Entenda por que São José dos Campos é a cidade mais inovadora do Brasil

O Parque Tecnológico da cidade reúne mais de 300 empresas e instituições de pesquisa e fomento às startups

Muito se fala sobre os ecossistemas de startups já consolidados como São Paulo, Belo Horizonte, Florianópolis e Recife, mas existem outros hubs promissores fora das grandes capitais, como a região do Vale do Paraíba (SP). Dentro do Vale, mapeamos as maiores startups, hubs de inovação e coworkings de São José dos Campos. A cidade é um dos maiores polos de tecnologia do país e se reinventa a cada novo dia.

 Segundo pesquisa da Endeavor (organização de apoio ao empreendedorismo e empreendedores), que atua em todo o Brasil, a cidade de São José dos Campos é a mais inovadora do país. O levantamento mostra que a cidade está a frente de capitais como Rio de Janeiro e São Paulo, que aparecem em terceiro e quarto lugar, respectivamente. A pesquisa leva em consideração aspectos como a média de investimentos na cidade, infraestrutura tecnológica, além da proporção de mestres e doutores em ciências e tecnologia. Segundo a organização, esses são fatores de sucesso para transformar novas ideias em negócios lucrativos.

Parque Tecnológico de São José dos Campos é um ótimo exemplo. Ele é o maior complexo de inovação e empreendedorismo do Brasil, com mais de 300 empresas e instituições de ensino e pesquisa. Inaugurado em 2009, é o único lugar do mundo em que as três maiores fabricantes de aviões realizam atividades, sendo elas a Boeing, a Airbus e a Embraer. Cerca de 6 mil pessoas transitam diariamente por este espaço e, desde a sua criação, o parque recebeu investimentos de R$ 1,9 bilhão.

“Trabalho com empreendedorismo e inovação há mais de uma década. Nos últimos anos, surgiram na região grupos de empreendedores que estão fortalecendo o nosso ecossistema”, diz Alexandre Barros, líder do Nexus Innovation Hub, incubadora e aceleradora situada no Parque Tecnológico. “O Parque, por meio do Nexus, tem um papel estratégico e tenho certeza que com a união desses grupos iremos ganhar força e sinergia para elevar a comunidade local a um outro patamar de reconhecimento e produção de tecnologias e negócios em escala global”, calcula o executivo.

Para Amure Pinho, presidente da ABStartups (Associação Brasileira de Startups), a região é um grande polo de desenvolvimento tecnológico devido aos centros acadêmicos de excelência na região como o ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica). “Sabemos que o Vale do Paraíba é berço de grandes talentos. O lugar tem fácil acesso ao mercado, a potenciais clientes, investidores e fornecedores por estar entre São Paulo e Rio de Janeiro. Apesar de não ter tanta visibilidade midiática, acho este ecossistema muito promissor e acredito que os primeiros unicórnios devam surgir ali em pouco tempo – entre 5 e 10 anos”, prevê.

Na opinião de Paulo de Miranda, especialista em tecnologia e conselheiro de startups que passa grandes períodos dentro da região do Vale do Paraíba, são necessários projetos mais audaciosos no Brasil como um todo. Essas inciativas devem lidar com desafios reais para dar chance a uma redução das desigualdades de mercado, de competitividade, de níveis de oportunidades e de progresso social. “Serão esses empreendedores, dedicados a negócios de alto impacto para a sociedade, que farão e trarão uma contribuição efetiva para uma mudança de percepção e de efeito quanto ao propósito maior de se empreender em uma região ou país”, disse.

Cases de sucesso

Quero Educação é um dos maiores cases de sucesso da região do Vale do Paraíba e está revolucionando o acesso à educação no Brasil. A edtech é líder em tecnologia de marketing educacional e desenvolve soluções para conectar alunos e instituições de ensino de todo país. A empresa já matriculou mais de 450 mil estudantes e conta hoje com mais de 1.300 instituições de ensino parceiras.

Lucas Gomes, cofundador da Quero Educação

Lucas Gomes, cofundador da Quero, lembra o início da startup, em 2012: “Começamos com apenas quatro pessoas e, para chegarmos às mais de 500 atuais, trabalhamos muito”. O negócio cresceu vinte vezes entre 2016 e 2018. Ele também se recorda que, desde o começo, apostaram na participação societária para atrair os melhores talentos para a empresa. “Sempre miramos alto impacto e crescimento acelerado. Por isso, buscamos pessoas que vissem a empresa como sua e quisessem colocar a mão na massa para fazer ela crescer junto com a gente. Hoje, a Quero conta com diversos profissionais que detêm parte na sociedade”, explicou Lucas.

