilidade da geração e, de outro, o impacto ambiental. Desde que a gestão seja competente.

FONTE:

https://oglobo.globo.com/opiniao/editorial/coluna/2023/08/apagao-nao-justifica-pressao-para-substituir-energia-eolica-por-termica.ghtml