A edtech tem tido um crescimento exponencial nos últimos anos e foi a primeira empresa brasileira acelerada duas vezes pela Y Combinator, por onde já passaram empresas como Airbnb, Stripe e Dropbox. De 2018 até aqui, eles dobraram de tamanho em número de funcionários e prevêem fechar 2019 com mais de 700 colaboradores.

Mas não é só a Quero Educação que tem crescido muito nos últimos anos. Halyson Valadão é cofundador da Guichê Virtual, uma plataforma online para busca e compra de passagens de ônibus. “A ideia surgiu quando precisávamos viajar e vimos que o único jeito de comprar a passagem de ônibus era na própria rodoviária. Percebemos que havia ali uma grande oportunidade, um problema real a ser resolvido”, disse.

A empresa conta hoje com uma equipe de 100 profissionais em duas cidades e espera superar este ano a marca de 5 milhões de passagens vendidas. O Guichê Virtual possui ainda o Guichê Pass, serviço de gestão de vendas para empresas de ônibus. A expectativa é que até o fim do ano seja movimentado 1 bilhão de reais através dessa solução.

“O ecossistema não é formado apenas pelas startups, mas também por profissionais da economia criativa, investidores, indústria, universidades, o poder público. Todos esses  elementos convivendo juntos é que transformarão o Parahyba Valley (comunidade do Vale do Paraíba) no Vale do Silício brasileiro”, disse.

Protagonismo feminino

As mulheres têm aumentado sua representatividade no ecossistema de startups nos últimos anos e em São José dos Campos não é diferente. Rachel Toyama é fundadora da Paraíso Feminino, buscador de produtos de lojas virtuais que reúne, em uma só plataforma, mais de 5 mil marcas de roupas, sapatos e acessórios para mulheres, totalizando mais de 450 mil produtos e 350 lojas virtuais. A empresa cresceu 150% no último ano e espera dobrar o faturamento em 2019. Ela explica que tem visto uma forte tendência de descentralização das startups em relação aos grandes centros. “Há um tempo, estar em cidades como São Paulo era até uma exigência dos investidores e, hoje, isso já não é mais um problema”, diz.

Michelle Morcos, cofundadora da Justto

Michelle Morcos é exemplo disso. Ela morava em São Paulo, engravidou e buscou em São José uma oportunidade para empreender e ter mais qualidade de vida. Ela é cofundadora da Justto, startup voltada para automação do setor jurídico e que este ano recebeu R$ 2,5 milhões do Fundo Criatec 3, criado pelo BNDES e gerido pela Inseed Investimentos. “Eu e meu sócio somos advogados e trabalhamos em grandes escritórios de advocacia em São Paulo. Na mesa com nossos clientes, vimos uma demanda crescente por formas mais eficientes de resolver disputas alternativas ao Judiciário. Em 2012, quando falávamos de tecnologia no mundo jurídico, éramos vistos como loucos, mas hoje em dia o mercado está se adaptando à nova realidade”, explicou.

Empreendedorismo aeroespacial e inteligência artificial

Uma outra curiosidade sobre a região do Vale do Paraíba é que o lugar possui o maior agrupamento de instituições privadas e públicas que atuam na área aeroespacial. Estão surgindo outros centros e instituições pelo país, mas o Vale congrega boa parte dessas instituições. A proximidade geográfica entre empresas, universidades e institutos de pesquisa favorecem o ecossistema e permitem o intercâmbio entre diferentes atores de diferentes níveis. Mais do que a concorrência, há também as parcerias que ocorrem em projetos, produtos e serviços.

Marcelo Essado, da EMSISTI

Marcelo Essado atua na área espacial há mais de 15 anos e criou a primeira startup brasileira a desenvolver tecnologias de comunicação solo-bordo para satélites de pequeno porte (cubesat e nanossatélite): a EMSISTI Sistemas Espaciais & Tecnologia.  “O maior desafio de empreender neste nicho aeroespacial é que nosso produto ou serviço é um tanto restrito. No Brasil, o governo é o principal investidor destas tecnologias e, como temos visto, não há tanto investimento nesta área. Este cenário tem mudado e empresas privadas têm se interessado cada vez mais ao acesso a informações e tecnologias advindas do espaço”, avaliou. Atualmente o fundador está executando um projeto em parceria com a FAPESP e a FINEP para desenvolvimento de eletrônica embarcada em satélites de pequeno porte.

Já Renan Padovani, cofundador da Autaza, utiliza inteligência artificial para dar mais eficiência à indústria automotiva. A empresa acaba de receber investimento do Fundo Primatec e abrir um escritório nos Estados Unidos. “Nossa missão nos Estados Unidos está centrada na abertura de escritório de vendas e suporte técnico aos atuais clientes. Nossos produtos têm como foco mudar a forma como é feito atualmente o controle de qualidade nas indústrias, por isso muitas vezes precisamos lidar com as matrizes ou centros técnicos das montadoras que ficam nos Estados Unidos e na região de Detroit”, explicou.

Outra empresa da região que faz uso de IA é a SoluCX. A startup utiliza uma ferramenta que busca entender o consumidor e seu comportamento durante toda a jornada de compra, a fim de melhorar continuamente a experiência e garantir sua satisfação. A SoluCX, sem qualquer investimento, em 2 anos chegou a R$3 milhões de faturamento e mantém um crescimento de 320% ao ano.

Para o cofundador da SoluCX, Tiago Serrano, as startups da região do Vale do Paraíba possuem excelente relacionamento e trocam muitas experiências. “Há muitos empreendedores experientes dispostos a aconselhar os mais jovens. A incubadora Nexus é muito ativa, responsável pelos primeiros passos de muitos empreendedores daqui”, disse.

‘Parahyba Valley’: o ecossistema local

Rogério Gomes é empreendedor e um dos líderes da Comunidade Parahyba Valley, a comunidade de empreendedores e fundadores de startups do Vale do Paraíba. Hoje são mais de 200 pessoas no grupo e a comunidade busca organizar eventos e iniciativas para que haja mais conexão e troca de informações e mentorias.

Para Rogério, a região do Vale do Paraíba tem uma veia extremamente industrial. “ O sonho de todo jovem da região era ‘seguir’ os passos do pai e do avô, que trabalharam a vida toda em uma mesma empresa, comprou sua casa e seu carro. Hoje muitas destas indústrias precisam de várias soluções e um novo empreendedor pode criar ou adaptar para atende-las, sistemas como WMS, automação industrial, controle de logísticas, dentre várias outras soluções”, explicou.

Para compreender outras iniciativas na região, a Startse conversou com Milos Fonseca, fundador da “aceleradora boutique”  Shockadeira. Ele disse que a ideia da empresa surgiu em meados de 2017 e o modelo previsto inicialmente era baseado no Deshpande Center do MIT. “Tive contato com o idealizador e atual diretor do Desh e ele me explicou em detalhes o funcionamento e os principais pontos de sucesso do projeto. A motivação por trás da iniciativa é fazer com que tecnologias sendo desenvolvidas em universidades de ponta, possam ser direcionadas para compor produtos de base tecnológica, que por sua vez deem origem a negócios disruptivos com base no break through tecnológico”, disse.

O que se vê é que cada vez mais pessoas na região estão se arriscando no mundo do empreendedorismo e das startups. Daniela Asdente foi a idealizadora do primeiro espaço de coworking em São José dos Campos, a Co-necta. “O mercado aqui em SJC cresce bastante. Quando abrimos, em novembro de 2013, estávamos sozinhos. Em 2014, abriram outros dois espaços e, em 2015, já éramos em seis. Hoje, pelas minhas contas, já somos em quase 20”, disse.

A Co-necta organiza eventos quinzenalmente para reunir a comunidade local e incentivar o fomento ao empreendedorismo local. Uma das empresas que está no coworking da Co-necta é a Back4App, cofundada por Alysson Melo, que antes chegou a trabalhar em grandes indústrias da região. “O Back4App é uma ferramenta que ajuda desenvolvedores de software a construir e gerenciar produtos de uma forma mais rápida elevando o padrão de qualidade e sem preocupações com o servidor. Hoje a plataforma conta com mais de 100 mil usuários no mundo”, comenta.

Está claro que o DNA hi-tech é o que faz da região um grande diferencial competitivo. Sem dúvidas, a cidade de São José dos Campos e o Vale do Paraíba como um todo estão entre as regiões mais promissoras do Brasil e que devem produzir alguns unicórnios nos próximos anos. Para quem deseja trabalhar em alguma startup do Vale do Paraíba, se inscreva neste linkhttp://bit.ly/vagas-startups

FONTE: StartSe